sábado, 22 de agosto de 2020

7 livros peruanos (traduzidos para o português) que você deveria ler

Quando se pensa em literatura peruana, muito provavelmente o primeiro – e talvez o único – escritor que vem a nossa cabeça é Mário Vargas Llosa, o vencedor do Prêmio Nobel de Literatura, em 2010. Não sei o quanto devemos respeitar uma premiação que existe desde 1901 e que até hoje só premiou 7 escritores latino-americanos (que nunca premiou um brasileiro e que laureou apenas um escritor lusófono, o português José Saramago), mas o fato é que os premiados com o Nobel acabam sendo traduzidos para o mundo todo, por grandes editoras e acabam virando referência em seus países. Entretanto,  há muito mais na literatura peruana do que Mário Vargas Llosa! A parte chata é que muito pouco está traduzido para o português e menos ainda temos traduzido das mulheres escritoras peruanas. Mas ainda assim, não sem antes garimpar um pouco, é possível encontrar algumas preciosidades e surpresas. Vamos lá:


1. Só para fumantes (Júlio Ramón Ribeyro)

Esta é uma primorosa coleção de 13 contos escritos por Ribeyro ao longo da vida (1929-1994). O livro vai do tragicômico do homem que não consegue largar o vicio do cigarro (conto autobiográfico que dá título à coletânea) à questões sociais como a miséria que assola os setores marginalizados do Peru, como os meninos famintos de “Urubus sem penas”. A impotência dos homens perante à inexorabilidade do tempo e dos reveses da vida parece ser o mote de todos os contos e aparece na frustração do homem que não consegue largar o vício, na frustração do menino que não consegue recuperar os livros que foram do avô, na frustração do homem ao ver estilhaçado o espelho que passou por muitas gerações de sua família e por aí vai. Aqui temos o gênero conto representado em grande estilo. 


2. Os rios profundos (José Maria Arguedas)

Arguedas, que suicidou-se em 1969, era antropólogo e etnólogo e em “Os rios profundos” busca mostrar os dois Perus que existem, aquele que fala espanhol, descendente dos colonizadores, e aquele que fala quéchua, a língua da população nativa peruana, descendente da civilização Inca. O livro relata a viagem do menino Ernesto (personagem autobiográfico) e seu pai pelo interior do Peru, conhecendo as disparidades de relações sociais entre estes dois grupos. Arguedas era falante e tradutor do quéchua e os encontros e desencontros étnicos sempre o fascinou. “Os rios profundos” está editado no Brasil atualmente pela Cia. das Letras e também pode ser facilmente encontrado em sebos, em diversas edições.


3. Contar tudo (Jeremías Gamboa)

Jeremías Gamboa é uma jovem promessa da literatura peruana, elogiado por Mário Vargas Llosa e atualmente um best seller no Peru. “Contar Tudo” (livro de inspiração autobiográfica) foi publicado em 2013 e conta a história de Gabriel Lisboa, um jovem nascido na periferia de Lima, que decide abandonar uma sólida carreira como jornalista – sempre tão imediatista e sem poesia – para dedicar-se à literatura, onde procura encontrar a si mesmo e entender melhor o mundo. “Contar Tudo” foi publicado no Brasil pela Alfaguara e pode ser facilmente encontrado.


4. Um mundo para Julius (Alfredo Bryce Echenique)

Nesta obra de 1970, Echenique usa de exemplo às contradições existentes no interior da oligarquia limeña, para fazer uma grande crítica às oligarquias de toda a América Latina. O protagonista é Julius, um menino melancólico que vive no interior de uma dessas famílias e que recebe desta apenas frieza e indiferença. Num mundo de clubes de golfe e de roupas de grife, Julius parece não encontrar o seu lugar e encontrará afeto somente nos empregados da família (a babá, a cozinheira, o motorista filho de escravos), aqueles que eram tratados com desprezo e repugnância por seus pais e irmãos. Echenique, hoje com 77 anos, é um premiadíssimo escritor peruano ainda pouco conhecido no Brasil. É dele o prefácio de “Só para fumantes”, publicado pela Cosac Naify. “Um mundo para Julius” está esgotado no Brasil, mas ainda pode ser encontrado em sebos.


5. Bom dia para os defuntos (Manuel Scorza)

Publicado em 1970, esta obra representa o realismo mágico latino-americano, onde a magia anda de mãos dadas com – tristes – fatos reais. Temos um relato de como a população indígena peruana se organizou, no decorrer dos anos 50, para recuperar suas terras, roubadas com o apoio do governo, por grandes latifundiários e pela empresa estadunidense Cerro de Pasco Corporation, que explorava jazidas de minério no antiplano peruano. A publicação deste livro-denúncia foi tão grande no Peru, que o principal líder da revolta dos camponeses, Héctor Chacon, foi libertado após 11 anos de prisão no meio da Amazônia peruana. Atualmente, só pode ser encontrado em sebos.


6. Obra poética completa (Cesar Vallejo)

O maior dos poetas peruanos, Vallejo (1892-1938) é pouco editado no Brasil. Por aqui, sua poesia é artigo raro, encontrada em alguns poucos sebos. Sua poesia é bastante experimental rompe com os dogmas tradicionais da gramática, valendo-se de toda sorte de neologismos e recursos estilísticos (fusão de palavras, quebra inesperada de ritmo, etc). A oralidade de seus poemas nos faz lembrar bastante autores brasileiros como Guimarães Rosa e Manoel de Barros. 


7. Sexografias (Gabriela Wiener)

Gabriela Wiener esteve no Brasil em junho para participar da FLIP, a Feira Literária Internacional de Paraty e causou por aqui grande alvoroço. Isso porque seu livro “Sexografias” relata sua jornada jornalistica pelos extremos do sexo. Representante do chamado “jornalismo gonzo”, em que o próprio jornalista é alvo da reportagem, Wiener relata as experiências que teve em swings e em práticas sadomasoquistas.


Faixa-Bônus:

8. A cidade e os cachorros (Mário Vargas Llosa)

Sim, apesar de querermos priorizar aqui os menos conhecidos, Mário Vargas Llosa não pode faltar em uma lista de escritores peruanos. Neste livro de 1962, Llosa inspira-se em sua própria infância, quando foi enviado pelo pai autoritário a um rígido colégio
militar. A história se passa no Colégio Militar Leoncio Prado, onde os cadetes veteranos imprimem toda sorte de humilhações e hostilidades aos cadetes novatos, a quem chamava de Cachorros. Os meninos, em sua maioria pobres e já humilhados em suas famílias, acabam por tentar se unir contra as ofensivas dos mais velhos. Este romance revelou Llosa ao mundo e é uma ótima porta de entrada para sua grande obra, que contém títulos consagrados como “As travessuras da menina má”, “Conversas na catedral”, “Pantaleão e as visitadoras”, “A guerra do fim do mundo”, etc, todos com boas edições no Brasil pela Alfaguara.

5 comentários:

  1. Eu não conhecia nem sequer um escritor peruano. Então, adorei ler esse post e fiquei com vontade de ler Um mundo para Julius (Alfredo Bryce Echenique), talvez em espanhol mesmo.

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    1. Jacqueline, sou apaixonado por literatura latino-americana. A peruana é das que mais gosto. Temos uma história e uma cultura por vezes muito semelhante com a de nossos vizinhos de continente e é impossível não se identificar com a literatura deles, ainda que a língua muitas veze
      s nos afaste. Vá sem medo... haha... é um caminho sem volta!

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  2. Salvando as referências para o futuro, gracias Felipe!

    "Só para fumantes" está entre os melhores livros que já li na vida! Quase me fez comprar uma carteira de cigarros, mas ainda assim o amo!

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    1. Concordo com vc, Sirley. Da a maior vontade de fum... digo, de ler outros livros do autor. Menos ficcional, mas tb muito bom, recomendo "Prosas apátridas" dele. São aforismos sobre literatura e sobre tudo.

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