quarta-feira, 29 de junho de 2016

brado retumbante ou légitime défense

Antes de tudo:

FORA TEMER!
PRISÃO PARA EDUARDO CUNHA!
FORA GOLPISTAS!

Preciso sair ir ali à biblioteca.
Mas volto, enquanto isso escuta o cara:




A letra e vídeo evidenciam as Jornadas de Junho de 2013, quando milhares foram às ruas protestar pelos famigerados 0,20 centavos da passagem, que de fato e na verdade sintetizavam a insatisfação da população com o estado mínimo e sociedade capitalista.

Passou anos e ainda é difícil entender ou explicar as Jornadas de Junho. Leio artigos e matérias a respeito e quase sempre me pego pensando em 2013 sem entender ao certo como foi que aquilo pôde acontecer.

Mesmo que eu concorde com algumas considerações que leio porque se aproximam um pouco do que imagino como hipóteses, só discordo veementemente e com repúdio quando dizem que se tratou de uma preparação para golpe de 2016. Não acredito! 

E se quer saber creio que após o golpe de 2016 as chances de termos outras jornadas para os próximos anos ou meses são enormes, entretanto com várias diferenças no perfil dos manifestantes.

O golpe parlamentar, midiático e judicial em 2016 foi motivo de muitos protestos pelo país, mas as consequências e desdobramentos provavelmente serão uma expressiva motivação para protestos maiores nos próximos meses em algumas regiões do país. 

As conseqüências já podem ser sentidas em todo âmbito institucional e embora a mídia faça de tudo para apoiar o golpe, os protestos ocorrerão mais precisamente em São Paulo pela atuação política de alguns setores de trabalhadores combativos como SUAS, SUS; além da luta autônoma dos estudantes secundaristas pela Educação, e principalmente no Rio de Janeiro após realização das Olimpíadas.

O Rio de Janeiro tem sido ou está se tornando uma caixa de pandora, cheia de chagas e demônios que irão protestar de forma violenta se as atitudes da Segurança Pública continuar ainda mais autoritárias.

Assim que realizada as Olimpíadas ou arrisco dizer até durante o evento pode ocorrer tantos protestos como em 2013.

A forma escolhida pelos golpistas: prefeito (PMDB), governador (PMDB) e presidente interino golpista (PMDB) de conduzir o evento só demonstram que o estado mínimo, as ações para legitimar o capital e sociedade capitalista pretendem anunciar a morte.

Neste anúncio está previsto que os pobres dos morros/favelas cariocas não poderão descer no período das Olimpíadas, terão que aceitar ficar enclausurados enquanto a festa para os brancos ocorra em paz.

Neste ínterim é preciso pensar as ações do estado e nesta forma autoritária e violenta  se ocorre apenas no Brasil ou se esta arrogância e autoritarismo perduram noutros países. E se perdura é portanto um problema de gestão, mas liberal?! Por que nunca conheci ou escutei falar que exista nesta atual democracia um presidente de esquerda (ou direita) que não atendesse os princípios liberais do capital. 

Quando leio sobre o Chile vejo a repressão com estudantes, se leio algo sobre o México vejo com trabalhadores e estudantes que querem educação pública de qualidade.

Ou quando leio sobre Argentina também vejo nas manifestações ainda mais autoritarismo, se na Venezuela através de tentativas de impor ideais liberais mesmo com a recusa da população ao manter por meio de votos o mesmo presidente. Em todo instante nota-se o autoritarismo e medidas que forçam aceitação de uma “democracia liberal” com o governante/presidente que o setor financeiro e outros países precisamente aqueles que aglomeram desenvolvimento e poder (EUA, etc.) escolheram.

E vemos mais adiante que não é um problema exclusivo da América Latina então se leio sobre a Grécia os protestos há meses indicam que não se trata apenas de casos isolados.

E se acompanho os intensos protestos e greves pacíficas e violentas que ocorrem há meses na França observo que jamais poderia se tratar de caso isolado.

A única diferença atualmente é que temos a internet para nos aproximar, mas os anúncios e formas de violência, repressão e autoritarismo contra estudantes e trabalhadores continuam as mesmas.

O anúncio de ofensivas contra os estudantes que desejam educação pública de qualidade bem como dos trabalhadores que queiram manter ou aumentar seus direitos trabalhistas e o mínimo de direito social anunciam que deve ser cada vez mais graves e violentos.

A resposta dos estudantes, em especial dos secundaristas brasileiros tem sido uma das melhores. E tenho orgulho deles e vejo como fui negligente em quase não ter comentado o assunto da forma como deveria. O golpe consumiu, mas não corroeu a atenção. Há de ter espaço e considerações sobre e logo mais.

Daí que é bom perceber a preparação de novas jornadas, quando estudantes a cada dia se utilizam mais da palavra “uni-vos” nas suas diferenças e nas constantes: violências, opressões, repressões e autoritarismo.

Já os trabalhadores...
Pois é, já os trabalhadores...

É verdade que os trabalhadores do Brasil ainda dormem, porque não acreditam ou não compreendem o que está por vir.

Os trabalhadores do Brasil não creem no fim da CLT ou numa provável cobrança de consultas no SUS que serão propostas e uma realidade em questão de meses. Prova disso é que um ministro tocou no assunto e para desespero foi aplaudido pelos presentes.

E ainda que o presidente interino e golpista anuncie que haverá aumento de Bolsa Família, os trabalhadores não sabem que os direitos sociais correm risco de esvaírem dos seus bolsos para os cofres de corruptos de quem não venceu eleição através do voto popular, mas do voto daqueles que favorecem poucos.

E logo sinto desânimo de saber que dormem tanto quando deveriam estar mais acordados do que nunca e ajudar os poucos que se mobilizam contra os ataques aos direitos sociais conquistados a duras penas.

Também é questão de segundos para reanimar, principalmente quando me lembro dos muitos trabalhadores que se movimentam na África, Grécia etc, com ações isoladas é verdade, mas se movem e sentem as correntes.

E como não sentir frio na barriga com as ações dos trabalhadores franceses quando anunciam através de protestos violentos e pacíficos e com várias greves há meses que está na hora de proclamar a autodefesa ou "légitime défense" pelo bem de todos, quiçá da humanidade.


E justamente quando observo a França é que tenho mais convicção e certeza absoluta do que foi as Jornadas de Junho. E esta certeza me dá uma ernorme esperança nas próximas jornadas que irão anunciar a mensagem de morte ("Menace de mort") para a forma equivocada de organizar a sociedade. Tenho esperanças. Em toda língua muita espérance, porque ela vive e jamais desfalece.


segunda-feira, 27 de junho de 2016

Love Hurts

 Nas paixões, a razão nos desampara.
Bocage

Ilustração: Verônica Vilela


O tempo estava agradavelmente quente. Denis saiu animado de casa para encontrar o grupo de amigos. A noite seria de muito barulho. Na verdade, suas preferências musicais mudaram muito desde a adolescência, quando era fã de Nirvana. Agora preferia musica brega dançante. Combinava melhor com os botecos que frequentava. Mas Adailton insistira tanto para acompanhá-lo que Denis aceitou a dose de nostalgia. Os dois amigos se encontraram em frente à pracinha de sempre:

- E a Letícia, hein? Ela é gente fina. Tomara que a amiga dela seja simpática.

-É... - disse Denis um pouco desanimado.

-Pô! O que importa é que a gente vai curtir hoje, né não? O show vai ser massa, cara!

Uma hora depois e estavam todos reunidos. A casa de show estava cheia. Tanta gente usando roupas pretas fez Denis se lembrar de Ana. Há bastante tempo não se falavam. Lembrou-se daquele dia em que estavam jogando conversa fora e ela lhe mostrou as músicas gravadas no celular, eles tinham gostos em comum. Aliás, tinham tanto em comum, eram mais parecidos do que imaginavam. Do que desejavam. Ou deveriam. Ele odiava o orgulho dela. Mas isso não importava mais. Era passado.

O show iniciara com uma musica animada. Letícia pediu para se aproximarem do palco e todos concordaram. Eles se encaminhavam quando Denis parou instintivamente em um ponto aleatório do público. Sentiu uma sensação estranha na nuca, que lhe acometia sempre que era observado por trás, de modo que se virou para procurar quem o observava. A uma distância de um palmo estavam aqueles malditos olhos de olhar incisivo...

Ana e Denis ficaram se olhando. Ambos esperavam a iniciativa do outro para romper o silêncio. Desconcertado, Denis sorriu primeiro. Ana sorriu de volta com olhos. Ela disse “oi” sem emitir som, num gesto sutil com os lábios. Denis se sentiu encorajado para cumprimentá-la. Ele pôde sentir o cheiro de perfume quando se aproximou dela, mas então se lembrou de ter visto um rapaz e se afastou. Sim, havia um desconhecido ao lado de Ana. Denis o encarou rapidamente, julgando que era melhor evitar constrangimentos. Virou-se para Letícia e disse “vamos pra lá”.

Denis e Letícia se juntaram aos amigos próximos ao palco. Letícia se queixava com sua amiga, especulando sobre a identidade da moça. Enquanto isso, Denis disse ao ouvido de Adailton “é a Ana”. O amigo não teve dúvidas em procurá-la com os olhos pelo público. Ela é mais bonita pessoalmente. “Mas e esse cara? Será que eles estão namorando?”, perguntou aflito Denis. Adailton não soube responder.

A amiga tentou consolar Letícia, dizendo que ela não deveria se preocupar, mas não adiantou. Letícia decidiu agir e usou todo o seu poder de sedução, beijando longamente o companheiro. Ao abrir os olhos, Denis procurou novamente por Ana, mas ela tinha desaparecido. Mais uma vez. “Não importa. Passado é passado”, repetiu para si intimamente.

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Puxadores de fluxo

Às vezes quando olho uma foto minha criança, vejo como se aquela não fosse eu mas soubesse de tudo o que ela sente. Fito o olhar e consigo recordar as angústias que me rodeavam naquela época. Tenho vontade de pegar aquela criança no colo e fazê-la acalmar, como um Eu do futuro, alertando que tudo passa. Lembrar da minha infância é lembrar dos mais variados tipos de medo, a começar o medo de nascer. Era nítido: eu não queria estar aqui. Entre sentar na barriga de minha mãe como protesto, "não me tirem daqui", e o mar de lágrimas que se formou após não acatarem meu apelo (confundido por muitos familiares como manha, frescura e entre outras coisas), penso que minha vida sempre foi adaptação. Adaptar-me aquilo que não me pertence. Quando se é criança, é praticamente nula a possibilidade de ser você mesma, sendo suas escolhas coordenadas por aqueles que receberam a missão de te proteger. Afinal, proteger do que? Do perigo? Da morte? Do sofrimento? Do arrependimento? Talvez. Mas hoje defendo a ideia de que somos protegidos de nós mesmos, de tudo o que somos, de todo o potencial que carregamos, sombrio ou iluminado. 

Pequenos reflexos de autenticidade são até hoje recordados pelos meus pais e pessoas próximas. Mesmo coisas simples como: subir as escadas até o telhado de casa e chamar meu pai de "nariz vermelhinho); me impressionar sempre que via pessoas vermelhas e soltar sem pudor "pelamordedeus pai, que homem mais vermelho"; vestir a farda do meu pai quando ele a tirava para almoçar; assistir desenho e ficar alisando com a mão a franja na testa deitada com as pernas sobre o encosto do sofá; ser apaixonada pelo Maurício Matar na novela A Viagem; ver uma estrela cadente e pedir sempre uma bicicleta; só ir no colo de determinadas pessoas; ter como refeição única café com leite; brincar e falar com "seres" que somente eu via; dar uma volta de bicicleta no bairro e voltar com um coelho numa caixa de sapato; rezar um livrinho de orações que minha avó fia me deu durante a semana para que fizesse sol no final de semana e meus pais me levassem ao clube; colorir; ter um lugar predileto no sofá; uma caneca preferida; uma mania qualquer que de forma ritualística me fazia mais feliz; o desejo e ambição por aprender variadas coisas ao mesmo tempo e correr atrás delas sem condição física e mental para estabelecer um compromisso verdadeiro. Essas pequenas coisas, por mais pequenas que sejam, eram minhas, as trouxe de longe, de outras experiências em que pude ser eu. 

Cresce-se e quem você é torna-se moldável, ou melhor, nasce-se e quem você é torna-se nulo. Ensinam-lhe que se torne aquilo que aprenderam que deveríamos nos tornar: qualquer coisa que não seja você mesmo, por isso mesmo torna-se "coisa". Penso que derramei uma, ou várias, lágrima pra cada eu que tive que esconder. Alguns enxergaram isso como rebeldia, uns como comportamento típico de uma criança caçula mimada, outros nem enxergaram. Sei que talvez ninguém tenha olhado isso como um luto. Deixar de ser quem realmente é, é como ir se matando aos poucos. E há ainda aqueles que defendam que isso era tudo para me proteger. Retorno: do que? De quem eu sou e de quem eu gostaria de me tornar. Fazemos isso com as crianças de uma forma geral, pedindo-lhes que guardem seus pequenos pontos de si mesmo e arquivem-os num cofre blindado permitindo-lhes que os abram novamente apenas na vida adulta, quando provavelmente já não teremos a menor consciência de quem somos. Ainda há aqueles que não acreditam em um trabalho psicoterápico que se remete tanto a fase da infância, talvez seja porque realmente não é fácil admitir que foi lá que nos foi ensinado a nos matar e hoje, as vezes de forma inconsciente, carregamos a frustração de ter que nos velar e enterrar por tantas vezes que obrigamos as nossas crianças a fazer o mesmo. 

Quero falar do modo como aprendi a vivenciar tudo isso, infelizmente o medo foi meu maior companheiro por boa parte da vida, chegando a extremos como ter medo de tomar banho sozinha ou simplesmente de dormir. Fechar os olhos era como morrer de vez. Dormir é se entregar ao inconsciente e isso para mim era tornar minha consciência dominável por quem quer que fosse. E se me roubassem de mim? Não viveria o sonho de liberdade que carregava no peito. E para onde eu iria? Para um universo paralelo de robôs humanos que nada fazem a não ser a obedecer. Obedecer. Sempre tive dificuldade de obedecer. Creio que eu apenas acatava, por cansaço de brigar por ao menos a possibilidade de expor meus motivos, ou mesmo pela impotência que nos é imposta devido à idade. Ser quem somos é difícil. Temos que deixar de nos matar, lutar pela nossa sobrevivência e, mesmo sem querer, desinflar os egos que já se perderam de qualquer ponto ordenador que possa lhes tornar eles mesmos. Enfrentamento de egos. Não existe enfrentamento de essência. Quem é não se afeta com o quem é do outro, mas quem supomos ser sim, esse é guerrilheiro, e dos bons, apedreja toda e qualquer manifestação de si mesmo que veja andando sobre a Terra. A sua missão é essa: vingar a morte do si mesmo. Nada mais triste do que verificar que não se tornou aquele que poderia ter sido por ter que se submeter a uma educação que te pune por ser quem é. Meu Deus, que tragedia, fazemos isso uns aos outros a cada instante. Até mesmo com um olhar, ferroamos a essência do outro como modo de fazer-lhe parar de ser quem é, como mecanismo de retratação por termos já nos esquecido de nós. 

Sugaram-nos todo o potencial de vida que tínhamos e ainda assim nos obrigam a correr atrás de uma felicidade plena. Quem é feliz não sendo quem se é? Isso é impossível! Somos doentes. Dependentes emocionais da tristeza alheia que nos faz menos desgraçados. Somos reivindicadores de lutas que não deveriam ser nossas. Somos condicionados à procurar um bem estar que não nos pertence. Não tem como ser feliz se não está vivo, e se fomos obrigados a nos matar ao longo da vida, o que nos restou? Caminhar como seres rastejantes por caminhos e direções que nos apontam como um norte que nos levará sem saber essencialmente para onde e para que. Parem o que estão fazendo agora e recordem qual foi a última vez que um passo seu foi dado sem orientações de como proceder durante o voo. Reflitam que quando não sabemos para onde ir, haverá sempre alguém interessado em oferecer o trajeto alheio. Como forma de se aliviar por saber que não se fudeu sozinho. Vagantes que somos, obedecemos, afinal, quando nada se tem, o pouco vira muito e qualquer coisa será sempre melhor que nada. Quando escolheremos o caminho de volta? Aquele que nos levará de encontro a quem somos. Quem será o semeador da discórdia que causará uma revolução em nossas vidas e nos obrigará a ficar de joelhos, tendo por entre as mãos o rosto molhado pelas lágrimas de todo o eu que se foi, sujos por toda a poluição dos destroços deixados pelo desmoronamento  da nossa essência, gritando em uníssono: CHEGA! 

Reconhecer quando a peça acaba costuma ser instintivo. As cortinas fecham e alguém se levanta a bater as palmas. Apenas copiamos, vez ou outra puxamos um "bravo", mas sempre porque já o vimos alguém a fazer. O grito inédito, o passo inovador, a unicidade é da alma e nós já não a temos mais. Somos flagelos de maltratos politicamente corretos. Acreditem, existem livros, cursos, palestras, músicas, escolas, etc, a nos ensinar "Como não ser você mesmo", "10 passos para não permitir-se sem quem é", "Impedindo nossos filhos de serem melhores que nós", "Educando para o fracasso", "Proibindo o parceiro de ser feliz", "Aprendendo a ser infeliz", entre tantas outras formas de nos fazer corroer pelos bueiros que aprendemos a nos permitir percorrer. Somos assim. Adaptáveis. Nos adaptamos até mesmo aquilo que nos faz mal e quando uma fresta se abre a permitir que um caminho mais seu surja, o que fazemos? Fugimos. Isso mesmo. Vamos correndo pedir arrego, pois ser feliz é algo que não sabemos ser não. Diz a lenda que executivos largaram tudo pra ir viver na praia "vendendo coisas que a natureza dá pra gente", mas isso não é pra mim. Deixar pra trás uma vida medíocre de subordinação das 8 às 18 com uma hora de descanso e final de semana com direito a selfie que registra a felicidade de termos um balde de vodka com energético pra nos fazer esquecer a porcaria de vida insana que levamos é mesmo um ato de extrema burrice. Claro. Afinal, o que os outros vão pensar de mim? O que vou dizer para os meus pais? Que exemplo darei aos meus filhos? O que a vizinha vai inventar a meu respeito? Procure um médico, pois estes são sintomas da síndrome do parecer, ela sempre surge quando passamos a ter uma existência vivida pelo olhar do outro. O que o outro quer de mim tem mais valor, até mesmo porque eu não tenho a menor ideia do que quero, de quem eu sou e de onde quero chegar. Já que é assim, que o outro então direcione minha vida, seguir o fluxo é o melhor caminho quando não se sabe onde ir. Tá aí. Fadados a moda do fluxo. Que cansaço. Chega a deixar o corpo e mente exaustos como um pedreiro que carregou lata de concreto nas costas por 10 horas seguidas. 

Somos assim. Não satisfeitos de nos desgraçar sozinhos, levamos sempre alguém junto, às vezes até pagamos pra que nos acompanhem, o que importa é fingir que a solidão não nos amedronta. Tornamos escravos da fuga por não nos sentir sozinhos. Um segundo com nós mesmos é o suficiente para um ataque de pânico que será resolvido com doses diárias de psicotrópicos que deveriam ser parte da cura da nossa essência ferida junto a 50 minutos semanais de análise com um psicólogo que é conhecido por ser médico de louco e que embora não seja médico tem sim a função de te ajudar a enxergar a loucura que você está fazendo com a sua vida. Mas não, isso não é pra mim. É que sou uma pessoa extrovertida. Gosto de conhecer gente, lugares e estar sempre rodeados de pessoas tão vazias quanto eu, afinal, todos nós seguimos o mesmo fluxo e se o fluxo diz que "é o que temos pra hoje" então vamos viver a vida conforme o manual que nos foi dado no primeiro pedágio que passamos, onde trocamos nossa dor por um smartphone, uma rede social com grandes promessas de likes, um uniforme (devendo este ser renovado conforme o fluxo), companhias que estarão na mesma vibe que nos e o rótulo a ser discutido nas aulas de história e literatura do próximo século sobre a geração que teve como protesto não sentir nada. Será que até o nada nos foi imposto como forma de rebeldia? Pode ser. 

O diretor do reality show no qual estamos participando para concorrer o título de "a vida mais sem vida do mundo", onde competimos semanalmente pela posição de "puxador de fluxo" quando nos é dado o poder de direcionar para qual abismo levaremos a manada, muito orgulhoso deve estar de seu elenco, pois nunca antes na história houve tantos personagens que de tão apegados à suas máscaras se desfizeram de suas identidades originais. Não é fácil encontrar funcionários dedicados como tal. Eximem-se de suas próprias vidas para existir na realidade do outro, vão com mala e cuia, dificilmente voltam, poucos lembram que existia vida antes disso.


PS: Entrei para o blog essa semana e o texto saiu sem tempo para revisões. Espero que os erros não te espantem para os próximos.

quarta-feira, 22 de junho de 2016

A Marcha

Naquele trecho do caminho, a terra tremeu.

Marchávamos em fila, cada qual carregando a porção que lhe fora destinada. Cortávamos, carregávamos, transportávamos. Sempre foi assim porque é assim que tem que ser. Nada no mundo interrompe nossa marcha, a não ser é claro que a colônia esteja em risco. 

Nossos sentidos nunca falham. As primeiras de nós já tinham alertado que aquele caminho oferecia riscos ao grupo, por isso nosso caminhar era cauteloso. Quando a terra tremeu, houve quem perdesse a cadência e desmoronasse junto com a carga. As que puderam, retomaram o caminho. As que não puderam... bem, nós nunca sabemos o que acontece com essas. 

O grupo, sempre o grupo. 

Mais um tremor. Dessa vez mais forte, mais próximo. Os tremores iam ficando ritmados e múltiplos. Vinham em nossa direção. Passos? Súbito, o dia virou noite. Uma sombra cobriu a marcha e levou ao chão aquelas de nós que não puderam fugir. A fila se desfez e a marcha seguia por onde o instinto mandava, desviando-se como podia daquela cadeia de sombra-tremor que nos aterrorizava. Ao redor, algumas agonizavam. A carga desprendendo-se do corpo.

Muitas de nós ficaram pelo caminho. Muitas de nós ainda ficariam. Nunca sabemos o que encontraremos adiante, mas nada disso importa. Somos operárias, soldadas e rainhas. O caminho é longo, o trabalho infinito e o que importa é seguir marchando.

terça-feira, 21 de junho de 2016

SOBRE DESCULPA E THE LAST GUARDIAN

Oi gente queridíssima desse maravilhoso e sensacional espaço intitulado Blog das 30 Pessoas!
Venho pedir desculpas pela ausência nesses dois últimos meses. É que minha vida tem sido corrida como nunca antes na história desse País!
Não podia, entretanto, deixar de passar aqui, ainda que mais pra metade do dia 21, para deixar um caloroso abraço, uma vez que o inverno já começou (o Stark avisou, mas muitos não acreditaram).
Peço perdão também por não escrever nada de relevante, nem algo que acrescente um pouco mais ao seu dia, à sua vida. Paciência, né? Há tempos minha criatividade não tem sido a mesma.
Coisas pra contar? Sim, um monte! Tempo para digitar? Eis o quê me falta. Na verdade, preciso arrumar isso em mim também! Uma das metas para Julho!
Obrigado mesmo pela honra de sua leitura!
Como sempre faço, deixo aqui um vídeo. Na verdade, neste mês, dois.
Aconteceu neste mês, a #E3, evento no qual são mostrados as novidades em games e, pra quem me "conhece", sabe que curto muito essa vibe!
Um jogo em particular, eu e milhões de pessoas temos esperado!
Trata-se de #TheLastGuardian, exclusivo do PlayStation 4, que finalmente ganhou uma data de lançamento: 25 de outubro de 2016!

O primeiro trailer foi lançado em junho de 2009. A princípio, sua plataforma seria o PS3, mas com o passar dos longos anos em que ficou em hiato, mudou.

Este foi o trailer que nos deixou malucos, 7 anos atrás:


E este foi o mostrado na E3 desse ano:


Pois é, amiguinhos e amiguinhas, desejo que o final de junho, julho e demais meses sejam supimpas para todos nós!

Nos vemos em Julho, espero que com mais tempo, dedicação e capricho (de minha parte).
Abração! Namaste!

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Zoo(i)lógico

Costumo ter sérias divergências com um amigo a respeito dos zoológicos. Enquanto ele é contra qualquer tipo de cativeiro animal, se recusando a visitar um local que para ele é considerado essencialmente um presídio, eu tento relativizar algumas coisas, considerando que nem toda forma de cativeiro animal é uma tortura.

O problema é que nossos debates esbarram em suposições de ambas as partes. Somos contra a captura de um animal selvagem ou nascido em liberdade para que sejam expostos em jaulas; contra o zoo argentino que, segundo ativistas, seda animais selvagens, segundo administradores, adestram leões e tigres para que turistas possam chegar perto; contra instalações irregulares, etc.

As divergências começam quando afirmo que os atuais zoológicos podem ter um papel fundamental na manutenção de espécies ameaçadas e em estudos que ajudem a melhor relação entre humanos e outras espécies. Eu preferia que pudéssemos viver em paz e harmonia com a natureza, respeitando biomas e limitando nossa atuação em áreas preservadas, mas talvez nem a própria espécie humana sobreviva até que tenhamos esse nível de comprometimento ético.

Não afirmo que estou certo, apenas coloco essa hipótese em contraponto à recusa terminante em considerar a viabilidade dos zoológicos. Quando chegamos ao bem-estar dos animais é inevitável uma especulação quanto ao sentimento que o cativeiro produz nos bichos. Há uma consciência de que estão privados de liberdade ou esse seria um conceito filosófico restrito aos humanos?

Se não há consenso entre especialistas que dedicam a vida para tentar entender o comportamento de determinadas espécies, não haverá entre leigos que refletem a partir de hipóteses. Mas existe uma espécie cujo comportamento podemos debater com propriedade: a humana.

Recentemente dois leões, um gorila e cinco jacarés foram abatidos devido ao contato com humanos. Com exceção dos jacarés, que estavam em um lago sem proteção, os demais estavam em zoológicos.

Uma breve visita a um zoológico nos faz pensar se toda a segurança é pensada para proteção dos visitantes ou dos animais. Não dá para negar que o comportamento humano é patético, evidenciando uma falta de respeito latente por parte da espécie que se vangloria de ser a única racional.

Gritos histéricos, objetos atirados e tentativas desesperadas de fazer com que os animais – os presos – façam algum movimento são exemplos de como os visitantes não conseguem diferenciar aqueles bichos de um pequeno poodle domesticado, sendo que até este último, mesmo tendo nascido e crescido entre humanos, demonstrando extremo afeto pelos donos, precisa de um espaço próprio e pode reagir ao se sentir ameaçado.

O comportamento das pessoas em relação aos animais deveria ser uma preocupação contínua. Após alguma tragédia as reações giram em torno da busca por um culpado em quem possa ser aplicada uma punição, porém nada vai recuperar as vidas perdidas e apesar dos acidentes serem esporádicos, os comportamentos imprudentes são cotidianos.

Parece óbvio, mas os incidentes recentes evidenciam a necessidade de deixar claro para a espécie racional que os outros animais não serão complacentes com a necessidade de uma selfie, sequer terão paciência com as provocações humanas. Na natureza – aquela selvagem, que os civilizados temem – o espaço de cada animal é instintivamente respeitado pelos demais, se não temos esse instinto, que o respeito venha pelo bom senso, educação, até pelo medo, mas que seja uma preocupação constante, não somente depois das tragédias.

sábado, 18 de junho de 2016

Sábados de manhã

A filha tinha poucos meses de vida, mas já despertava toda a vida no pai, mesmo tão novinha e com a delicadeza que só há em um bebê.

“Tempos modernos”, a mãe se especializando e estudando aos sábados de manhã (que se estendia ao começo da tarde) e o pai com a missão prazerosa, ao mesmo tempo árdua, de se encarregar de fraldas, choros, mamadeiras, choros, carinho, "momentos palhaços", muitos risos e depois... mais choro  e risos banguelas de novo.
A ajuda mais ao alcance, era a fácil distração com a ave galinácea e sua turma de danças e cores vivas, pra conseguir alguns minutos de pausa pra um café ou alguma tarefa da casa ou... pra escolher outra roupa, pois ela tem refluxo e "gorfou" de novo.
Foram alguns sábados assim, além da ajuda (obrigação) de sempre do pai durante os dias (e noites, madrugada a dentro) da semana ao lado da mamãe, claro.

Sábados de manhã, com vários momentos marcantes entre o pai e a filha bebê... Tão marcantes como o dia em que ela, já com seus 4 anos e em outro momento sozinha com o pai, disse: "Papai, vamos fazer um picnic na sala? Só nós dois, igual quando a gente ficava sozinhos e a mamãe estudando."
Sábados de manhã, marcantes e bonitos como a memória de um bebê.


segunda-feira, 13 de junho de 2016

O dia para celebrar o amor nasceu cinza.
O sol apareceu tímido.
A segunda amanheceu sem cor.
Há os que preferem o escuro do luto ao colorido de celebração.
Há corações sangrando e mãos sujas de sangue.
Ninguém ganha, ninguém vence.
Faltam palavras e o silêncio preenche o vazio;
Repitamos como mantra: 
Mais amor, menos ódio.
Mais AMAR



sábado, 11 de junho de 2016

Verbo Matemático



Dizem que conjugar verbo é a coisa mais chata do mundo em nosso idioma. Decorar e entender o que é regular ou irregular, aceitar tantos pretéritos de um único presente, onde os futuros também são incertos.
Eu que sou o oposto das humanas, matematizo uma tabela de verbos como se fosse a tabuada.
Os gerúndios, os pretéritos, o imperfeito ou o mais que perfeito. As somas dos prefixos com o tempo do presente ou do futuro.
Pode se 9x7 ou 7x8, que eles viajem ou simplesmente choveu, assim sem sujeito mesmo. Matemática pura!
Contemos juntos os futuros que deixaremos de ter por não conhecermos os pretéritos e por medo de enfrentar os presentes.
Pura equação de vida. Calcular tantos verbos em seu infinitivo pra obter combinações infindáveis para solucionar qualquer estágio trigonométrico de vida.
Nessa Bhaskara da da vida, de subjuntivos a gerúndios, vamos computando as boas e más conjugações que o destino nos propõe.

sexta-feira, 10 de junho de 2016

Quando eu tinha 15 anos.

As coisas que passei a acreditar nos últimos anos, me deixam muito pensativa no quanto mudei. 
Planos, medos, amizades tudo isso e muito mais não são como eram antes, umas coisas por que cresci, outras talvez por que tenha me infantilizado (em certas áreas acho que ocorreu) mas o que mais me impressiona são os planos. 

Casamento: Aos 15 anos de idade (agora tenho 32) eu planejava começar a namorar aos 20, casar aos 25. (pra mim chega ser uma piada esse) Aos 32 não me casei e meu namorado tenho ha pouco tempo. (pensei nele com olhinhos de quem planeja novamente rs
Não vejo mais o casamento como uma fantasia de adolescente, agora vejo como um complemento que vc pode viver ou não sem, depende da pessoa.

Também imagino que se meus planos de 15 anos tivesses dado certo, seria uma pessoa totalmente diferente de quem sou hoje... (gosto muito do que me transformei e ainda me transformo) 

Amizade: A maioria das que tinha com 15 anos mau me recordo, desculpem mas é verdade. Tenho sim muitos amigos que ainda considero amigos daquela época, mas não são mais inseparáveis como éramos. Boa parte se perdeu e hoje penso que alguns deles, os quais me recordo, poderia ter feito um maior e melhor esforço para mantê-los, mas não fiz. 

Hoje minhas amizades são leves, na maioria das vezes sem cobrança e pessoas que eu gosto muito de estar perto, mesmo não estando o quanto gostaria. 

Medo: Com 15 anos eu morria de me de O.V.N.I (sim, isso mesmo), não suportava nem falar de espíritos e morria de medo de ser deixada pra trás ou sozinha. 
Hoje ainda sou muito cagona com os espíritos, as vezes até peço para os ete's me levarem rs.

Quanto a ser deixada para trás, as coisas mudaram... Antes eu me importava demais com pessoas que não queriam que eu as acompanhasse, hoje só tenho ao meu lado quem realmente quer estar ali. Ficar sozinha se tornou uma coisa prazerosa em muitos momentos, não é mais desesperador como antes. 
Aprendi apreciar a solidão e a entender que em muitas das vezes é melhor mesmo estar só. rs
Hoje tenho medo mesmo de não conseguir cumprir minha palavra dada, de não conseguir ajudar minha mãe, não conseguir pagar o aluguel...Esses meus medos, considero bem mais aterrorizantes, antes tivesse ficado com os de 15 anos que estavam bem mais sussa...rs

Fico feliz em reconhecer essas mudanças, fico feliz em pensar que muitas ainda estão por vir.
Hoje busco coisas mais simples, seja elas quais forem. A simplicidade me encanta de uma maneira que quase não consigo explicar ou consigo e é bem simples...(SIMPLESMENTE ADMIRO A SIMPLICIDADE) 

Com o tempo ando aprimorando também o sentimento de gratidão, que aliás é o que sinto com relação a essas mudanças, evoluir e entender as coisas a minha volta da melhor maneira que posso, na minha hora, no meu tempo e sem pressa. 

terça-feira, 7 de junho de 2016

Quando Oyá visita o mato

No redemoinho do meu caos 
Oyá clareou o quarto como se fosse dia:

Venta, que o mundo é teu.


Quem nasce no mato sabe que quando Oyá chega rodando a saia, palmeira venera a rainha lançando suas folhas ao chão. Lá, seu espetáculo é euforia, é deslumbramento, é medo. E não há palco maior que a terra, não há cenário melhor que o céu. Quando ela vinha cheia de si, ventando como dizendo "tudo isto é meu", era clarão, era água, era estrondo. O mundo parecia findar para renascer de seus destroços. Nesses dias, a mãe abria a gaveta do armário da cozinha e pegava bem lá no fundo o capim santo. Queimava o capim dando voltas ao redor da mesa e rezava. A energia elétrica sempre sumia. O pai já ia buscar lampião na despensa e, quando penso nesses dias, quase consigo escutar aquele barulhozinho do gás com o fogo até principiar a luz. A gente acendia vela pela casa e quando via um raio cair ia contando números até o céu trovejar para ver se a tempestade estava vizinha. Quem nasce no mato tem desses (des)privilégios.
 

sexta-feira, 3 de junho de 2016

Eu poderia

escrever sobre tantas coisas, mas é sempre uma corrida contra o tempo e tantos os pormenores envolvidos...

É música que acaba, é o farol que abre, é a #nãopostada, é a mensagem que chega, é um “oi”, é o sorriso espontâneo, é o "tô indo", é a hora que voa, é o “espera, vamos tomar mais um café”, é o café que esfria, é o telefone que toca, é a hora que perdemos, é um “a gente vai se falando”, é o abraço apertado de quem não quer se despedir, é a dor de quem decide ir mesmo querendo ficar, é a música que começa, é uma memória musical, é uma saudade, é uma vida inteira acontecendo em fragmentos de cotidiano...

quarta-feira, 1 de junho de 2016

Só existe justiça após o fim do expediente.

Afrouxar a gravata era sempre o primeiro gesto. Acabar com a sensação de sufocamento, com a coleira simbólica, com essa merda que me marca como propriedade daquele filhodumaputa que eu chamo de patrão. Respiro e olho ao redor. As opções são as de toda sexta: boteco com os colegas, fumar um baseado com a moçadinha da faculdade ou puteiro com os caras da vila. Que se foda, vai ser puteiro. 
 -Alô, Juquinha? Casa das primas vai rolar hoje mesmo?
 - Faaaaaaaaaaaaaaaaala banana! De boas? Vai rolar, e vai rolar pra caralho! Mó cara que você não colava, tamos até emocionados. Cola aqui em casa que o Zé, o Danone e o Peroba já chegaram.

1h20 de busão e uma caminhada de 15 minutos depois e eu cheguei. Dá pra ouvir Matanza tocando alto da janela do Juquinha.
-Ô seu puto, abre a a porra da porta! -Grito lá pra dentro, sabendo que a Dona Genoveva deve estar dormindo há tempos, mas se a música não acordou, eu é que não acordo a véia. 

Aquele auê quando o Juca abre a porta. Abraço todos os brothers e a gente sobe pra começar o esquenta. Entre uma breja e outra, vem o papo.

-Ficou sabendo do Geraldo? Aquele grandão lá do pico dos churras?
-Manjo, Juca. Fiz o segundo ano com ele .
-Então, foi pego mamando rola dum bombado na Augusta. Encheram ele de porrada.
-Vixe. Que mancada , heim? Deixa o cara se pegar com quem quiser.
 -Ah, mano, se é na minha frente eu nem sei o que faço. 
 -Tá. Escuta, a gente vai ou não vai?-Tento apressar os caras, pra sair do assunto ruim. Eu tinha me esquecido de quanto eu mudei desde que entrei na faculdade. 
 -Vambora, cambada! O universitário quer foder umas piranhas.
Entramos no Opalão do Danone e rumamos pro "Tia Jebetiza"

O Tia Jebetiza não é um puteiro de classe, não parece com nada que tenha "fotô" no nome. É um salão judiado, com uns mastros de strip que ninguém usa, umas salinhas e biombos separados pros “serviços” em si, e um bar com balcão manchado, das antigas.
Aquela zoeira de sempre: a galera bebe, fala merda, mas raramente alguém da nossa turma vai pro “quartinho” com uma das moças.
Estava tudo muito bom, quando eu reparei num cara saindo de um quartinho. Camisa meio amassada, terno caro, óculos Rayban e pegada “topzera Vila Madá”. Putaqueopariu. Enzo, o filho do chefe.

-Caralho, Peroba. É o meu Gerente do trampo. E ele é filho do “seu Silva”.
- Vixe, Banana. Aí fodeu, heim? Quer vazar?- Perguntou o cara mais consciente do rolê.
-Vou dar um tempo e ver se ele não vai embora.-Repliquei, e abaixei a cabeça no balcão pra beber meio escondido.
 2 minutos depois, ouço uns gritos. Olho pro lado e o Enzo tá discutindo com o dono do cafofo, falando que “As putas dele não aguentam nada, e que é só dar uns tapinhas que elas param o serviço.Choram à toa.”
Aí eu vejo a Gisele saindo do quarto. Puta que o pariu. A Gisele, cara. Eu nem sabia que ela tinha virado puta. A gente chegou a ficar na época da escola, e ela ia bem em Matemática, até me passava cola. O rosto dela está roxo. O sangue escorre do supercílio. CARALHO! Eu já vi os caras baterem em putas antes, e até forçarem elas a fazer uns lances, mas nunca uma conhecida de fora daqui. 
-Olha aí a piranha chorona. Não conseguiu me fazer interromper a foda, -Diz o Enzo, com aquela certeza de que pode falar a merda que quiser.
A Gisele só se encolhe e geme. Eu penso no que fazer.
-Enzo. Cara, isso não foi legal. Pede desculpas pra moça.
Um urro irrompe dos lábios ensanguentados de Gisele. –DESCULPA? ESSE FILHO DA PUTA ME FODEU À FORÇA. ELE ME BATEU! DESCULPA? VÃO PRO INFERNO! “ERRE AS KORAKAS”!

Que diabos é essa coisa bizarra que ela disse no final? Que ...
O som de o trovão invade o Jebetiza. Duas figuras estranhas aparecem no meio da sala usando ..lençóis? Não, isso são togas. Mas que diabos?
-Quiporréessa?-Grita Enzo, desnorteado e visivelmente ainda bêbado.
-Calado, Mortal. Viemos aqui pois uma lei foi quebrada e um injustiça cometida. Sou Têmis e essa é Nemesis.–Diz uma das moças.
-E que caralhos vocês tão fazendo aqui? Sabem com quem ces tão falando? Eu sou o Enzo (sobrenome censurado)! Meu pai é o dono da GIGAEMPRESA DE CONSTRUÇÃO . Vocês duas são só umas piranhas feminazi que eu conheço esse tipo.
- Calado, eu disse. O Julgamento está concluído. É culpado de estupro, agressão e difamação, e isso apenas nesta data.  Qual é a sentença requisitada , mortal ?-A voz da criatura(Deusa?) se adocica quando ela fala com Gisele.
-Eu queria que ele nunca mais pudesse fazer isso com ninguém moça. Eu queria nunca mais ter de aturar uns merdas desses. Eu queria morrer.
- Você não precisa morrer para haver justiça. Ele e todos os cúmplices serão punidos de acordo.
-Cúmplices? Mas a gente não fez nada-Pergunto, em voz alta e trêmula.
 -Exatamente. Vocês nunca fazem nada. Vêem as mulheres sendo violentadas e se calam. Ouvem seus amigos se gabando de tal, e riem. Segundo meu desejo, estão todos condenados. –Disse a outra moça. Nemesis,acho.
-Moça, não adianta chamar a polícia. O Enzo é rico. Quem vai se foder é a gente. –Diz o Peroba, nervoso.
-Não precisaremos de polícia. Ela estende as mãos e todos somos transportados para um lugar com grades de ferro e colunas de mármore. Olho ao redor e penso:
-Ao menos eu não devo ter de ir trabalhar na segunda.
-A mulher de toga replica: não nos próximos 20 anos.