Aos 8 anos eu não entendia nada de futebol. Minha mãe, muito preocupada com aquele meu defeito, espalhava bolas pela casa toda na esperança de que eu esbarrasse em alguma e - tomara Deus - tomasse gosto pela coisa. Não adiantava. Na escola eu declarava a todos que não tinha time e logo mudava de assunto quando alguém começava com aquele assunto que eu não dominava.
O tempo foi passando e minha mãe foi perdendo as esperanças. Ela passou a se conformar com o fato de que o filho dela não tinha os mesmos interesses de todos os meninos daquela idade e deixou de tentar remediar o irremediável. Deus haveria de cuidar de mim e me dar amigos, ainda que eu fosse daquele jeito.
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Aos que não gostam de futebol, devo dizer que esta história não acaba bem. Eu não passaria ileso aquele ano de 94.
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O ano ia se aproximando da metade e meu irmão mais velho estava de namoradinha nova. Eu, que não sabia nada de futebol, entendia menos ainda de namoros, de modo que alugava a pobre moça para brincar comigo, sem me importar com o infortúnio que aquilo representava a ele que, afinal, não tinham lá muito tempo para ficar junto dela.
O fato é que até mesmo ela parecia se interessar bastante por aquele esporte. Aliás, naquele mês de junho todos ao meu redor só falavam disso. Era a Copa do Mundo, ela me explicava, um campeonato que acontece a cada 4 anos e que o Brasil não ganhava há mais de 20! Opa, aquilo começava a ganhar ares desafiadores e, consequentemente, a me interessar. Essa coisa de competição era algo que me atraia bastante naquela época.
Os dias foram passando e eu fui me interessando por aquelas conversas. O Brasil, diziam, tinha um time apenas regular e dificilmente iria muito longe naquela Copa, o que só aumentava minha recém adquirida ansiedade futebolística. Por fim, o primeiro jogo. Me lembro da família reunida na sala e do gol do Raí, de pênalti, contra a Rússia. Nesse jogo, eu aprendi o que era um pênalti. Com a minha futura cunhada, como a essa altura já se supõe.
No jogo seguinte eu aprendi o que era uma goleada e também aprendi que havia um país chamado Camarões. Contra a Suécia eu aprendi que aquele tal de Romário era bom mesmo e que se podia contar com ele em jogos difíceis como aquele. O Brasil havia se classificado para as oitavas de final, minha didática e tão solicita cunhada me explicava, e agora não poderia mais perder se quisesse ser campeão. Foi nesse dia que aprendi o que era uma prorrogação e disputa por pênaltis. Aquilo estava ficando cada vez mais interessante!
Os donos da casa estavam em nosso caminho. Os Estados Unidos eram os anfitriões e disputavam aquela partida justamente no dia em que comemoravam o aniversário da independência do país, mas naqueles tempos eu pouco entendia da importância daquilo tudo e só queria saber qual era a dificuldade de se enfiar uma bola minúscula num gol daquele tamanho. Naquele dia, pela primeira vez uma partida de futebol me deixou nervoso. Avançamos com Bebeto e enfrentaríamos a Holanda!
Ah, a Holanda! Eles conseguiram empatar um jogo que parecia ganho e fizeram do gol do Branco, no fim do jogo, um acontecimento épico em minha memória futebolística. Foi nesse dia que Bebeto inventou a icônica comemoração do bebê sendo embalado e que seria muito imitada por mim em meus gols infantis, eu que ainda nem tinha filhos. O Brasil estava na semifinal e jogaria novamente contra a Suécia.
Contra os suecos eu aprendi que meu nervosismo poderia atingir níveis estratosféricos e que um baixinho de 1,68 poderia fazer um gol de cabeça e levar o Brasil à final.
Àquela altura eu já estava mergulhado naquele mundo e já não dependia tanto dos ensinamentos de minha cunhada, já podíamos torcer de igual pra igual naquele jogo contra a Itália. E foi o que fizemos. Por 3 angustiantes horas...
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Já se vão 20 anos daquela final, mas ainda me lembro de minha avó, com um terço na mão, rezando por cada jogador durante o hino nacional, da angústia da prorrogação e das cobranças de pênaltis, da alegria que atingiu a todos em minha casa naquela noite e dos pulos que iam mais altos que a bola de Roberto Baggio!
Aos 8 anos eu não entendia nada de futebol. Não sabia que os jogadores eram milionários e que trocavam de time conforme a conveniência financeira. Não sabia que muita gente se digladiava por causa do futebol e que, naquela mesma Copa, um jogador colombiano fora assassinado em seu país por ter tido a infelicidade de ter feito um gol contra. Não entendia nada de xenofobia, racismo e machismo e muito menos a relação disso tudo com o futebol. Não sabia que o futebol era um negócio e que ele poderia movimentar tanto dinheiro. Não sabia o que era máfia e nem corrupção. Pensava que o futebol era apenas um esporte.
Em 94 eu gostava bem mais de futebol do que eu gosto hoje. Não porque em 94 o futebol fosse mais inocente. Mas porque eu era...
Aos 8 vc não entendia nada de futebol, e se pensar que aos 28 vc é corintiano.... ah... deixa pra lá!
ResponderExcluirDe qualquer forma, a Copa de 94 é a que eu lembro com mais detalhes, já as duas últimas eu mal lembro quais foram os adversários do Brasil!
Pois é, cara... minha corinthianice começou por esses tempos... de modo que não nasci corintiano, como alguns afirmam ser a regra... rsrsrs
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