Minha tia está sob a linha que
separa a vida da morte. Da última vez que a vi, a coisa só foi piorando. De
quando em quando, fecho os olhos e me vêm a imagem do rosto magérrimo,
sobretudo dos olhos dela. Talvez porque eu tivesse olhado fixamente para eles,
a fim de descobrir a essência perdida naquele corpo supliciado pela doença. Nunca
imaginei ver uma pessoa tão magra e desfigurada!
A esperança de cura e
sobrevivência morrem a cada dia que passa. O câncer se espalhou e está em diversas
partes do corpo. Ela está respirando por aparelhos. As mãos não se mexem mais.
Tanto sofrimento, meu Deus! Às vezes, me pego secretamente desejando que ela
morra logo, por que se a cura parece impossível, para quê prolongar a dor? Mas
qualquer coisa em mim diz que isso é cruel e que a gente não deve desejar a
morte jamais. Às vezes, me vem a ideia poética de que ela está desaparecendo
aos poucos, retomando a condição fetal, decrescendo...
Realmente não sei definir o que
sinto a respeito. Não tenho uma tristeza desesperadora do tipo “oh, meu Deus!
Como será minha vida sem ela?” Penso que não irá mudar muito. Mas sinto uma
tristeza plácida, não aguda, mas crônica. Talvez a nossa unidade familiar seja
mais forte do que suponho e o fato de perder um membro é como se tivéssemos
perdendo um pouco de nós mesmos. A vida é tão misteriosa... há um ano tudo
estava bem, quem poderia imaginar isso agora? Quem determina a vida e a morte?
Não fazemos ideia de quem irá envelhecer ou não. Como diz o poeta, “a vida
apenas, sem mistificação”.
"O crepúsculo é a fresta entre dois mundos" - C. Castañeda |
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