quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Ayahuasca - primeira tentativa

São Paulo começava a entrar no ritmo do carnaval, mesmo estando há dois fins de semana da festa. No metrô, próximo à última estação e já quase vazio, uma moça fantasiada usava o vidro do vagão como espelho para beliscar os mamilos e deixá-los salientes sob a blusa sem sutiã, rendendo piadas de seus dois amigos que formavam um casal.

Na contramão desse clima de prazeres carnais eu chegava para minha primeira experiência com o chá de ayahuasca, a bebida indígena conhecida por aguçar os sentidos e facilitar a busca pelo autoconhecimento daqueles que a provam.

Era um ritual urbano, bem diferente de toda a conexão com a natureza condizente com o histórico da bebida. Meu maior contato com a natureza naquele dia foi através do temporal que caía sobre os 400 metros que separam a casa, onde se realiza o ritual, da estação de metrô.

Conforme os participantes chegavam, preenchiam uma anamnese básica e assinavam o termo de participação, enquanto Rose, a coordenadora, falava um pouco sobre o Universo Místico – a associação com valores espirituais, que congrega religiões para, segundo Rose, evoluirmos como seres humanos. O chá, ou vegetal, como dizem os associados, é uma ferramenta a ser usada nessa evolução.

Uma das observações feitas por Rose é que não deveríamos criar expectativas sobre como será a experiência com a ayahuasca. Justo eu, que não consigo ir à padaria sem a expectativa de que algo surpreendente aconteça no caminho? Eu já tinha ouvido relatos suficientes para que a falta expectativas estivesse fora de questão.

Preferia não ter diarreia. Eu sempre prefiro não ter diarreia. Se desse para não vomitar, também seria bom; ainda mais sozinho entre duas dezenas de desconhecidos. Já eventuais alucinações seriam bem-vindas, mesmo que desnecessárias quando o objetivo é o autoconhecimento, eu ficaria bem satisfeito em me sentir dentro de uma pintura de Salvador Dalí.

O fato é que as expectativas são ruins porque aos que bebem o chá pode acontecer de tudo, inclusive nada. Adoraria seguir com estórias extraordinárias, mas bebi a primeira dose e fiquei sentado na sala levemente iluminada por uma luz azul, ouvindo mantras orientais intercalados por músicas com referências ao cristianismo. Nada mais.

Bebi a segunda dose. O chá é levemente adocicado, um pouco amargo da fermentação. Desanimado com a falta de reação comecei a sentir um leve enjoo acompanhado de queda de pressão. Os organizadores haviam dito que isso poderia acontecer, e foi o que me salvou de não ter nenhuma reação para contar.

Levantei e saí da sala. Seguia determinado a não vomitar (nem desmaiar) entre desconhecidos. Sobretudo agora, quando estavam concentrados, muitos curtindo o transe em que não entrei. Mas não cheguei ao extremo. Lavar o rosto e esperar um pouco, olhando a chuva que insistia em cair do lado de fora, foi suficiente para que eu me recuperasse e voltasse ao ritual.

A ayahuasca é imprevisível. Mesmo os adeptos mais antigos não sabem qual será a reação do corpo. Entre tudo o que poderia ter me acontecido, não me aconteceu nada. Talvez pela falta de um rito mais elaborado, quem sabe as músicas voltadas ao cristianismo que tanto me incomodaram, mas não consegui um transe ou uma reflexão mais ampla do que estou habituado.

Não desisti. Acredito que apenas após essa experiência conseguirei seguir a recomendação que me foi dada. Da próxima vez, não terei expectativas.

3 comentários:

  1. Claro q vc vai ter a expectativa de q a próxima vez seja de algum modo melhor q essa...senåo nem buscaria uma próxima! Rs rs. Eu aposto q vai ser melhor, sobretudo se for mais demorada e no mato!

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  2. Olha, só digo uma coisa: quando for a esse ritual procure um lugar sério, confiável, porque eu fui em um que descobri depois que ''alteravam'' o chá, colocavam substâncias proibidas e tal. Passei muito mal e não entendi o motivo, até que fiquei sabendo. Também pensei que não queria vomitar, porque tenho fobia, mas me disseram que não podemos bloquear mentalmente nenhuma reação do corpo, precisamos largar todos os pensamentos e expectativas. Não force situações de conhecimento espiritual, se tiver que rolar, vai rolar, sem pressão. Boa sorte!

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  3. Existe algum lugar como este no Rio de Janeiro?

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