sábado, 29 de abril de 2017

síndrome do pensamento pequeno ou vai na fé e tenta a sorte

O dia em que o país parou 100 anos depois da primeira greve geral causou mais dúvidas do que certeza sobre o “sucesso” mencionado pela avaliação quase que unânime da esquerda e sobre a possibilidade de eliminar ou destruir as reformas antitrabalhadores.

Não cito à avaliação da mídia de grande circulação porque é nítido à ausência de compromisso com os fatos e seriedade com a matéria do jornalismo. A Rede Globo se coloca como partido político na sociedade e ultimamente não se dá o trabalho de disfarçar o quanto se lixa ou não se importa com às pautas dos trabalhadores.

Entendo que ver as ruas de São Paulo e demais cidades dos estados silenciosas na parte da manhã e aquele frisson nas redes sociais com a greve causa esperança absurda em quem acredita noutra sociedade ou para quem está de algum modo organizado seja de forma autônoma ou institucionalizada com propósito de defender, garantir ou angariar direitos.

E é aí que quero chegar, na institucionalização da luta.

Não vou fazer resgate histórico mesmo porque não me sinto apropriada de forma criteriosa sobre a questão do sindicalismo e movimento grevista do país. Mas o fato de termos a greve geral somente após 100 anos significa algo ou quer nos dizer algo.

Os sindicatos perderam a essência e objeto da ação de existir que trata da defesa irrestrita do trabalhador e não a mediação de conflitos entre interesses de chefes e empregados. Também estão resignados e acomodados na institucionalização por meio de cargos, alianças com chefes e apoio a partidos políticos o que contribuiu para desmobilização e descrédito de trabalhadores nos sindicatos.

O sindicato que considero com maior relevância de atuação e enfrentamentos sobre direitos é o sindicato dos bancários. Independente de reformas pautadas pelo congresso quando o assunto é demissão ou precariedade do trabalho o sindicato está presente, mesmo com os problemas em torno da mobilização algo comentado durante palestras que participei no ano de 2013 e 2014.

Nota-se o comprometimento quando o sindicato publica nota mencionando a demissão de trabalhadores antigos, mesmo sendo em pouco número em determinado banco que estavam prestes de aposentar. Isso significa enfrentamento da questão e defesa do trabalhador além de atenção com os desdobramentos do que ainda não está concretizada: a terceirização do trabalho.

Outro sindicato de atuação semelhante a bancários é o sindicato de professores, todo ano tem mobilização e greve na educação sendo a pauta principal em torno do reajuste de salário. E demora meses ou semanas para ser atendida. Nenhuma pauta visa às condições de trabalho dos professores ou pelo menos não é citado nos protestos ou discutido de modo mais sério.

Então o sindicato está apenas para reivindicar aumento salarial? E as condições de trabalho? E a saúde dos trabalhadores na educação? E a estrutura? Etc.

Os demais sindicatos de outras categorias estão presentes quando se trata de demissão ou quando pautas como reforma trabalhista antitrabalhador surgem no congresso. Propostas reavivadas de outros séculos por decrépitos e negociadores de direitos sociais. E aí pudera, se os sindicatos não mobilizassem em torno das reformas  trabalhista e previdência era realmente para extinguir a existência e sentido do mesmo.

Temos quase 14 milhões de trabalhadores desempregados e desesperados. Mas os sindicatos apenas se mobilizam em torno daqueles que estão empregados. Não existe uma defesa, olhar para quem precisa trabalhar, pois até agora quem usou e abusou desta necessidade foram os golpistas com intuito de justificar a reforma trabalhista para gerar mais emprego.

A terceirização não gera mais emprego, o que faz é produzir subempregos e subempregados com a vida mais precarizada e principalmente com objetivo final de extinção dos direitos trabalhistas.

No mês passado disse que é fácil ver  trabalhadores da limpeza ou prestação de serviços terceirizados. Hoje reafirmo outra vez. Além de ser uma classe paupérrima e com cor definida para o trabalho braçal reafirmo que continua sendo fácil  seja do ponto de vista dos ricos ou  dos sindicatos/partidos que não fortaleceram outras categorias e julgou de menor proporção ou impacto. 

Estamos acostumados a julgar tudo normal, mas se olhar superficialmente para a história dos direitos trabalhistas nenhuma atividade relacionada ao trabalho deveria ser terceirizada.

A existência dos sindicatos é justificada e se vale de lutar por direito e defesa do trabalho e trabalhadores. Hoje vemos que os sindicatos falharam e permitiram uma brecha ao admitir que fosse terceirizada qualquer atividade. Resultado que permitiu para hoje enfrentarmos uma reforma trabalhista antitrabalhador que sequer deveria existir.

O f#d# é que esta mobilização do dia 28/04/2017 ainda foi parca e desorganizada. Demorar um mês para organizar uma greve geral só demonstra o quanto os sindicatos estão longe das necessidades e urgências de pautas dos trabalhadores.

A França ano passado organizou greve geral em dias e parou o país impedindo retrocessos. O movimento de mulheres Ne Una Menos (Nenhuma a Menos) na Argentina rapidamente promoveu uma greve de forma massiva no país em torno da violência contra as mulheres.

Observando este dois países em torno de questões que nos são pertinentes vejo que não tivemos o sucesso tão comemorado. Sendo realista e pé no chão bora pelo óbvio, somos mais de 206 ou 207 milhões e apenas 35 milhões aderiram a greve e pouco menos foram as ruas.

Então temos uma parcela aí que está indiferente e/ou não aderiu por três motivos ou hipóteses: não reconhece o compromisso dos sindicatos com suas questões; acredita que se trata de movimento partidário; não compreendeu como deveria os efeitos desastrosos da reforma trabalhista na vida.

E aí não importa aprovação de 5% do golpista e reivindicação de diretas já se não há mobilização generalizada a ponto de existir aquele corre e corre com caras assustadas pelo congresso. E aquele tal o que aconteceu?

Algo que somente em 2013 vimos acontecer. Jamais saberemos a proporção de pessoas nas ruas naquele período.  Então não adianta vir com essa conversa fiada de sucesso hein.

Também não se trata de fracasso como dito pelo governo golpista. Trata-se de desorganização afinal porque fazer manifestação em plena sexta-feira com final de semana e feriado seguido. Óbvio que iria dispersar o povo.

O melhor trabalho de base continua sendo atos sucessivos e isso até a direita entendeu, tanto que copiou os passos do MPL em 2013. Entendeu tanto que copiou o movimento.

A luz está nos movimentos sociais, sem esses o ato de 28/04/2017 provavelmente seria um desastre. Considero o MTST com enorme relevância e se trata de movimento que mais cresce, deixa para trás até mesmo MST (diga-se tem sua importância histórica) porque se ajustou as necessidades dos trabalhadores dos centros urbanos com a questão da moradia e ultimamente tem sido frente também noutras questões. Mas aí temo e me pergunto até quando?

Pergunto porque até 2012 outros movimentos de moradia tinham certa relevância de atuação em SP o que se dispersou com a institucionalização, aí entendedores entenderão para não expor de forma ridícula a situação que a esquerda vive.


Então temos o movimento Passe Livre que está atuante mas tem tanto. Ainda não entendeu ou não conseguiu segurar a responsabilidade dos mais de 9/10 anos de mobilização que resultou nas jornadas de 2013. Não conseguiu aliar a sua pauta com as questões de hoje, reformas que afetam nitidamente o transporte e mobilidade de trabalhadores.

Aliás está insuportável ver no cotidiano tantos casos em torno do transporte público, falta de recursos das famílias.Aumento da pobreza, famílias em situação de rua, violência contra crianças e adolescente, violência contra as mulheres e chegamos no movimento de mulheres.

Movimento que nitidamente está sendo disputado em narrativa, representatividade e pautas com objetivo de velar discussões centrais e importantes do próprio movimento de mulheres, pretende também dispersar atenção em torno das reformas antitrabalhadores.

Esta disputa acirrada pela mídia no que diz respeito a pautas mobiliza em torno de questões superficiais e minimizam outras que são fundamentais para as mulheres.

Neste mês tivemos o assassinato da Maria Eduarda no RJ que infelizmente não viralizou nas redes como a vencedora do programa y.

Também temos mães que cotidianamente perdem seus filhos e não se enxergam no movimento feminista, mas no movimento de mães que pouco tem apoio do movimento feminista.

Ah mas essas pautas não são nossas. Ok. Então temos a exploração e abusos entre jovens mulheres que estão distantes da discussão do movimento feminista seja pelo discurso ou indiferença ou pela pobreza ou pela cor. E aí?

E finalmente chegamos no ponto chave da discussão ou na identificação da ausência de pelo menos metade dos 206 ou 207 milhões que não aderiram ao movimento de greve: a população negra.

As reformas antitrabalhadores afetarão de forma exponencial a população negra. Então o movimento negro tem o problema de se preocupar com as reformas e também a urgência de se preocupar com a sua existência, devido o genocídio quase que diário da população negra nas cidades de todo país. Acrescento aqui os indígenas, mas sabendo que em quantidade de ocorrências a população negra enfrenta a questão quase que diariamente.

Daí temos o resultado do descaso de todos, sindicatos, movimentos, partidos e governantes sobre a população negra. O resultado deste descaso está na prisão de 3 manifestantes do MTST no ato de sexta, enquadrados na lei sob a justificativa de associação criminosa e terrorismo.

Em 2013 tivemos um único preso das manifestações de junho de 2013, na ocasião por porte de pinho sol, em seguida por associação ao tráfico e os esforços para liberdade de Rafael Braga foram mínimos por parte da maioria pela simples e ordinária ausência de empatia e entendimento do racismo institucional.

Recentemente condenado há 11 anos no país mais seletivo no âmbito criminal ao conceder delação premiada e prisão domiciliar a ricos que negociam e compram direitos sociais e trabalhistas entendemos duas coisas: não importa quem coloquemos na cadeira da presidência as questões sociais são minimizadas ou reduzidas por empresários que compram mais ou menos a política a depender do partido; a centralidade da pauta está e sempre estará no trabalho mesmo que cada um discuta no seu quadrado (sindicato, movimento, partido).


Aí lembramos que a questão do negro (a) não é central em nada. Os atos e protestos esvaziados quando ocorrem assassinatos da população negra relembram de modo escancarado esta realidade e constatação.

Então a violência institucional da segurança pública está nos corpos negros. E qual o resultado do descaso? Agressão ao estudante de Goiânia, quando policial quebra o cassetete na cabeça do jovem sendo hospitalizado em estado grave. Menos mal, pois se fosse negro estaria morto como milhares.

Pareço cruel ao dizer isso? Não sou ou não quero ser, talvez se tratarmos assim entendam que seja no trabalho com postos terceirizados ou a falta de empatia com questões alheias cedo ou tarde vão atingir o seu corpo branco.

Seja na reprodução reduzida da violência ou crescente subalternização através de reformas desconexas com a realidade os corpos brancos serão atingidos. 

A indiferença mais que justificada com ausência massiva da população negra na adesão de greves e atos é compreensível, pois a vida se torna e é mais importante que qualquer coisa.

Posto isso, teremos sucesso em algum momento daqui anos, quando a população na grande maioria pobre e negra realizarão o seu levante, daí junho ou greve geral vai ser pequena perto do que está por vir.

Então continuem nesta gama de angariar atenção e participantes da classe média; perdure na indiferença e na imbecilidade de querer ocupar somente a paulista com showmício no dia do trabalho enquanto aqueles que sustentam a casta sejam de sindicatos e/ou partidos quiçá o país está longe dali.


O resultado da indiferença e descaso será visto com total espanto outra vez e com certeza não irá agradar os institucionalizados. A sorte é que não vamos esperar por 100 anos para novos atos ou greves de magnitude e impacto né. 


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