sexta-feira, 9 de julho de 2010

No meio do nada

Já não sei há quantos dias estou aqui. Cheguei numa sexta e hoje é quinta-feira, o que se supõe que vivo no meio do nada há uma semana. Mas, como boa cigana que sou, já esqueci como é o som da descarga e a cor de unhas demasiado limpas. Parece que sempre trabalhei das 6:30 às 10:30 arrancando as ervas daninhas que sugam a água das berinjelas, podando os pés de tomate e colhendo batatas vermelhas e brancas.

Removo a terra com as minhas próprias mãos atrás das raízes e nem percebo se há alguma minhoca, besouro, grilo ou plantas espinhosas ao meu redor. Descobri que existe minhoca verde.

Minha casa tem paredes brancas e teto verde. É feita de nylon e a porta é do mesmo tamanho que a janela, as duas se fecham com zíper. Dentro, um colchão, meu saco de dormir, um travesseiro, uma mala com algumas roupas, alguns livros e a minha revista de palavras-cruzadas, que já chega perigosamente ao final.

Os dias duram 16 horas. O calor é tão forte que saio da ducha suando e até a água do lago deixa de refrescar a partir do quinto segundo. Para se referir ao calor infernal, insuportável, sufocante, dos diabos, por aqui empregam uma palavra que também existe em Português, mas que eu nunca tinha escutado antes: canícula. Agora entendo os velhinhos que literalmente morrem de calor no verão francês e viram notícia mundial.

Meu vocabulário continua limitado: chaud, chaleur, canicule, été, lac, douche, eau são os substantivos que eu mais uso. O ser vivo mais citado é a mouche, ou seja, a mosca. Ontem Marielle montou uma tenda para Salomé poder dormir em paz. Aos dois anos e três meses, ela já fala fluentemente a frase « as moscas perturbam », com o sotaque do sul da França, para diversão dos pais, emigrantes do norte.

Amanhã à noite faremos uma receita brasileira: arroz com feijão, e brigadeiro como sobremesa. Até agora não entendi que raciocínio me fez decidir não carregar comigo um pacote de pão de queijo, acho que esse é o fim da minha carreira internacional como garota-propaganda da Yoki, atuando no Canadá, Alemanha, Dinamarca, Inglaterra, País de Gales, Espanha, Bélgica, Holanda, Argentina e Suíça.

Espero comentários, posto que tive que subir uma ladeira e atravessar o galpão das abelhas para usar o computador do vizinho com teclado francês faltando varias teclas. E já anoiteceu, portanto vou fazer o caminho de volta na escuridão total.

8 comentários:

  1. Minhoca verde!! Na minha infância, via mtas larvas verdes e gordas - q nem aquelas q o Pumba do Rei Leão come - numa árvore gigante q tinha na saída da escola. Nunca mais vi nada igual. Saudade das gorduchas.

    A vida aí parece dura, mas eu tbm queria essa experiência. Boa sorte!

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  2. Minhoca verde? Tem certeza que você não está em Marte?

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  3. Ah, uma pergunta: pq vc foi justo pra plantação de legumes? Devia ter ido pras videiras e produtores de vinho. Pelo menos ganhava umas garrafas.

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  4. Fazendo valer a pena!
    Rsrsrs!
    Ótimo texto! Espero que tenha dado tudo certo na volta pela escuridão!
    Bjo e até mês que vem!!!

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  5. como nao sabe ha quantos dias esta ai?
    dopararam a menina, meu deus.

    vai fazendo aqueles risquinhos na parede, igual nos filmes.

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  6. fiquei comovida com o último paragráfo. :´/
    vou falar pra todo mundo comentar.
    hehehe


    e eu nunca vi uma minhoca verde. quero fotos.

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  7. Aqui está o comentário. Amo a aventura da sua vida, e já quis ter uma para mim. Mas agora, quero o vitória dos dias calmos e confortáveis, dentro ou de uma casa mim, fixa, estanque ponto para retornar como um farol. E que haja uma língua comum a todos, e que nós nos entendamos, nesse tempo de desentendimento. Mas admiro as pessoas que vão para o mundo, embora não saiba o seu destino, sua profissão, seu caminho. Seu post lindo, faz eu desejar o seu bem. E sucesso no caminho, onde leva consigo tanto o mais do Brasil.

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  8. amo a frança. viveria até o dim dos meus dias lá.

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