Antes, devo falar do meu
silêncio. Que é de palavras. Mas também um silêncio interior. Eu e uma amiga
organizamos um evento científico aqui na floresta.
E foi muito bonito. Demos tanto de nós mesmas que ficou difícil por meses
pensar em qualquer outra coisa. E durante os dias do evento, noites sem dormir,
eu vivenciei tudo numa espécie de nuvem. E quando finalmente terminou, eu me vi
perguntando::: “maspraquêtudoissomesmopraquetantoesforço?". E essa pergunta
sem resposta me emudeceu. E se não fosse a Tatiana me trazer aqui, confesso, eu
não teria vindo.
Porém, se no meu blog, eu não me
furto de falar do que vai aqui por dentro, neste lugar de 30 pessoas, eu penso
sempre que devo dizer algo que, saindo de mim, possa interessar às pessoas que
por aqui passam. Porque o escuro de nós só
deveria interessar quando podemos transformá-lo.
A arte faz isto. Traz até nós a dor, o sofrimento, o horror, o abjeto, de um modo transformado,
a ponto de dali inspirar alguma experiência. Não falo só de transfiguração. Ou
do contato com o belo. Falo de uma experiência maior que possa nos proteger de
nós mesmas. Eu sinto que hoje há palavras demais. Todos querem falar dos seus
tormentos, como se isso marcasse a sua “diferença”. Mas poucos querem colocar
algo distinto no lugar – como se bastasse o lamento.
Kafka, que soube como ninguém nos
mostrar o que é o sofrimento, em seu diário, escreve:
“Eu escrevi isto certamente impulsionado pelo desespero que me provoca meu corpo e o porvir desse corpo. ... Quando o desespero se exprime de modo tão categórico, quando é tão solidamente preso a seu objeto como se fosse mantido às costas por um soldado que vigia seu posto e se deixa morrer por ele, não é o desespero real. O verdadeiro desespero sempre e imediatamente ultrapassa sua meta ...Você está desesperado?Sim? Você está desesperado?Você vai fugir? Você quer se esconder?”
Há aí um ponto muito incômodo,
que se situa, de algum modo, no próprio questionamento do que seja o desespero. Ou a
dor. Como se, ao expor o que há de performativo no desespero, ele apontasse
nossa própria performatividade que advém da escrita, do ato de escrever. Talvez,
quando desesperados, deveríamos ler mais livros, ver mais filmes, como um modo
de sair de nós e de parar de contemplar nosso próprio deslocamento. Haveria
mais beleza na vida, e também na blogosfera, se assim fosse. O que eu sei falar
sobre o que me rodeia? Qual o último grande livro que eu li? Quando eu parei
para escutar um cd inteiro, deixando que toda a música entrasse em mim? Quando eu
fui ver uma peça de teatro e saí dela com os olhos marejados de espanto? Quanto
tempo passei diante de um quadro num grande museu? Quando li um texto de mais
de dez páginas?
Deveríamos escrever sobre isso. Sobre nossas experiências com a arte e com a vida. E
não sobre nossa face no espelho. Porque, na maioria das vezes, a face é só face
mesmo. Não há nela nada de sublime. E se essas questões me importam é porque,
de algum modo, me tocam, sem que eu saiba exatamente onde. Não sei onde dói.
Mas sei que há muito além da dor. E é deste além que agora ando atrás.
Tati, um abraço bem abraço.
Obrigada por me devolver a escrita, ainda que pareça tão sombria.
Sentimos saudade. Sombria não sei. Bela, sempre.
ResponderExcluirMilena estava mesmo pensando sobre a dor... e penso que o grande problema do mundo é que as pessoas não sentem mais a dor do outro, estão tão preocupadas com seus mundinhos fechados e não conseguem sentir a dor outro. Netzsch chorou ao ver baterem num cavalo, mas muita gente intectual não consegue se senssibilizar com as desgraças causadas bem perto de seus narizes... Porque só olham para seus próprios umbicos... É a velha filosofia centrada no eu... ou o existencialismo perdido no esfumaçamento!!!!
ResponderExcluirA vida imita a arte e a arte imita a vida, independente do que possa ter acontecido, siga aquilo que você diz te definir "goste de gostar".
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