Vamos
celebrar
A estupidez
humana
A estupidez
de todas as nações
O meu país e
sua corja
De
assassinos covardes
Estupradores
e ladrões
Nosso suor
sagrado
É bem mais
belo
Que esse
sangue amargo
Vamos
celebrar
A estupidez
do povo
Nossa
polícia e televisão
Vamos
celebrar nosso governo
E nosso
estado que não é nação
Ninguém
respeita a Constituição
Mas todos
acreditam no futuro da nação
Mas o sangue
anda solto
Manchando os
papéis, documentos fiéis
Celebrar a
juventude sem escolas
As crianças
mortas
Celebrar
nossa desunião
Quem me dera
ao menos uma vez
Ter de volta
todo o ouro que entreguei a quem
Conseguiu me
convencer que era prova de amizade
Se alguém
levasse embora até o que eu não tinha
Vamos
celebrar Eros e Thanatos
Persephone e
Hades
Vamos
celebrar nossa tristeza
Vamos
celebrar nossa vaidade
Parece
cocaína
Mas é só
tristeza
Talvez tua
cidade
Muitos
temores nascem
Do cansaço e
da solidão
Vamos
comemorar como idiotas
A cada
fevereiro e feriado
Todos os mortos
nas estradas
Os mortos
por falta de hospitais
Todos os dias
quando acordo
Não tenho
mais
O tempo que
passou
Mas tenho
muito tempo
Temos todo o
tempo do mundo
Vamos
celebrar nossa justiça
A ganância e
a difamação
Vamos
celebrar os preconceitos
O voto dos
analfabetos
Comemorar a
água podre
E todos os
impostos
Queimadas,
mentiras
E sequestros
Quem me dera
ao menos uma vez
Fazer com
que o mundo saiba que seu nome
Está em tudo
e mesmo assim
Ninguém lhe
diz ao menos obrigado
Nosso
castelo
De cartas
marcadas
O trabalho
escravo
Nosso
pequeno universo
Toda a
hipocrisia
E toda a
afetação
Todo roubo e
toda indiferença
Vamos
celebrar epidemias
É a festa da
torcida campeã
Eu não
esqueço
A riqueza
que nós temos
Ninguém
consegue perceber
E de pensar
nisso tudo, eu, homem feito
Tive medo e
não consegui dormir
Vamos
celebrar a fome
Não ter a
quem ouvir
Não se ter a
quem amar
Vamos alimentar
o que é maldade
Vamos
machucar o coração
Se lembra
quando a gente
Chegou um
dia a acreditar
Que tudo era
pra sempre
Sem saber
Que o pra
sempre
Sempre acaba
Vamos
celebrar nossa bandeira
Nosso
passado
De absurdos
gloriosos
Tudo que é
gratuito e feio
Tudo o que é
normal
Vamos cantar
juntos
O hino
nacional
A lágrima é
verdadeira
Vamos
celebrar nossa saudade
E comemorar
a nossa solidão
Já que você
não está aqui
O que posso
fazer
É cuidar de
mim
Quero ser
feliz ao menos
Lembra que o
plano
Era ficarmos
bem
Vamos
festejar a inveja
A
intolerância
A
incompreensão
Vamos
festejar a violência
E esquecer a
nossa gente
Que
trabalhou honestamente
A vida
inteira
E agora não
tem mais
Direito a
nada
A humanidade
é desumana
Mas ainda
temos chance
O sol nasce
pra todos
Só não sabe
quem não quer
Vamos
celebrar a aberração
De toda a
nossa falta de bom senso
Nosso
descaso por educação
Vamos
celebrar o horror
De tudo isto
Com festa,
velório e caixão
Vamos lá,
tudo bem - eu só quero me divertir
Esquecer
dessa noite, ter um lugar legal pra ir
Já
entregamos o alvo e a artilharia
Comparamos
nossas vidas
E esperamos
que um dia
Nossas vidas
possam se encontrar
Tá tudo
morto e enterrado agora
Já que
também podemos celebrar
A estupidez
de quem cantou
Essa canção
E toda dor
vem do desejo
De não
sentirmos dor
Venha!
Meu coração
está com pressa
Quando a
esperança está dispersa
Só a verdade
me liberta
Chega de
maldade e ilusão
E eu dizia
Ainda é cedo
Venha!
O amor tem
sempre a porta aberta
E vem
chegando a primavera
Nosso futuro
recomeça
Venha!
Que o que
vem é Perfeição!
Nos deram
espelhos e vimos um mundo doente
Tentei chorar
e não consegui
Renato Manfredini Júnior
(27 de março de 1960 - 11 de outubro de 1996)
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