terça-feira, 1 de setembro de 2009

onde jazz meu coração

américa latina, 01 de setembro de 2009

meu bem,

rá, rá rá! a vi chorando minha falta na TV e só pude rir com a cena que presenciei. estou aqui, num país feliz, levando minha vida de cantor de churrascaria, ganhando meus trocados que dão pra pagar o aluguel de um quarto no centro da capital, tirando fotos vez ou outra com turistas brasileiros e curtindo cada momento. e você, como está? sobrevivendo sem minha pensão que tantas vezes julgou mixuruca? como estão nossos filhos? e meu empresário, aquele doido? e estes repórteres idiotas do fantástico? eles acham que são investigadores ou coisa assim? rá, rá, rá!

sabe o que é mais engraçado nesta história toda? por que só depois de dois anos vocês resolveram me procurar? sabe, eu lembro bem do dia em que parti. desde que nos separamos e fui morar sozinho, me senti mais livre, mais eu. não que eu fosse preso à você, imagine! lembra aquele dia que eu cheguei em nosso apartamento e você estava transando com meu primo? eu nem liguei. sou artista e artista não liga pra essas coisas. além do mais, você sabe... eu sempre tive outras gentes por aí.

bom, mas eu estava falando do dia em que parti, não é? então, apesar de me sentir mais solto divorciado, eu não estava feliz. algo me incomodava e eu não sabia o que era. fui pra são paulo e pedi ao meu empresário que não marcasse mais nenhum show. aluguei uma casa e comecei a fazer várias coisas, como pintar quadros, escrever roteiros de filmes, compor canções. e ainda estava infeliz. foi quando decidi dar umas férias a mim mesmo. fiquei alguns dias num hotel, ali nos jardins. acordava tarde, fumava unzinho e dormia a maior parte do dia. aí, numa tarde destas resolvi pegar um avião pra qualquer lugar. deixei o carro em congonhas (meu deus, só agora pela internet vi que devo horrores ao estacionamento, rá, rá rá...) e procurei os guichês de embarque. eu já conhecia a maioria dos países, então entrei numa fila qualquer e vim parar aqui, onde estou até hoje.

juro, não sei explicar porque fiz isso, mas sei que estou mais feliz que nunca. vai dizer que você nunca quis fugir? vai me dizer que é feliz neste paisinho de merda que é o brasil? eu sim sou feliz! cadê meus contemporâneos? estão fazendo shows beneficentes ou então dando vexames bêbados cantando o hino nacional em eventos políticos! ou não, talvez estejam chorando em canais de TV por mais uma chance na midia... midia! eu nunca precisei deles, eu quero que eles morram, raça de víboras.

quero desejar, antes do fim, pra mim e os meus amigos, muito amor e tudo mais. nunca fui tão sincero e coerente comigo mesmo. rasguei meu coração selvagem e agora vivo o que sempre cantei. se você vier me perguntar por onde andei no tempo em que você sonhava, de olhos abertos, lhe direi: tenho ouvido muitos discos, conversado com pessoas, caminhado meu caminho. avise a quem perguntar, eu não vou voltar, pois há muito que viver do lado de cá.

e eu quero é que esse canto torto,
feito faca, corte a carne de vocês,

até mais ver,

belchior
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16 comentários:

  1. belchior não pode ter ido muito longe sem dinheiro no banco e com medo de avião...

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  2. Tudo isso pq ele não quis ficar nessa cidade, talvez voltar pro sertão encantado com uma nova invenção.

    E essa lembrança, é o quadro que dói mais.

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  3. país feliz??? belchior foi pra vênus, então.

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  4. Sou artista e ligo para essas coisas.

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  5. e o pais segue invejando o belchior ne? maior legal.

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  6. Ser procurado pelo fantástico é tão vergonha alheia quanto cantar o hino nacional bêbada...

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  7. rá, adorei
    totalmente imaginei o belchior como cantor de churrascaria curtindo a vida adoidado

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  8. Passar aqui é ter certeza de boa leitura. Massa, galera.
    Abraço de arte.

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  9. belchior é que é feliz...
    enquanto a gente fica fazendo suposições, ele tá se divertindo.

    primeira vez que eu venho aqui, gostei muito, já estão adicionados como um favoritos no meu blog. bom mesmo!! parabéns

    abraço

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  10. Oi pessoal, obg pela visita ao GRAÇA PLENA, Deus abençoe vcs e voltem sempre. Valeu

    Joelson Gomes

    htp://gracaplena.blogspot.com

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  11. Eu acho o Belchior brega. Acho o discurso dele velho. Acho que Elis deu dignidade a algumas de suas canções. Canções que eu cantei até a exaustão. Canções que fazem de mim um cara brega, embora eu não cante mais, sem algum embaraço (eu cantaria em uma excursão para Santos ou Aparecida do Norte com velhos amigos velhos). Mas se toca na rádio, por acaso, eu canto sem acreditar no que as canções dizem (eu presto atenção às letras). E confesso que não sentia nenhuma falta dele, do Fagner, das canções do Lo Borges, e de um pessoal mais ou menos da mesma geração. Mas seu texto me fez lembrar o quanto eu sei dele, e de repente senti alguma falta. Não dele. Do menino que fui. E vou.

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