Dei pela existência do velho galpão faz tempo, foi quando tinha uns quatro anos. Minha família decidiu abrir uma livraria numa cidade vizinha, bem menor. Meus pais decidiram me matricular em uma creche lá, portanto, todo dia cedo viajava com eles. O trajeto era curto, uns 7 quilômetros, que se tornavam uma eternidade para uma criança.
Com o tempo, aprendi a omitir a costumeira pergunta “tá chegando?”, que tanto irrita os pais. Fui notando que perto do destino havia um galpão gigante, na metade da altura de uma ladeira. A última ladeira antes de chegar à cidadezinha que teve a honra de hospedar a Livraria Tatiana (sim, era esse o nome). De modo que ao avistar o galpão sabia que a viagem e os sacolejos chegavam ao fim.
Na época da abertura da livraria meu pai tinha um fusca branco. Como nunca teve apego a carros e como sempre teve a destreza de negociar, seus bens iam e vinham. Os fuscas iam mudando de cor. Tivemos um amarelo, um vermelho, um azul. Cheguei a criar o passatempo de ficar adivinhando qual era a cor do fusca com o qual meu pai apareceria me buscar.
A livraria fechou, mas a cidade permaneceu no meio do caminho da cidade onde o ônibus para e aquela onde mora minha família. Quando venho visitá-los, meu pai me pega na primeira e me leva até a segunda, geralmente reclamando da vida, querendo saber de tudo. Nem sempre presto atenção no galpão.
Hoje, reparei nele. Muito velho, com as madeiras meio apodrecidas pelo tempo, a pintura descascada. Mesmo assim, imponente sobre a ladeira. Achei engraçado observar depois de pelo menos 20 anos um local que me era um importante ponto de referência. Estranho como as coisas perdem a importância. Mais engraçado ainda olhar para o lado e ver como homem que dirigia o carro também estava velho. Barba longa, fios brancos, testa enrugada pelo tempo, pelos problemas de cada dia.
O galpão, sempre lá. Meu pai, sempre ali.
Não é uma conclusão triste. Mas o galpão, meu pai, as rusgas, as rugas , a sonoridade dos pássaros na cidade tranquila, a chegada, a passagem e a partida me fizeram perceber que nada vai mudar. Será, de um jeito até meio sombrio, sempre assim.
"Mas o galpão, meu pai, as rusgas, as rugas..." "sempre lá, sempre ali..." Sei que tá longe disso, mas ontem, num trecho do livro que tô lendo, dizia-se do tempo e de como com o passar dele o passado ia ocupando um espaço maior. Até um dia em que seria só lembranças... Medo!
ResponderExcluirgostei do texto, simples e sincero. e acho que é isso, o mundo gira, gira, gira, e no fim passa pelos mesmos lugares sempre. nada muda. tudo fica.
ResponderExcluirVisualisei tudo. Ei, tudo muda e mudará, será? Beijo.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirSim, deu pra visualizar tudo mesmo. As coisas são assim. E causos da sua família sempre são tão legais de ler. bju taticaaaa!
ResponderExcluirseria essa cidade Vitorino??seria o galpão o do trevo??? hauhauha....
ResponderExcluirbeijosss...