Não, "acreditar" não é a palavra. Isso porque eu jamais coloquei em dúvida sua existência. Para mim o Papai Noel existia, assim como minha mãe existia e assim como eu próprio existo. Não era o tipo de coisa que dependia de algum tipo de crença. Ele não existia. Ele ERA.
Era todo ano a mesma coisa. Conforme os ponteiros do relógio iam se aproximando da meia-noite, os adultos, devidamente mancomunados, iam trocando olhares suspeitos. Como ninguém em minha casa tinha fantasia de Papai Noel, os ardilosos mandavam minha irmã e eu nos escondermos no banheiro "já que o Papai Noel teria uma longa noite pela frente e não tinha tempo de cumprimentar cada criança de cada casa"- diziam.
Até hoje não entendo como este argumento mequetrefe nos convencia: lá íamos nós, com o coração aos pulos e a curiosidade nas alturas, nos trancar no pequeno banheiro dos fundos. De repente uma campainha tocava (sim, os malandros pensavam em tudo e sim, minha casa não tinha chaminé), uma conversa era forjada entre os adultos e o Papai Noel (sim, ele não tinha tempo para cumprimentar crianças, mas ficava de papo furado com os adultos. Velho hipócrita!). De repente, um murmurinho indefinido e um silêncio. Daí, alguém mandava nos chamar! Atravessávamos a casa antes de alguém conseguir dizer "ho ho ho" e lá estavam os presentes que o velhinho gorducho nos deixara (os melindrosos ainda tinham a sutileza de deixar um copo de refrigerante pela metade, para simular que alguém muito apressado o bebericara).
A farsa deu certo por 7 anos.
No início do oitavo, o SBT estreava o programa dominical Hot Hot Hot, apesentado por Silvio Santos. Este fato, aparentemente inocente, transformaria para sempre os hábitos natalinos de minha família. Numa certa ocasião, em uma atração voltada para crianças, Silvio Santos entrevistava o ator-mirim que interpretava Julinho em Éramos Seis (a melhor telenovela de todos os tempos, segundo meu próprio julgamento e sim, minha família assistia muito SBT naquele tempo). Papo vai, papo vem, até que o proprietário-apresentador pergunta: "Má oi, Julinhoam, hihi, oi, vem pra cá, quando você deixou de acreditar em Papai Noel?".
Um filme se passou na minha cabeça em questão de segundos. O banheiro. A campainha. O refrigerante.
A verdade veio à tona. Me senti como Truman (em "O Show de Truman. O show da Vida"), quando seu barco se chocou no cenário que era seu mundo.
A verdade veio à tona. Me senti como Truman (em "O Show de Truman. O show da Vida"), quando seu barco se chocou no cenário que era seu mundo.
E foi assim que deixei de acreditar em Papai Noel e passei a acreditar em Silvio Santos.
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Retrospectiva dos dias 22 em 2013
De como deixei de acreditar em Papai Noel
Tenho a impressão que deixar de acreditar em Papai Noel é apenas uma preparação para o que vem depois....quando começamos a deixar de acreditar em várias coisas....
ResponderExcluirNo meu caso depende do ano, às vezes ele aparece, não posso negar, mas às vezes ele pode sumir por anos...Vai saber se vai aparecer este....
E vale a pena instigar a crença no "bom velhinho"? Apesar da decepção, houve alegria nos sete anos de farsa, não houve? Ass: Barata
ResponderExcluirSim, Iara. Para muitas pessoas é primeira das muitas descrenças que vem pela frente. É um ótimo treino. Mas por outro lado, muitos continuam acreditando em coisas bem menos críveis que o Papai Noel... Joaquim Barbosa, cidadão de bem, essas coisas... Valeu pela leitura e comentário!
ResponderExcluirE como houve, Barata! Em muitos aspectos, foram meus 7 melhores natais!
Abraço!
Pergunto, se pudesse voltar no tempo, o que vc faria? (são suas únicas opções)
ResponderExcluirDeixar td como esta?
Apagar a decepção da não existência juntamente com a felicidade que teve no período em que acreditava.
O que voce escolheria?
Eu deixava rolar ipsis literis como aconteceu, Risa. Foi ótimo!
ResponderExcluir(mas não posso perder a oportunidade do drama.. rsrs)
Abç,