quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

Mito

Já faz trinta anos, mas lembro como se fosse ontem. Meu primo havia dito que Papai Noel não existe e eu fui contar isso para minha mãe, certo de que ela daria risada dele. “É verdade” ela respondeu, “não existe mesmo”. Estávamos perto do Natal, além de lidar com a inexistência do velhinho eu ainda tinha a sensação de ter sido tapeado.

Decidido a não perpetuar as frustrações familiares, parti logo para a verdade com meu filho. De forma lúdica, em meio aos brinquedos e tentando tomar todo o cuidado, cheguei ao ponto fatídico: “Filho, o Papai Noel não existe. Ele é só um mito. ”

Para minha surpresa o garoto abriu um sorriso e perguntou: “Então ele vai salvar o Brasil?”. Era só o que me faltava! Já era a segunda vez que essa revelação me desconcertava.

Ele havia ouvido, na casa de um amiguinho, que o mito ia salvar o Brasil e por isso a confusão. Dessas amizades de qualidade duvidosa a gente trata depois. Era hora de desconstruir o mito do mito.

Tentei ser o mais didático e ilustrativo possível para fazer com que uma criança de seis anos entendesse que um mito não existe no mundo real. É uma história inventada e, justamente por não existir, o personagem faz coisas grandiosas e fora da realidade.

Pensei que sendo racional e explicando porque o mito não pode ser transferido do imaginário para o real aquela criança de olhos esperançosos ia se convencer. Depois de muitos exemplos e fatos achei que tivesse dado certo. Ele fez cara de pensativo e começou: “Então... agora o jeito é torcer para dar certo e o Papai Noel cumprir a promessa de trazer um presente.”

Desisto. Por enquanto não vai dar para convencer o garotinho. Falta experiência prática e talvez daqui a um ano a realidade se sobreponha ao sonho. Não dá para negar que é tentadora a ilusão de personificar um mito que realize um desejo.

É tão tentador que meu primo, tão racional no auge de seus seis anos, esfregando na minha cara a dura realidade da inexistência do Papai Noel, esse ano tem se mostrado bastante seduzido por alguns outros mitos.

Encarei a crença dele como minha chance de revanche. Era minha vez de revelar a verdade. Expliquei porque um mito não existe no mundo real e suas promessas de façanhas são restritas ao mundo da ficção. Finalizei dizendo ser necessária a inocência de uma criança de seis anos para acreditar nesses mitos.

Nesse ano o Natal em família será tenso. 

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