domingo, 13 de junho de 2010

O verde-amarelo da minha rua


A rua da infância se vestiu de Brasil para esperar o futebol. Há bandeirolas de uma ponta à outra, bandeiras em tubos plásticos, cal auriverde nas calçadas. Há meninos que desfilam camisas de times, e tudo nos saúda o movimento bonito do bairro familiar. A gente atravessa a rua sabendo que somos distintos, pois não há outra rua Helena como a nossa, a minha. 


Na infância de fogueira em junho, de pipoca e quentão. A mobilização, a caça de bambu longe. Um dia eu fui. Chegavam os homens, os velhos e moços na rua, trançavam entre postes a festa junina. O Zico, o bar, suas filhas, meu pai, o entusiasmo de mim, tão tímido, e das crianças. 


Eu quero esse verde-amarelo das periferias na minha alma de triste. Eu quero entregar tudo ao não-sentido da paixão de um movimento de campo. Eu que não sei jogar, nem dançar, pois nasci com os pés muito cavados, pernas confusas e nenhum jogo de cintura. Eu nunca soube idolatrar esses rapazes de chuteira fora do tempo da Copa. Ainda assim, eu quero pertencer a tudo isso, ao movimento pró-Brasil da minha rua, a essa coisa meio ingênua de bairro que nunca perdi, pois sou, sempre serei isso e todas as outras coisas estando aqui ou fora. 


Com ou sem Copa, eu não quero nunca me perder de mim. Troco talheres, corro para pegar o ônibus que lá vai, acho da maior dignidade o catador de papel, bebo média no tiozinho da esquina. Há muito eu me fiz digno demais para falsear a vida, fazer demasiado gênero para parecer bonito. Gosto da verdade ingênua espelhada no verde-amarelo das calçadas, o naif da vida sem neon ou ópio. E para os que acham esse clima de Copa ou futebol mera alienação, eu sou pela inconsciência, o transe feliz não ponderado, o samba-exaltação. Eu ando mesmo é desejoso do gol.

8 comentários:

  1. Bonita que só, essa sua poesia em prosa!

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  2. o zico mora na sua rua?

    o zico?? o galinho?? o ídolo rubro negro??

    bricadeira.

    ah, em 94 pintei a minha rua com meus amigos. Hoje não tem mais criança por lá. Nãotemos sucessores e as tintas de 94 já desbotaram tem muitos anos. Maior triste.

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  3. Minha rua também está assim...
    haha
    Abraço

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  4. A minha rua está exatamente assim, e o meu sentimento é bem parecido com o seu. Alienação? Pode ser, mas esse transe feliz do samba-exaltação também me pegou, e acho que merecemos voltar a infância e estourar umas pipocas para esperar o gol.

    Gostei muito do texto!

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  5. Minha rua não está assim, pois minha rua é de todos e de ninguém. E eu quero ver gol mas essa copa (ou a Jabulani?) não está ajudando...

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  6. Amei o seu post, quando o vi ontem na madruga, tava com o meu na cabeça, mas não tinha tido a chance ainda de fotografar o percurso.
    bem o meu saiu bem menos poético, porque tive de me distanciar do seu :(, mas de algum modo complementar.
    beijinhos

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  7. Ô saudade da gota. A gente pintava as ruas da vila todo ano de copa e reforçava o escudo do Palmeiras em frente a casa do Biba. Quando o Palmeiras foi campeão da libertadores em 1999 eu corri sem parar até em frente a casa do Biba pra mergulhar no brasão alviverde pintado de guia a guia e tive que mirar um canto vazio pra não machucar ninguém, já tinha uns 8 moleques deitados nele.

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  8. Que nostalgia gostosa experimentei ao ler seu texto. Bela crônica!

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