terça-feira, 20 de julho de 2021

Seres virtuosos


Dizem que os animais se parecem com seus donos. Difícil distinguir as semelhanças das coincidências, além do desejo de personificar o animal de estimação. Neste mês perdi uma cachorra de 17 anos. Inevitável projetar nela um jeito introspectivo e calado, de quem podia passa horas ao lado das pessoas, em aparente indiferença, quebrada por qualquer tentativa de afastamento.

Na mitologia grega, Epimeteu distribuiu quase todas as virtudes disponíveis aos animais. Já nasciam prontos, com tudo o que necessitavam para exercer a única função que poderiam exercer. Não há o dilema sobre o que ser quando crescer, pois não há alternativas a serem escolhidas.

Depois disso, Prometeu deu ao homem o que sobrou. A astúcia. Diferente da cachorra que nasceu há 17 anos e pouco mudou desde então, os humanos devem usar a astúcia da melhor forma diante da infinidade de possibilidades da vida. Eu era outra pessoa em 2004. Mudei de cidade, morei em umas três casas, fiz uma graduação, viajei, etc. Poderia ter feito tudo diferente. Foram as escolhas e as consequências que me trouxeram até aqui.

Esse mito, analisado e desdobrado pela filosofia ao longo de séculos, inspirou Sartre a escrever ‘O ser e o nada’, no qual os homens são, evidentemente, o nada. A ideia não é reduzir a humanidade, mas indicar que, ao contrário dos outros seres, não somos nada de forma inerente, apenas nos tornaremos algo, a depender de como utilizamos a astúcia e de uma série de fatores que se intercalam ao longo da vida.

Biologicamente a astúcia mitológica é o cortex pré-frontal, região desenvolvida no cérebro humano, que nos permite raciocinar, fantasiar, criar e imaginar situações, até onde se sabe, exclusivas de nossa espécie. A mitologia, possível graças ao córtex pré-frontal, é mais atrativa e sedutora do que as explicações da ciência moderna.

Temos a virtude presenteada por Prometeu, que pode nos tornar únicos, mas a sensação que fica, após acompanhar toda a vida de um cão, é a de que nos falta muita coisa. Pelo menos podemos aprender com a astúcia.

Restam as lições de companheirismo, a intensidade do afeto e a simplicidade de viver cada momento atual. Diante do presente decepcionante, nos enganamos com o futuro idealizado que nunca chega, ou nos escondemos no passado filtrado que omite problemas.

Epimeteu já fez os seres completos, preparados para não se importarem com o tempo marcado no relógio. Vivem o tempo da alma, marcado pelas necessidades e prazeres imediatos. Podem não conseguir imaginar histórias, nem escrever em blogs, mas têm muito a nos ensinar.

domingo, 18 de julho de 2021

a história do mar que entrou pela janela e afogou o piano

São Paulo, domingo, 18 de julho de 2021.

- a história do mar que entrou pela janela e afogou o piano - Cristina Santos - post 15 - Blog das 30 pessoas - 

título: a história do mar que entrou pela janela e afogou o piano

página: 11

Tô quebrada. O problema é que eu tô quebrada. Não sei se nasci assim ou fui me quebrando aos poucos com a respiração. Quebrada como uma caneca ou um prato que caiu, não adianta colar.
Quase sempre sinto que viver é algo tão difícil, tão incômodo quanto um espinho na cutícula já machucada. É como se eu estivesse dentro de uma máquina ligada de lavar roupas. O tempo todo. Aí tudo fica misturado e não sei mais o que tô sentindo. 

Oiê! Espero que dentro do possível, vocês estejam bem. 💛
Até o próximo post.
Beijos,
Cristina Santos

P.S.:

1- o meu monólogo:  - a história do mar que entrou pela janela e afogou o piano - foi escrito em agosto de 2017.

2- provavelmente compartilharei outros trechos desse texto.  

quinta-feira, 15 de julho de 2021

Estudante acompanhado

Fala galera!

No mês passado, fiz um resumo das principais exigências para o visto de estudante no UK. Hoje gostaria de contar um pouco de como é o processo para quem deseja fazer a mudança para o UK acompanhado (como foi meu caso). 

Durante as minhas buscas por uma vaga de doutorado com bolsa, o meu namorado me apoio demais. E nós combinamos que, se a tão sonhada vaga de doutorado desse certo, nós iríamos nos mudar juntos.

Felizmente, de acordo com as regras do visto britânico, o estudande de curso de pós-graduação em tempo integral com duração de ao 9 meses, pode levar "dependentes". Filhos menores de 18 anos, maridos/esposas e parceiros civis são considerados como dependentes. Casais que moram juntos há pelo menos dois anos, mesmo sem terem firmado uma união estável ou casamento, também podem ser considerados como dependentes. Nesse último caso, o grande desafio é comprovar a existência de um relacionamento, já que não existe um documento formal. Para os demais casos, a certidão de nascimento, certidão de casamento ou de união estável deverão se apresentadas. Os documentos devem estar traduzidos para o inglês com tradução juramentada, o que custará um dinheirinho (pagamos cerca de  150 reais para traduzir a certidão de casamento).

O processo do visto para o dependente é semelhante ao visto do estudante. Na verdade, chega a ser até mais simples. A mesma CAS utilizada no processo de visto de estudante, será solicitada ao fazer a inscrição do dependente. Os custos para o visto de dependente são os mesmo do visto de estudante  (detalhes no post do mês passado). O dependente não precisará comprovar proeficiência em inglês.

Para o meu caso e do meu parceiro (Lucas), não estávamos nem sequer namorando há mais de dois anos (quem dirá morando juntos). Portanto, nossas opções seriam a união estável ou o casamento. Depois de um certo debate, achamos que mudar para um país completamente novo e começar a vida do zero seria o equivalente a um casamento, mesmo sem um pedaço de papel para provar. Então, porque não já formalizar isso de uma vez (ao invés da união estável)?  

Não deu outra! Para desespero dos nossos pais (e alegria da minha mãe), agilizamos tudo e nos casamos em algumas semanas. Por conta da pandemia, do prazo e da grana apertados, fizemos somente o casamento civil. Não fizemos festa, mas reunimos as nossas famílias (pais e irmãos) para um almoço. Aliás, foi nessa ocasião que os nossos pais se conheceram pessoalmente.

Somente depois de termos a certidão de casamento em mãos e traduzida para o inglês (além dos demais documentos mencionados no post anterior), demos entrada no nosso pedido de visto.

Termino o posto de hoje com uma foto do grande dia!























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segunda-feira, 12 de julho de 2021

Fazer o bem

A eterna dúvida: fazer o bem compensa?
Sim, dizem religiosos, compensa.

Científicos dizem que fazer o bem gera uma sensação positiva na pessoa.
Místicos garantem que fazer o bem é a única maneira de reverter qualquer carma.

Então por que é tão difícil para o ser humano fazer o bem? Porque tem que ser algo que traga recompensas ou paz de espírito? Por que não pode ser feito de maneira genuína?

Se não existe carma, sensação boa ou os anjos não estivessem olhando, faríamos o bem? Complicado saber a resposta.

Estamos no século XXI e ainda temos essa dúvida, se fazer o bem compensa.

Otimistas dizem: o ser humano é bom na sua essência.
Discordo. Nem todos nascem com a mesma essência, existem pessoas que se alimentam de outras fontes, a maldade é uma delas.

Não podemos ignorar a maldade humana, essa que existe apenas porque gera o prazer em alguém. Pessoas maldosas desfrutam das coisas que fazem, é para elas uma alegria constante perturbar alguém.

Por que fazer o bem nos gera tanto desconforto? Nos sentimos bobos ao pensar que queremos fazer o bem. É um pensamento constrangedor.

O bem hoje não é um valor, é algo que se faz na surdina, para não parecer que a pessoa é ingênua.

Aprendi isso, é melhor os bons se esconderem. O mundo não é deles, não são maioria, pelo contrário, são tão poucos que não seriam suficientes para montar uma pequena cidade. O mundo é dos maldosos, de seu ruído nauseante, de suas comemorações insanas.

Quem é bom sabe que hoje só é possível sobreviver se estiver escondido, longe dos olhos ruins.

Ser bom exige uma habilidade gigante para sobreviver em um mundo de tantas pessoas más. 
Ainda assim acredito que vale a pena ser bom, vale a pena fazer o bem. Vale a pena viver sem ter que se esconder do sol.





Iara De Dupont

sexta-feira, 9 de julho de 2021

Sobre parar

Fui ao mercado comprar papel higiênico, pão e legumes para o jantar. Antes de passar no caixa olhei para o lado, vi o freezer e resolvi comprar um picolé de coco. Uma decisão simples, mas que impactou o resto do meu dia. Ao sair do mercado, ao invés de ir para a direita e voltar direto pra casa, preferi ir para a esquerda e atravessar a rua para ir na praça que fica ao lado do mercado, dar uma voltinha, escolher um banco mais afastado e parar. 

Sentei para saborear o picolé enquanto observava o céu, o sol, as árvores, a terra, as folhas caídas, alguns pais e filhos aproveitando a tarde, algumas pessoas passeando com cachorros, conversas calmas, crianças brincando...

Senti alegria, leveza, liberdade e paz.

Em um mundo tão caótico, complicado e acelerado, foi gostoso apenas parar.