Passei muito tempo de minha vida ubérica vivendo a confortável ilusão de que era apenas eu quem tinha o poder de avaliar o motorista. Até que descobri, fuçando despreocupadamente no aplicativo, que eu também, na função de passageiro, era avaliado com estrelinhas. E, para minha grande estupefação, sujeito cordato que sempre pensei que fosse, reparei que minha média estrelar não era a máxima possível, a constelação de 5 estrelas não estava completa, não superando a marca vexatória de 4.7. Fiquei por muito tempo cabisbaixo, preocupado pensando no que cargas d'água eu tinha feito para algum (algusn?!) uberistas não terem me dado a nota máxima. Numa tentativa de auto-engano, prática não qual tenho Phd, julguei que minha baixa popularidade com alguns motoristas (com os piores, é claro) está no fato de eu viajar muitas vezes acompanhado de uma menina de 5 anos, minha filha, pequena pessoa que tem o polêmico costume de massagear as costas dos motoristas com os pés, prática esta jamais solicitada pelo suposto beneficiário (e nem sempre contida com o rigor necessário pelo seu nem sempre atento pai). Assim, passei a formular algumas práticas simples, que com o tempo revelaram-se decisivas para o aumento de minha avaliação junto aos cada vez mais exigentes motoristas.
1. Previna-se
Ao andar com uma criança com incontinência nos pés, prefira calçá-la com sapatos mais confortáveis (confortáveis às costas, no caso) como sapatilhas de algodão ou pantufas. Jamais galochas. Se preciso for, deixe-a apenas com meias ou mesmo descalça durante a viagem. Considere ainda pedir o uber na conta de outra pessoa nestes casos, de preferência na de alguma que não dê a mesma importância que você para avaliações (não se esqueça de pagar a pessoa em momento oportuno).
2. Use a tática do adversário
Tenha sempre um saco de balas em mãos e ofereça ao motorista logo após entrar no veículo. Em caso de recusa, deixe algumas estocadas no compartimento ao lado do câmbio, para o caso dele querer mais tarde. Copos de água mineral, preferencialmente gelada, costumam agradar também.
3. O protagonismo não é seu: deixe o motorista brilhar!
Antes do motorista iniciar a corrida, pergunte se ele possui algum caminho de preferência (lembre-se sempre, o motorista sempre tem razão. É ele quem vai dar ou não suas tão sonhadas 5 estrelas. Jamais questione a opção escolhida por seu motorista). Caso não tenha, sugira que utilize algum aplicativo de navegação no trânsito (o Waze, por exemplo). Ofereça o seu, como garantia.
4. Tome a iniciativa
A busca por uma nota maior também pode servir para atender a outras demandas suas, como a de conter a inevitável indiscrição dos motoristas. Como estratégia para os uberistas não perguntarem nada sobre minha vida pessoal (coisa que verdadeiramente detesto e faz com que eu me torne bastante antipático), eu tomo a iniciativa e pergunto eu sobre a deles. E o faço de forma frenética, contundente. É quase uma entrevista do William Bonner com o Fernando Haddad, simplesmente não deixo espaço pra eles falarem de outra coisa. E isso faz com que a gente ganhe intimidade (alguns se emocionam quando falam de si) e eu inevitavelmente termino com um abraço desejando boa sorte naquilo que eles estavam me contando (uma viagem, um novo emprego, uma reconciliação com o filho gay, essas coisas). São cinco estrelas garantidas.
5. Dê o exemplo
Termine a corrida sempre com a frase mágica antes de sair do carro: "Tenha um dia dia (tarde ou noite), Fulano. Estou dando 5 estrelinhas aqui pra você"). Daí não tem erro. É sucesso na certa!