O Natal de Maria sempre foi no dia 26 de dezembro. Lembra, quando criança, do pai consertando pisca-piscas encontrados em meio às toneladas de lixo que chegavam no aterro. “É coisa simples, uma gambiarra resolve.” E lá estavam as luzinhas coloridas alegrando o cômodo dividido por toda a família.
A ceia sempre foi recolhida, nunca escolhida. Ainda assim dava para considerar um banquete, comparada aos outros dias do ano. Em outros tempos chegou a ganhar um panetone da patroa. Não daqueles chiques, que ao cortar um pedaço o recheio escorre pela massa, mas procurando bem, o presente tinha até uvas-passas.
Neste ano o jeito foi recorrer à tradição familiar, que Maria passou para os filhos. Ela considerava uma questão de sorte. Teve ano que a sorte estava ao seu lado e encontrou, de uma vez, um frango assado inteiro. Parecia que ninguém havia tocado. Na mesma sacola estavam as sobras de um pudim de leite, bem ensacado para não vazar. Deu para dividir entre todos.
Ultimamente a sorte não costumava brilhar. A cada ano ficava mais difícil encontrar comida para montar a ceia e Maria ainda tinha que lidar com a rebeldia do filho, que considerava injustiça revirar o lixo para ter o que comer. Foi justamente ele que encontrou a árvore de natal que enfeitou a casa até o Dia de Reis.
Ao ver a pequena árvore ao lado de uma imagem do Papai Noel e a frase “seja rico ou seja pobre, o velhinho sempre vem”, enfeitada com notas musicais, o filho de Maria discordou. Nunca ganhou nada do que queira e ainda tinha que revirar o que era jogado fora.
Para ele, o amor, que tanta gente evoca nesta época do ano, não era notado nas expressões de raiva dos motoristas, nos carros que paravam no semáforo. Muito menos no rigor dos policiais, que atuavam para “manter a paz”. O filho de Maria tinha uma ideia muito distinta de amor e paz. Escolher entre fugir ou morrer não combinava com nada do que ele idealizava.
Na semana do Natal, Maria juntou as moedas de toda a família. Não abria mão de comprar pelo menos um refrigerante, já que só as embalagens de bebidas chegam ao aterro. Os protestos do filho foram contornados com rigor. Deveriam ficar para o dia seguinte, para que pelo menos um dia do ano a família passasse reunida para uma celebração.
Coube ao filho de Maria, quase como um castigo pelos protestos, repartir a comida e servir a bebida. Não foi fácil servir a todos. A vontade era de multiplicar as pequenas porções para que todos pudessem comer até se sentirem satisfeitos, transformar a água em uma bebida melhor que o refrigerante barato que encheu os copos. Ainda suspirou quando teve que chacoalhar a garrafa para que a última gota pingasse no último copo, ainda pela metade. Encontrou o olhar de Maria. “Não reclama, menino. Tanta gente que vai dormir com fome hoje.”
A ceia sempre foi recolhida, nunca escolhida. Ainda assim dava para considerar um banquete, comparada aos outros dias do ano. Em outros tempos chegou a ganhar um panetone da patroa. Não daqueles chiques, que ao cortar um pedaço o recheio escorre pela massa, mas procurando bem, o presente tinha até uvas-passas.
Neste ano o jeito foi recorrer à tradição familiar, que Maria passou para os filhos. Ela considerava uma questão de sorte. Teve ano que a sorte estava ao seu lado e encontrou, de uma vez, um frango assado inteiro. Parecia que ninguém havia tocado. Na mesma sacola estavam as sobras de um pudim de leite, bem ensacado para não vazar. Deu para dividir entre todos.
Ultimamente a sorte não costumava brilhar. A cada ano ficava mais difícil encontrar comida para montar a ceia e Maria ainda tinha que lidar com a rebeldia do filho, que considerava injustiça revirar o lixo para ter o que comer. Foi justamente ele que encontrou a árvore de natal que enfeitou a casa até o Dia de Reis.
Ao ver a pequena árvore ao lado de uma imagem do Papai Noel e a frase “seja rico ou seja pobre, o velhinho sempre vem”, enfeitada com notas musicais, o filho de Maria discordou. Nunca ganhou nada do que queira e ainda tinha que revirar o que era jogado fora.
Para ele, o amor, que tanta gente evoca nesta época do ano, não era notado nas expressões de raiva dos motoristas, nos carros que paravam no semáforo. Muito menos no rigor dos policiais, que atuavam para “manter a paz”. O filho de Maria tinha uma ideia muito distinta de amor e paz. Escolher entre fugir ou morrer não combinava com nada do que ele idealizava.
Na semana do Natal, Maria juntou as moedas de toda a família. Não abria mão de comprar pelo menos um refrigerante, já que só as embalagens de bebidas chegam ao aterro. Os protestos do filho foram contornados com rigor. Deveriam ficar para o dia seguinte, para que pelo menos um dia do ano a família passasse reunida para uma celebração.
Coube ao filho de Maria, quase como um castigo pelos protestos, repartir a comida e servir a bebida. Não foi fácil servir a todos. A vontade era de multiplicar as pequenas porções para que todos pudessem comer até se sentirem satisfeitos, transformar a água em uma bebida melhor que o refrigerante barato que encheu os copos. Ainda suspirou quando teve que chacoalhar a garrafa para que a última gota pingasse no último copo, ainda pela metade. Encontrou o olhar de Maria. “Não reclama, menino. Tanta gente que vai dormir com fome hoje.”
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