terça-feira, 24 de março de 2020

Quando o nosso lugar não basta

Existem outros modos de experimentar a vida. Outros inusitados modos de se relacionar, de construir e, assim, modificar nossas próprias concepções, colocando em discussão tudo aquilo que superficialmente constitui-se concreto e imutável.

Existem diferentes modos de olhar e perceber o outro, de dizer “estou no grupo das pessoas que te incentivam” com tal empatia como se fosse dito para alguém que se conhece desde a infância, em sua totalidade, como se fosse possível alcançar aquilo que há de mais profundo e oculto, quando na verdade, essas duas pessoas nunca se cruzaram no mundo real, onde tudo toma forma e verdade.

E isso faz parte de uma realidade moderna, em que nos aproximamos sem nunca estar e somos continuamente convidados a criar uma infinidade de conexões que tomam espaço de tal forma, que chegam a absorver nossas vidas em alguns momentos, tudo em um minúsculo espaço da tela, em que a discussão e o aprendizado são construídos e consentidos, ainda que na forma de uma conversa fluida que a gente espera que não acabe depois do “até amanhã”.

Mas qual o preço que se paga por abrir possibilidades e se aventurar nesses espaços? Talvez, o de romper as nossas próprias fronteiras ao agregar horizontes inquietantes – e nunca desbravados - à nossa rotina, simplesmente por ouvir deste outro que “o nosso lugar não basta”. E não bastam, mesmo no plural. Então, se nossos lugares não nos bastam, o que realmente nos define? O que define os limites dos papeis que assumimos ao longo da vida, o pertencer a tal ou qual lugar, o nosso vestuário, nossos gostos pessoais? Tenho feito essa pergunta desde, pelo menos, a minha adolescência e nunca é fácil responder. Nossos padrões e valores são tão arraigados que se tornam quase que um mantra, os quais não ousamos questionar, por medo, insegurança ou mesmo por considerar que eles não precisam ser revistos.

Mas, voltando à pergunta: e quando o nosso lugar não basta mais? Quando não basta - ainda que se queira, e se queira muito -  ser homem, mulher, mãe, filho, marido, estudante, médico, policial, e tantas outras personas que vamos adotando ao longo da vida e que vão, pouco a pouco, limitando cada vez mais o nosso espaço, para que possamos caber perfeitamente dentro daquilo que é esperado delas? Indo mais além, o que sobra se não somos a imaculada imagem que elas pressupõem? Se não sou a mãe amorosa, o estudante aplicado, o homem que não chora, a mulher que não gosta de maquiagem, ou o marido não-monogâmico?

Eu acredito que fica o que somos essencialmente, aquilo que de mais simples pode existir e que por isso mesmo é tão mais forte do que qualquer outra coisa, porque sobrevive ao que é ditado, nem sequer pede definição, porque é e vai sempre ser independentemente de qualquer outro papel que possamos adotar amanhã ou depois. E é justamente isso que está cada vez mais escondido, mas está lá.

Então, o que nos proíbe de reformular ou reinventar essas categorias, explorando as inúmeras possibilidades que cada um desses papeis pode oferecer sem que isso cause estranhamento, deboche ou mesmo desdém daqueles com os quais partilhamos nosso dia a dia? Isso eu não saberia responder de maneira simples e nem teria espaço aqui pra tal, mas é uma questão importante e que abre caminho para novos escritos. Entretanto, cabe citar que somos impedidos simbolicamente de seguir adiante porque não vemos respeitado o direito de desnudar a nossa real essência, seja ela qual for. O fato é que as possibilidades existem e as novas experiências e pessoas que chegam com elas, provam que é possível repensar os nossos limites quando entendemos que o nosso lugar não nos basta mais, só precisamos estar atentos e abertos pra isso.

domingo, 22 de março de 2020

Credenciais

Eu nunca fui ao Playcenter
Eu nunca tive videocassete
Eu nunca vi Velozes e Furiosos
Nem Indiana Jones
Nem exterminador do futuro
Nem Duro de matar
Eu odeio filme de ação
Não tenho paciência pra Senhor dos Anéis
Não gosto de videogames modernos
Eu nunca li Grande Sertão
Nem Proust, nem Cervantes
nem Jane Austen, nem Camus
Eu nunca comi Temaki
Não sei comer de palitinho
Eu nunca fui à Europa
Nem à África, Ásia, Oceania ou Antártida
Nada de América do Norte ou Central
E nunca botei os pés em 20 estados brasileiros
Nem no Distrito Federal
Eu não sei falar francês
Nem italiano, nem alemão
Falo muito mal inglês
Não gosto do humor britânico
Tenho medo de agulha
Tenho fobia de vômito
Minha pressão dispara quando olho pra um medidor de pressão
Não sei nadar
Não sei dar cambalhota
Não sei dirigir
Não sei fazer quadradinho de oito
Mas faço cover de Maria Bethânia no chuveiro que é uma beleza...






sexta-feira, 20 de março de 2020

Sabonete e álcool

De um lado da cidade, desde quando o vírus ainda estava restrito à província chinesa, Constanza Albuquerque de Bragança estava preocupada. Ela, que exigia da empregada uma casa com a brancura e assepsia de fazer inveja ao melhor dos hospitais particulares, já havia proibido os filhos de comprar bugigangas chinesas pela internet desde o começo do ano.

Agora vivia repetindo “eu avisei” por onde passava. Quando o filho mais novo tentou argumentar que, há anos, todos os meses ela vinha avisando sobre alguma tragédia sanitária diante de qualquer resfriado, portanto um dia teria que acertar na previsão, levou um cascudo.

A quarentena, que por ela duraria uns quarenta anos, era total. Ninguém colocava o pé sequer no jardim, que dirá na rua. Tubos de álcool em gel, comprados a preço de ouro ou de dólar no mercado negro, estavam espalhados em cada canto da casa. Home office para manter a empresa, aulas virtuais para os filhos, atividades físicas dentro de casa e banho de sol só no horário em que a luz entrava pela vidraça.

Do outro lado da cidade a empregada seguia a rotina de acordar cedo e partir para a viagem que a levava ao trabalho. Com a creche fechada, deixou os filhos com a vizinha, com a ordem de que podia bater se eles fossem malcriados, principalmente no mais velho, que era o mais bagunceiro.


O coletivo já não parecia uma lata de sardinha, de tão apertado. No máximo uma lata de ervilhas, com todas aglutinadas, mas um espacinho quase folgado para quem estava habituada ao aperto.

A surpresa veio quando tocou o interfone da patroa e ouviu a voz de Constanza “Oi, não vai entrar em casa com essa roupa imunda. Seu uniforme está no banheiro dos fundos, toma um banho antes de trocar e lava esse cabelo.” Ela trabalhava naquela casa há alguns anos e nunca pode usar nem os sabonetes do banheiro. Se quisesse lavar as mãos tinha que usar o sabão do tanque e agora não só podia, mas tinha que tomar banho!

Lá estava o sabonete. Novinho. Na embalagem. E sabonete de rico. Protex. Ela nunca tinha usado e logo na primeira vez usaria até nos cabelos, já que nenhum xampu foi deixado no banheiro.

Se toda ordem da patroa fosse assim a vida seria um mar de rosas, pensou enquanto molhava o corpo. Pegou o sabonete e esfregou pelo corpo com toda a satisfação, vendo a espuma se acumular sobre a pele. Estava lavando os cabelos quando ouviu Constanza gritando de dentro de casa “Vai morar aí? Se demorar muito vou ter que descontar o banho do seu salário!”

Mal deu tempo de se enxaguar, tirar o excesso de água com a toalha e vestir o uniforme. Entrou pela porta dos fundos e a patroa pediu para que colocasse a máscara, pendurada no trinco da porta. Máscara?

E foi assim, mascarada e um pouco úmida, que a empregada seguiu a rotina de manter a casa quase esterilizada. A diferença foi a presença constante da patroa fazendo seu romófis e mandando ela fazer tudo o que já estava habituada a fazer sem ninguém mandar.

Já se preparava para ir embora, estava até atrasada para pegar as crianças com a vizinha, quando ouviu o “Ôh” da patroa.

- Pega um pano e passa álcool por tudo agora.

- Álcool, dona Constanza?

- Álcool. Tem um galão na dispensa. Passa por tudo, não esquece de nenhum canto.

- Mas pra quê dona Const....

- Você não assiste jornal, não? Esse vírus está matando todo mundo, eu não quero morrer por causa da sua preguiça, vai!

E ela foi. O segundo tempo da faxina. Álcool no piso, nos vidros, nos móveis, nos eletrodomésticos, na decoração, não ficaria espantada se tivesse que passar álcool até nas plantas. Seguiu ganhando uma diária. Constanza achou injusto pagar a mais, afinal uma diária é o período de um dia e o trabalho, esticado, não ultrapassou esse limite.

No ônibus da volta só pensava na bronca que ia levar da vizinha. E com razão. Era um favorzinho que acabou tomando o dia inteiro.

- Foi por causa do álcool!

- Muito bonito! Eu me acabando com essas crianças pra você ficar enchendo a cara!

domingo, 15 de março de 2020

Frustação e alegria

Olá pessoal,

No post de fevereiro (leia aqui) eu prometi escrever sobre as experiências de ser reprovada e depois aprovada no processo seletivo Chevening.

Pois bem, começaremos então pela frustração.

Lembro como se fosse hoje do dia 12/02/2016, quando recebi o e-mail dizendo "We regret to inform you that we will not be taking your application any further on this occasion" (Lamentamos informar que a sua candidatura não foi levada adiante nessa ocasião). A mensagem em si já teria sido frustração suficiente. Mas o efeito da notícia de que eu não havia passado nem sequer pela triagem, foi potencializado por outras coisas que eu estava vivendo naquele momento. 

Estávamos bem no começo na onda da transição capilar, com meninas crespas e cacheadas assumindo a sua cabeleira. Eu tinha feito o meu BC (corte de cabelo que tira a parte alisada) exatamente naquele dia (veja foto abaixo). Então, imagina só como eu estava emocionalmente abalada! Fui dormir chorando nesse dia, literalmente chorando.

Big chop em 2016
Como sou brasileira e não desisto nunca, no ano seguinte decidi tentar a bolsa Chevening de novo. Eu sabia que o resultado da triagem chegaria em fevereiro, então fui me preparando psicologicamente para uma possível resposta negativa. Dessa vez, a mensagem foi "We are pleased to inform you that your application for a Chevening award has been progressed to the next stage" (Estamos felizes em informar que a sua candidatura progrediu para o próximo estágio). Cara, que emoção! Ainda tinha uma longa jornada para percorrer, mas essa pequena vitória já significava muito! Significava que eu era uma Jacqueline mais preparada do que a Jacqueline do ano anterior.  

A melhor notícia de todas chegou em 08/06/2017, depois de mais algumas etapas do processo seletivo. Eu sabia que o resultado final chegaria no começo de junho, mas não tinha data exata. Então, a partir do dia primeiro eu já comecei a atualizar meu e-mail de minuto em minuto. Quando vi que tinha chegado e-mail com remetente Chevening, meu coração acelerou. Eu cliquei para abrir a mensagem e demorou uns segundos para carregar. Lembro que meu namorado estava em pé na minha frente falando comigo, mas eu não tenho ideia do que ele estava dizendo. Deposis que a mensagem finalmente abriu e eu li que tinha sido aprovada, pulei em cima do meu namorado, quase caímos no chão. Comecei a gritar, meio maluca mesmo. Era cedo, umas 7h da manhã, e a mãe dele estava dormindo. Eu fui até o quarto acordá-la! Em seguida liguei para a minha mãe. 

Dali para a frente foi emoção pura. Eu lembro de ter passado o dia sorridente. 

Vou encerrando por aqui e contarei mais sobre as demais emoções nos próximos posts.

Até breve.

segunda-feira, 9 de março de 2020

Corra, Carol, corra!

Sou o tipo de pessoa que está sempre se aventurando por novos caminhos. Acredito que estamos aqui é pra viver. Testar as possibilidades de experimentar, criar, aprender, descobrir... a vida é só uma e quero aproveitá-la de diferentes maneiras.

Uma de minhas últimas empreitadas foi a corrida. Na verdade, trata-se de uma revisita a algo que já tenho alguma experiência prévia. E por experiência prévia, quero dizer: Ter participado de uma corrida e caminhada contra o câncer de mama em 2013 com irmã e tias, na qual fui tão despreparada que coloquei o chip de corrida como pulseira (se você nunca viu nem ouviu falar sobre isso, como eu na época, trata-se de um chip descartável que os corredores recebem para cronometrar o tempo de corrida e para isso são colocados nos tênis dos atletas). Além disso, nossa proposta aquele dia era mais recreativa do que competitiva, e sem treino prévio, não aguentei correr o percurso todo, dava uma corridinha, andava um tanto, corria mais um pouquinho, caminhava novamente... O que fez o percurso de 5 km parecer quase interminável rs. 

No fim do ano passado, resolvi voltar a correr, e consultei o professor da academia que frequento para me ajudar em um treino de corrida. Para minha tristeza o plano proposto tinha mais fortalecimento muscular do que corrida em si, incluindo uns exercícios horríveis que dá preguiça só de lembrar. Entendi a necessidade do fortalecimento muscular e, no início, segui o plano com disciplina, mas depois de um tempo (incluindo natal, ano novo, carnaval) acabei fazendo algo mais... flexível, digamos assim.

A princípio, meu interesse era de correr na esteira da academia mesmo, em ambiente controlado, com ar condicionado e tal, mas há um mês atrás, umas amigas do trabalho se inscreveram em uma corrida de rua, me animei para acompanhá-las e lá fomos nós. Estava um pouco receosa de não conseguir completar o trajeto todo correndo, mas ao mesmo tempo, me tranquilizava pensando que "se cansar, caminho por 1 minuto e volto a trotar, já fiz isso uma vez e ninguém morreu nem vai morrer por isso". Passei por uma fase de treino intenso que me causou bolha na sola do pé esquerdo, e por outra de total leniência, beirando o sedentarismo, mas no fim deu tudo certo.

A corrida foi ontem, e a experiência foi incrível! O dia estava claro, porém com nuvens providenciais, que nos pouparam de um sol de rachar, e nos deixaram mais frescas e menos cansadas. Aquele mundaréu de mulheres correndo -em especial minhas parceiras de corrida, do início ao fim, Maria e  Fernanda- me davam pique, energia para continuar correndo, e o Jorge Ben na minha playlist dava o ritmo e a animação necessários. Terminei os 5 km em 45 minutos e com a sensação de que aguentaria mais 1 km. 

Foi totalmente diferente de correr na esteira, é outra experiência. A comoção causada por milhares de atletas reunidas ocupando da cidade de uma forma inusitada... Correr por locais que costumamos passar somente de carro ou transporte coletivo me trouxe outra perspectiva do que é viver a cidade*, que faz um deslocamento de ver a cidade como um local, cenário, para a cidade como algo vivo e dinâmico, do qual somos parte.

Hoje estou com as pernas doendo e com uma vontade enorme de me inscrever em tudo quanto é corrida de rua! 

Crédito da imagem: Iguana Sports

*outros eventos que me trazem essa perspectiva são os atos e manifestações políticas e o carnaval de rua.

domingo, 8 de março de 2020

Algunas consideraciones sobre la Terapia de izquierda


Ante tantos hechos de publico conocimiento, teñidos desde lo sutil a lo extremo de misoginia y fascismo, ha crecido en la población un malestar manifestado en síntomas de indignación extrema y rumiación constante, que amerita que en este momento de la historia, se desempolven los lineamientos de la, por pocos conocida, terapia de izquierda.
La terapia de izquierda, en algunas épocas anteriores, ha sido denominada terapia política. Si bien como concepto, es adecuado al procedimiento, no tiene en cuenta su especificidad, en términos de realización de intervenciones de carácter emancipatorio y reivindicatoria característicamente.
Nace claramente en el seno de las acciones revolucionarias entre los años 50 y 70, en su versión mas radical, la terapia de izquierda revolucionaria. Luego de sucesivos golpes de estado en países latinoamericanos, la evidencia empírica sobre estas corrientes ha sido destruida y quemada, dejando en su lugar versiones mas blandas y “diplomáticas” de la corriente anterior; y que se ha dividido en corrientes tanto denominadas “terapia de centroizquierda”, “ y de centro”, más ligadas en sus conceptualizaciones a ideas relacionadas a una búsqueda interior individual que diera paso a una presunta “evolución” posterior, también de características individuales. 
No obstante, las teorías de la terapia de izquierda originales comenzaron a cobrar fuerza pasados los años 90, luego de sucesivos cambios y cuestionamientos a nivel político en diferentes regiones de America Latina.
Denominada de izquierda, como hemos mencionado, por la particularidad de sus intervenciones:
El posicionamiento ético y epistémologico de esta modalidad de terapias esta mas ligado a procedimientos de terapias de corte cognitivo y sistémico- si bien ha recibido aportes de otras líneas teóricas-, en el sentido de que para aliviar un síntoma que causa malestar en estos nuevos padecimientos de la sociedad actual ( a través de sus representaciones), las intervenciones , a grandes rasgos, apuntan a una acción concreta en la realidad que genere una especie de “sacudida social”, seguido de la perplejidad de la gente presente y la posterior reflexión sobre la acción.
En cuanto a la cantidad de participantes , ha sido recomendado la realización grupal, por la efectividad en términos de alcance, si la acción es conjunta. Sin embargo, versiones posteriores han experimentado con la modalidad individual, tomando como aportes teóricos las ideas de algunos intelectuales de la psicología social y su concepción de micropoderes en la practica social. Estudios realizados en una cantidad reducida de la población ha constatado el valor de estas intervenciones, aunque con una eficacia a menor escala (…)
Proxima nota: Terapia de izquierda y psicoanálisis: algunos aportes de la mirada psicodinámica.
L.P.


sábado, 7 de março de 2020

Tres preguntas heroicas en la búsqueda de sentido

Tres preguntas heroicas en la búsqueda de sentido

   Los tiempos que corren están caracterizados por la falta de estructuras, por la instantaneidad, la ausencia de compromisos estables y duraderos, como diría el sociólogo Bauman, son tiempos de amores líquidos; estamos atravesando lo que llama la modernidad líquida.

   Reflexionando filosóficamente, el agua como elemento puede provenir del cielo brindando la posibilidad de nueva vida al caer sobre la tierra; puede encontrar un cauce y convertirse en río llegando al mar, o encontrar un lago en el camino.

   En todos los casos, el agua necesita de una dirección clara y precisa. Hoy, en épocas de liquidez, por esta carencia de estabilidades bien definidas, más nos parecemos a un charco de agua derramado sobre una mesa de espejo. Permanecemos sin forma concreta, estancos, confusos, indefinidos. Pues decir que como sociedad nos vamos transformando espontánea y aleatoriamente “hacia donde surja”, en realidad podría estar escondiendo que olvidamos hacia dónde ir, que en realidad lo desconocemos.

   Si nos remontamos a lo clásico, que se vuelve clásico por trascender el tiempo y acercarse a lo atemporal, las escuelas de filosofía entendían que uno de los principales roles del ser humano como tal, se encuentra en el desarrollo de la virtud; en la práctica de valores humanos y trascendentes.

   Por eso las grandes civilizaciones se focalizaron en aprender a convivir y desarrollar una cultura que hiciera las veces de escuela para aprender a vivir; un lugar donde uno pudiera experimentar y poner en práctica lo aprendido teóricamente, dotándolo de comprensión. Acercándose así al entendimiento de las leyes que regulan a la naturaleza, a la sociedad en su conjunto y a cada uno de sus individuos.

   Pero la convivencia demanda poner en práctica numerosas virtudes: tolerancia, humildad, respeto, paciencia, entre muchas otras. Y el desarrollo de la virtud es el punto que unifica a todos los filósofos y pensadores naturales de los que tengamos registro: Aristóteles, Buda, Confucio, Platón, Marco Aurelio, el Inca Pachacutec…

   La virtud, para ser desarrollada, requiere que uno emprenda una guerra de dos filos, uno externo y uno interno. Las batallas más duras se dan dentro de uno mismo contra los miedos y defectos; uno vencería en la medida que pueda poner en práctica, como resultado, conductas verdaderamente humanas hacia afuera. Poder poner en práctica las virtudes y aprender a convivir, sabiendo que cada uno de nosotros está en una batalla constante, de las que a veces salimos victorioso y a veces nos retorcemos tras la caída, demanda una actitud inegoista.

   En las mitologías de todos los pueblos existe un modelo ideal de ser humano, un arquetipo que les inspiraba representando el ejemplo a seguir: el símbolo del héroe. Así Herakles en Grecia, Hércules en Roma, Gilgamesh en Mesopotamia, Arjuna en India, el Rey Arturo en Europa, Frodo, Don Quijote…¿tal vez Besouro Cordão de Ouro?

   El héroe se caracterizaba por tener habilidades desarrolladas puestas en práctica para el bien de la comunidad en que vivían. Destruir a los monstruos, emprender largos viajes, derrocar tiranías, darle movimiento y sentido a la historia, eran logros de estos personajes, que nunca tenían al egoísmo como base. Las obras del héroe unificaban a los pueblos, aportaban a la convivencia y dotaban de identidad.

   Pero en estas épocas nebulosas, la inestabilidad con la que se atraviesan los días nos vuelve temerosos, y el miedo nos vuelve egoístas. A las inseguridades en vez de darles lucha, las tapamos muchas veces con el materialismo y todo tipo de consumos. Este círculo vicioso va calando más profundo en cada ciclo, y nuestras acciones en vez de ser en pos de valores humanos, son en pos del individualismo.

   Queremos tener más dinero, poder comprar más objetos, ser reconocidos todo el tiempo, tener la razón y darles satisfacción a todos nuestros impulsos, por más animales que sean. De esta manera nuestro foco se intensifica sobre nosotros mismos y nos aislamos del resto; tanta luz sobre uno incandila y desorienta. No sabemos bien qué queremos hacer de nuestra vida; no sabemos cómo huir de los problemas; poco conocemos nuestros defectos, y adquirimos un escaso conocimiento de nuestras habilidades.

   Afortunadamente, parafraseando a Platón, no hay persona tan cobarde que el amor no haga valiente y transforme en héroe. En estos momentos que nuestra identidad como pueblos también no es nebulosa, todo podemos convertirnos un poquito en héroes en nuestra vida cotidiana. Y una manera es hacernos preguntas, reflexionar y ponernos en acción.

   El ser humano desde su surgimiento como tal, tiene la capacidad de hacerse preguntas. En la búsqueda de soluciones prácticas para el día a día, al comenzar una actividad, o al emprender la aventura de realizar un sueño, hay tres preguntas que podemos hacernos y nos aportarán algo de luz ante las incertidumbres. ¿Qué?, ¿por qué? Y ¿Para qué? Se vuelven casi palabras mágicas.

  Preguntarnos qué estamos por hacer, nos focaliza y nos permite concentrarnos en una actividad, organizarla; nos hace saber que no estamos viviendo bajo la inercia, si no que estamos conduciendo -bien o mal- nuestra personalidad.

   También tendremos que descubrir por qué lo estamos por hacer. Esta segunda respuesta nos acerca a entender cuál es la necesidad; a dónde es necesario que yo actúe y en qué modo.

   Finalmente, el para qué, nos va a traer la respuesta a cuál es el fin de mis deseos. Esto nos puede recordar a las enseñanzas de los estoicos, cuando hablaban que el universo evoluciona a través de dos fuerzas: la necesidad y la finalidad. Todo ocurre porque es necesario que así sea, y todas las cosas buscan un mismo fin.

   Si el objetivo del ser humano es aprender a desarrollar las virtudes, claro está que nuestras acciones deben ir en esa dirección. Si lo que vamos a emprender está sustentado en deseos egoístas o está impulsado por nuestros miedos, seguro va a decantar en que nos separemos y alejemos de las personas. Si nuestros pensamientos, emociones y acciones se dirigen hacia la práctica de los valores humanos, es más probable que una mejor convivencia pueda alcanzarse. Si creemos en las palabras del filósofo Confucio: una sociedad será mejor, en la medida que cada uno de sus ciudadanos sea mejor. Y con mejor me refiero a ser coherente, íntegro, humano (y no una piedra, un vegetal o un animal).

   Ser conscientes de nuestros actos (y para eso pueden ayudar las preguntas), experimentar la vida, reflexionar sobre nuestras experiencias puede hacer que nos sintamos más seguros, más unidos a los demás y a la naturaleza. Saber responder a los qué, a los por qué y a los para qué, nos ayuda a despejar la niebla de la duda y a recobrar claridad, ya que “ningún viento le es favorable al barco que no sabe a qué puerto se dirige” comentaba Séneca por el siglo I de nuestra era. Rastrear el ¿qué?, el ¿por qué?, y el ¿para qué?, bucear buscando el sentido de las cosas, en estos tiempos puede convertirse en un acto heroico.

   Creo profundamente que podemos recuperar el sentido de orientación como sociedad, siempre que podamos recuperarlo en nosotros mismos. Sólo necesitamos voluntad para emprenderlo y continuarlo; amor para alimentarnos e inteligencia para concretarlo y superar las barreras que nos distancian a unos de otros.

Franco P. Soffietti



quarta-feira, 4 de março de 2020

Só estou fazendo meu trabalho

Estava procurando um lugar para carregar o celular na rodoviária. Havia uma moça utilizando a tomada e quando ela saiu fui utilizar. 

Passado cinco minutos, chega o segurança. 

_Rapaz, tem como você sentar ali do outro lado perto das cadeiras? 

_Depende... por quê?

_Semana passada roubaram aqui e agora o dono está preocupado com você aí. 

_Pois avise que não vou roubar nada. Uma garota ficou aqui por meia hora e vocês não falaram com ela. 

_Eu sei, mas ela é ela. 

_Antes dela tinha um cara também, moço. Cheguei cedo na rodoviária, minha bateria acabou. 

_Vá para o outro lado, rapaz. Tem cadeiras lá. Não vá me arrumar problemas. 

_Amigo, estou só carregando o celular. Daqui a pouco saio. 

_Mas o dono da loja em frente pediu... E você sabe como esse povo é, né? Olha para você e já pensa coisa. 

_Sei... O pior é que eu sei. Mas, e o senhor? 

_Eu só estou fazendo meu trabalho.