Animais são caçados na África aos montes. Vez ou outra, como aconteceu recentemente, um caso ganha grande repercussão. Isso não é exclusivo à caça, basta pensarmos no tanto de homicídios cometidos por policiais, até que um caso ou outro tenha a devida notoriedade.
No início do século XX as caçadas na África eram ainda piores. Com a perspectiva do contexto histórico, havia uma noção muito menor do impacto ambiental e da hipótese de espécies serem caçadas até a extinção.
Um dos maiores autores do século passado, Ernest Hemingway, era exímio caçador e são frequentes em suas obras os relatos muito bem narrados de homens que enfrentavam perigos e tinham na caça tanto uma afirmação pessoal quanto a extrema reflexão sobre a vida em relação à morte.
Hoje qualquer tipo de caça é extremamente questionável. Muitas das espécies já nem existem mais e outras correm sério risco de sumirem do planeta. À parte da responsabilidade ambiental, a consideração em relação aos animais vem mudando e atingindo níveis inimagináveis no passado.
Cada um tem seu ponto de vista em relação ao que separa os homens dos outros animais. Entre os que mantém uma alimentação vegana em respeito aos outros seres vivos e aqueles que caçam os animais mais raros para exibi-los como troféu há inúmeros níveis de consideração.
O aspecto histórico deve ser considerado, mas não de forma isolada e inquestionável. De fato, existia um glamour – que ainda se mantém entre determinados grupos sociais – em relação à caça e aos objetos de decoração que ela proporcionava. Mas até que ponto o contexto pode ser utilizado como justificativa já é algo muito mais complexo. Não me agrada a ideia de que daqui a cem anos olhem para nosso tempo com um olhar benevolente em relação a atitudes que já deveriam ter sido superadas, mas são mantidas por puro conservadorismo sem fundamento.
Dentro da lógica ultrapassada de ver a caça como um hábito corriqueiro, ignorando os impactos diretos e indiretos para o meio ambiente, também chama a atenção a distorção com que os atuais caçadores encaram a prática.
Personagens dos romances de Hemingway partiam para suas caçadas sozinhos, o pescador de “O velho e o mar” quase morre na batalha contra o peixe gigante e vários outros têm um fim trágico. Hoje, para brincar de ser caçador, milionários pagam fortunas para serem escoltados por guias armados, que não somente o levarão até bem próximo de algum animal – por vezes nem tão selvagem – como garantirão toda a segurança de que nada sairá do controle.
Independente da crítica moral que se faz em relação a abater um animal ou da crítica ambiental, a partir do momento que nos damos conta de que os recursos não só são finitos como caminham a passos largos para a extinção, fica claro que o dentista americano que abateu o leão, simbolizando tantos caçadores anônimos que repetem esse mesmo ato diariamente, não busca muito mais que uma mera ostentação econômica.
Da forma como a caça é realizada hoje, o que a diferencia de um tiro-ao-alvo qualquer é a restrição financeira. Algo como: não preciso ser o melhor entre inúmeros competidores, só preciso ter dinheiro para fazer uma coisa exclusiva. Para esses, vale o conselho de mãe para a criança que entra em uma loja de objetos valiosos: só olhe, de longe!
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