Escrevi esse texto há exatos 16 dias. Hoje você que me lê observa em seu calendário de folhinhas arrancadas o dia 17. Eu, ainda o dia 1º. O que me dirá você, que arrancou 16 folhinhas a mais que eu agora, desse dia? É um domingo e aos domingos eu não trabalho. Deve estar chovendo, como em todos os dias de folga em São Paulo. Hoje, o dia 17, seria comemorado o aniversário da minha cachorra, que morreu há uns (?) talvez 5 anos? Eu sou dessas que decoram o aniversário de todo mundo, até mesmo o da cachorra, da cachorra morta. Ainda me lembro do dia em que ganhamos os cachorros, o casal de Cockers, lindos. Samantha e Spike. Lembro dos nomes, da casinha triangular, do dia em que Spike se foi e do dia em que Samantha se foi eu nem lembro pois não estava lá. É provável que no dia desse texto eu nem me lembre dela. Uma pena.
É provável que eu esqueça até de quem fui, ou no caso de quem estou sendo, neste dia 1º. Ando me esquecendo de muita coisa. Hoje mesmo me fugiu algo que não poderia ter deixado passar, mesmo tendo balbuciado três ou quatro vezes para dela não me esquecer. Desgarrei, perdida, dos truques e fui para o engodo. Fugi(u)(mos).
Para isso, ando metendo post-it em tudo. Tenho medo de colocar meu nome em um deles e grudar no monitor, aquelas coisas de gente velha que dá medo. Essa coisa de memória tem a ver com desgaste, eu ando meio desgastada, mas não é que a memória tá gasta, ela não está gostando de liberar mais de memória suficiente.
Hoje, dia 1º, uma fila enorme no metrô e a menina da minha frente me passa pela catraca sem cartão sem bilhete sem nada. Travou com ela e nela o susto. Pediu desculpas sem graça, passou por mim, saiu da fila. Essa coisa da memória tem a ver com o piloto automático. Você tem às vistas tanta putrefação mental que seu cérebro dá uma de entrar em coma e você fica vagando sem saber se tá indo ou tá voltando.
Escrevo esse texto com antecedência de 16 dias porque esqueci dois dezessetes anteriores. Estou com medo. Medo de esquecer. Por isso escrevi. Para lembrar. Quem fui no dia 1º, o que é perfeitamente passível de esquecimento. Agora me deu medo de esquecer de ler esse texto programado e, com isso, ficar sem saber quem fui no passado.
Para não gastar a memória com coisa pouca, colarei um post-it. Mas como não tenho nem um comigo, balbucio agora que preciso de post-it. Mas se balbuciar você esquece. Talvez esquecer seja o caminho mais insuspeito da memória. Ela esquece pra perder de você uma parte que não te fará falta. Como a falta de 16 dias de vivência não foi capaz de impedir esse texto, feito à base da premonição, feito à base do esquecimento.
Tem coisas que é melhor esquecer.
ResponderExcluirEntão por que a gente insiste em esquecer o que é para lembrar,
e insiste em lembrar o que é para esquecer?
Birra? Será?
O que eu ia comentar mesmo???
ResponderExcluirBelíssimo texto!
ResponderExcluirMe faz lembrar das vezes nas quais me agarro a um calendário qualquer, me perguntando se o dia 21 já passou!
Parabéns!
Adorei!
Se não fossem as listas que faço e as anotações na mão, acho que eu não teria sobrevivido até hoje.
ResponderExcluirE poutz... eu também tenho esquecido coisas demais. Mas não por estar velhe e esquecido, mas sim, pela mente estar ocupada com outras trocentas coisas que necessitam também ser armazenadas. Quando lembro, já foi. E diferente de outros, detesto anotar!
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