"Ouvi dizer que no Brasil todo mundo é feliz" |
Desprezar a história é produzir verdades com a experiência limitada de
vida de qualquer pessoa. Em tempos de eleição, a política ganha espaço no
cotidiano. Mudam alguns atores, esse ou aquele candidato, mas me parece que uma coisa permanece: a baixa autoestima dos brasileiros.
É comum ouvirmos por aí “o Brasil é um lixo”, “aqui nesse país nada dá certo”, falas que carregam aquela ideia de que o problema está no outro, de que quem fala não é
responsável também, não é sujeito, mas vítima, objeto. A síntese genial é “você
não está no trânsito; você é o trânsito”.
Há pouco mais de um mês terminou um festival que gosto bastante, o
“Anima Mundi”. Trata-se de uma importunidade rara de ser apreciar toda sorte de
técnicas de animação, curtas e longas metragens, de toda parte do mundo. No
último dia do festival, há a premiação dos melhores filmes, em diversas
categorias. Durante o anúncio de um dos ganhadores, pude ouvir “ah... é
brasileiro? Deve ser uma merda!”
Durante a última Bienal do Livro o consagrado fotógrafo mineiro,
Sebastião Salgado, foi convidado para um bate-papo com o público. Em dado
momento, ele chamou a atenção para o fato de que, em geral, nós brasileiros
tentamos esconder nosso passado indígena. Ele até brincou dizendo que em São
Paulo todo mundo era descendente de italiano! Somado a esse exemplo, basta
observar a tentativa do Brasil de querer diferenciar-se do restante da América
Latina, como se não compartilhássemos nada. “A Bolívia é indígena, nós não”, só
pra ficar entre vizinhos.
Com o livro “O povo brasileiro”, temos uma ótima oportunidade de ser
menos ignorantes com relação ao nosso passado. Nele, Darcy Ribeiro discute a
criação da colônia, desde a invasão (e não descobrimento) dos portugueses até o
século XX. Não podemos nos esquecer de que quando os portugueses invadiram, não
trouxeram consigo as portuguesas; logo, as índias foram as mães dos chamados
brasilíndios. Interessante notar é que esse sujeito ficou perdido, sem
identidade. Por um lado, ele era desprezado pelo pai, que não o reconhecia como
europeu, branco; por outro, desprezava a mãe indígena, considerando sua cultura
subalterna. A introdução da cultura negra é igualmente considerada menor, sob
essa perspectiva.
Séculos se passaram desde então. Muitas mudanças, mas essa percepção de
hierarquia, ao que parece, permanece intacta. É claro que não podemos nos esquecer
de que com o fim da Segunda Guerra, a cultura produzida nos EUA foi elevada ao
mesmo patamar da cultura europeia (talvez num status até maior) e continua a
ideia “a grama do vizinho é sempre mais verde”. Qual é? Não se trata de
nacionalismo irracional, mas já está mais do que na hora de melhorarmos a nossa
autoestima!
Eu não acredito em nacionalismo porque é fácil cair no fanatismo e se
esquecer da solidariedade entre os povos, já que o resto do mundo não presta,
entre muitas outras coisas, mas é importante desenvolver um olhar mais generoso
para conosco. É óbvio que temos um montão de problemas, que tem gente corrupta,
oportunistas de toda ordem, injustiças, violências, mas isso não significa que
seja próprio do nosso DNA. Quanto mais nos livrarmos da ideia de que as coisas
sociais são naturais, melhor. Nascemos assim ou fomos levados a agir desta ou
daquela forma?
Particularmente acho triste esse ódio ao Brasil quando ele vem da boca
de jovens. Muitos deles sequer cruzaram a fronteira. As notícias que chegam do
estrangeiro são da internet, filmes, séries televisivas, boatos e etc. Para
alguns, pode ser chocante imaginar que nos EUA há pobres ou que só se tem
atendimento médico quem tem um seguro saúde (algo como nossos convênios
particulares). Veja, não estamos falando em atendimento de má qualidade, não
existe atendimento médico para quem não pode pagar, simples assim. Vale a pena
lembrar que muitos brasileiros contribuem para o desenvolvimento da ciência e
das artes no exterior, por exemplo, mas o que se sobressai é o país que
financia.
Acredito que enquanto seres humanos podemos –e devemos!- nos inspirar nas boas ações de
outros povos, buscando viver num país melhor. A troca é saudável, inteligente.
Minha avó dizia que só não tem solução para a morte. E quais alternativas estão
sendo pensadas por você? Não dá para ter resultados diferentes com as mesmas
ações.
Parece que "O inferno são os outros" é a chave para tudo por aqui =/
ResponderExcluirÓtimo texto, Sirley!
ResponderExcluirAcho que pensar em que candidatos colocaremos no poder é um passo para isso, né?
beijao