Policarpo estava resoluto. Aos 47 anos, voltaria a estudar.
Mas não voltaria numa classe de supletivo, com pessoas de sua idade. Policarpo, muito bem formado em Direito, não precisava complementar seus estudos regulares. O que ele tinha era uma imensa saudade dos dias escolares, das merendas, do murmurinho do recreio, do pega-pega, do esconde-esconde, do taco e da amarelinha! E como tinha saudade das excursões! Das músicas que martelavam no ouvido do paciente motorista e da obrigatória guerra de bolinhas de papel!
Policarpo, já sem sentir a mesmo empolgação pelo seu trabalho como sentia nos primeiros dias, concluiu que nenhuma decisão seria mais acertada para lidar com sua crise de meia idade do que matricular-se num quinto ano primário. Série, que segundo sua minuciosa análise, lhe proporcionaria os maiores divertimentos. E foi o que fez! Na manhã seguinte acordou cedo e garantiu um dos primeiros lugares na fila da matricula.
No começo foi um pouco estranho. Não era exatamente o tipo de pessoa que as crianças esperavam encontrar como novo coleguinha de turma. A professora, uma mocinha de 22 anos, recém formada, desviava o olhar de Policarpo para evitar constrangimentos desnecessários. O curso semi presencial de Pedagogia que cursara não previa aquele tipo de situação. Seria necessário recorrer aos velhos manuais novamente.
Alguns pais ficaram alarmados quando souberam que os filhos tinham um colega de classe mais velho do que eles próprios. "É um pedófilo" - alardeavam uns, "é um traficante de órgãos" - previam os mais fatalistas, "o bigode dele até que é charmoso" - deixou escapar uma mãe solteira. Mas nada que abalasse o ânimo de Policarpo!
O fato é que todas as suspeitas logo caíram por terra. Policarpo revelara-se um aluno inofensivo e mais do que isso: exemplar! Não só por tirar boas notas e colecionar medalhas de honra ao mérito (honrarias que nem sonhava em receber em seus tempos de colégio, mediano estudante que era), mas Policarpo tornou-se também o mais popular entre seus colegas. Ensinou para sua nova patota tudo o que sabia (e sabia muito) sobre a seleção de 70, sobre Vila Sésamo, "Chips" e Johnny Rivers e aprendeu com eles sobre Messi, mangás, "Two and a Half man" e Restart.
Foi o goleiro menos vazado do campeonato interno, ganhou duas cicatrizes novas e até lhe nasceu uma espinha! Karps (seu novo apelido) nunca se divertiu tanto! A experiência presente fora bem melhor que a passada!
As crianças ficaram tristes, no entanto, quando não viram o nome de Policarpo na lista de alunos da sexta série. Tudo que é bom dura pouco, já diria o velho sábio...
Mal sabiam elas que a escola resolvera contratar um novo professor para o sexto ano...
Quem é o autor da ilustração, interrogação?
ResponderExcluirFico do lado de cá especulando como esse texto foi fermentado do lado do lado daí.
Acho que ele mereceria uma continuação, não?
Continuação? Bora lá, Híndira Barros! Dia 10 também chega! Que tal?
ResponderExcluirE a ilustração é minha mesmo...
É o sobrinho-neto do Policarpo Quaresma?
ResponderExcluirQue delícia de texto!
ResponderExcluirFoi uma ótima ideia.
ResponderExcluirSerá que Policarpo fala tupi?
Merece uma continuação sim...minha imaginação voou longe.
Delícia de texto! Devíamos mesmo reviver algumas épocas que foram gostosas da vida. Ou que não foram tão boas pra podermos transformá-las. Empolgante e gostoso como sempre, Felipe!
ResponderExcluirO colega Policarpo, coitado, ficou maluquinho, gente! Fez faculdade, graduação, se formou e voltou pra escola! hi hi hi hi Voltou pra escola igual criança... Maluquinho... Ai, deus do céu!
ResponderExcluirVocê sempre com essas coisas de retornar à infância, hein?! Perca isso não... os leitores e amigos agradecem!
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