quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Supernova

Enquanto ela continuava a correr, podia ouvir ficando mais distantes os berros desolados do menino. Ela perseguia uma estrela. Na verdade, um balão de gás hélio com aquele formato que foi arrastado pelo vento matinal de outono. 

Antes de se movimentar para ir atrás do brinquedo fugitivo, ela cogitou deixar para lá. Mas estava tão triste naqueles dias que temia que o pranto do garoto a sensibilizasse a ponto de ele precisar consolá-la. Trocando uma cena patética pela outra, foi. Apressou o passo desengonçadamente até conseguir agarrar a fita que unia a estrela a um prendedor de roupas. Era o prendedor que impedia o brinquedo de deixar o chão, embora não tenha sido muito útil para evitar que ele fosse levado. 

Voltou a passos lentos e entregou, apática, a estrela para o menino. Ignorou os pulos de felicidade do garoto, mas quase conseguiu sorrir quando ele a beijou no joelho, em forma de agradecimento. "Quase", frisou para si mesma.

Ela se sentou para recuperar o ar. Observou o menino brincar com a estrela até abandoná-la, dois minutos depois, para se entreter com outra coisa. Ela achou a cena metafórica e clichê: ninguém dá valor ao que tem como garantido. Sentiu pena de si, quando lembrou das vezes que foi tratada como aquela estrela. Também foi afetada pela culpa ao recordar as vezes que desamparou outras estrelas, tantas vezes que poderia formar uma pequena constelação de renegados.

O remorso a invadiu de forma tão arrebatadora que ela não reagiu ao ver o garoto desamarrar o prendedor de roupas que segurava o brinquedo. Recobrou os sentidos apenas a tempo de assistir ao balão subir até a copa de uma árvore, topar com alguns galhos e estourar. 

Enquanto a estrela desfigurada caía, ela fechou os olhos e fez um pedido.

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6 comentários:

  1. Ah... As estrelas de nossas vidas, as estrelas q somos. Texto bonito! Música boa!

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  2. ei, gostei muito. de verdade.


    mas nã pode deixar de dizer que um dos meus grandes traumas de infancia foi assistir absolutamente impotente um desses balões, talvez o meu primeiro, voar livre, leve e solto para o ceu quando eu ainda mal tinha 5 anos.

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  3. As estrelas não são de ninguém. "Alguém" sempre é pouco pra elas. As estrelas são do universo, o único lugar grande o suficiente pra suportar tamanho brilho. No universo do meu coração sempre haverá espaço pra estrela Camis ;). Admiro-te!

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  4. Belo texto, Camila.
    E mesmo sem sorrir para o garoto, jamais te encaixaria na minha oração. A menos, claro, que você não fosse buscar minha estrela se pudesse. Hehe

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  5. Lindo, Camila!
    Enquanto lia, me senti sentada na grama, olhando os dois de longe, enquanto pude lembrar de tudo o que já foi estrela pra mim e que voou, e aproveitei pra conferir se a minha estrela ainda estava na outra ponta, amarrada ao meu pregador.

    Bjo!

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