Uma amiga me alertou: você ficou chata.
Fiquei mesmo. Nasci nos anos setenta, século passado, e ao
levar um ''não'' do Romeu, o homem que amo, fiquei chata, reagi como as
pessoas reagiam no meu século, chorei, arrastei e continuo arrastando correntes e lamentando minha sorte.
Sei que estou fora de ritmo, no século que estamos sofrer
por amor é patético e ridículo, quem sofre por isso? Ninguém mais sofre neste
mundo, os analgésicos chegaram a sua máxima potência, os carboidratos sumiram,
o glúten desapareceu e ninguém se lembra mais do açúcar e da lactose, por que
lembrariam então o que é sofrer por amor? Ora, ninguém mais sofre no planeta, como diz um conhecido ''sofrimento é falta de diagnóstico e tratamento''.
Para que se apegar? Nos meus tempos, sim, no século passado, ganhei um walkman e ele quebrou. Me
joguei no chão e chorei, chorei. Corri para a assistência técnica, jurei amor
ao aparelho e ele sobreviveu a uma delicada operação a qual foi submetido, uma
troca de peças. O outro dia resolvi colar um adesivo no meu celular,
brincadeira besta de quem tem um coração adolescente como o meu, e logo fui
advertida por uma pessoa: pra quê colar adesivo se o ano que vem você vai
trocá-lo?
Meu Deus! É verdade,
para que me apegar se o próximo ano ele será largado na estrada do
esquecimento?
E tive um problema com meu celular e mudaram o número. Chorei na loja quando fui informada, poxa, esse número me acompanha há cinco
anos, temos história, quantos Romeus já marcaram esse número!
O moço da loja não se comoveu, apenas mostrou espanto
dizendo que ninguém tem o mesmo número por cinco anos.
Ninguém não, eu tinha!
Já nem tento me adaptar, aprendi a navegar no choro, sou
assim mesmo, minhas emoções pertencem ao século passado, me apego aos meus
objetos, juro amor eterno aos meus Romeus e quero usar o mesmo número que tanto
me acompanhou. Também como carboidratos,
jogo açúcar no suco e lamento quando me rejeitam, choro, reajo, como diz
minha amiga ''parece velhinha''.
Não pareço, mas sou. Bebê dos anos setenta, criança
dos anos oitenta, adolescente dos anos noventa. Tudo o que me construiu por
dentro aconteceu no século passado. E sim, paciência, estou chata, amo Romeu como se
fosse o último homem sobre a face da terra e falo disso o tempo inteiro. Coisa
de gente do século passado, esse pessoal que sofre, chora, se apega, come pão com manteiga e joga Nescau no leite. Gente estranha né?
Iara De Dupont
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