terça-feira, 29 de setembro de 2015

o que é família?


Foi à pergunta em determinado processo seletivo.

Confesso que até então, jamais tinha pensado no que considerava ser uma família. Mesmo porque a minha sempre esteve super desajustada no refere aos padrões margarina; ou tive enormes dificuldades na parte teórica para definir.

Desde então, busco saber.

E seja em palestras, cursos, seminários e afins percebo que tem se discutido mais sobre as famílias. Mesmo porque elas tem se modificado no mesmo ritmo que a sociedade. Tornou-se tão complexa e em crise quanto à crise do capital e aquém de respostas prontas.

Então para além da teoria, em sua opinião o que é família?

Também considero que o inenarrável interesse pela discussão e definição de forma categórica e jurídica se deve ao fanatismo religioso e aquela besteira de ameaça comunista as famílias.  E confesso que se esta ameaça de fato existisse beneficiária muitíssimo elas. Afinal veja o que o projeto de sociedade democrática, porém capitalista faz com as famílias: sírias, africanas etc.

Mas a discussão deve-se também à demanda gigantesca em equipamentos públicos que vivenciam crises sem fim desde a sua implementação pelo Estado de Direito, porém super burocratizado que potencializa a desigualdade social agrava ainda mais os problemas sociais das famílias.

O interesse religioso está relacionado ao fanatismo medíocre, que se diga depende muitíssimo das famílias para se perpetuar através de dízimos e ofertas na sociedade. Independente do estado de sofrimento que elas estejam todo problema social se resolve com oração (nada contra afinal também oro) e persistência nas provas com Deus.

Exagero? Imagina filho (a).

Veja que o Estatuto da Família (PL 6.583/13) aprovado por 17 votos a 5 que exclui  famílias diferentes do tradicional (ou seja família é apenas o  papai, mamãe e filhinhos) nos prova isso, principalmente quando se nota o oportunismo de partidos que não necessariamente são religiosos.

No que refere à demanda, ela existe e é requerida em debates da assistência, saúde e justiça pelos profissionais que vivenciam nos atendimentos a decante condição em que se encontram as famílias fora dos padrões de comercial e foto em rede social, ou seja, exclui a família real, do cotidiano sabe.

E tão decadente quanto é notar que mais se preocupam com a definição  do que com as famílias e suas demandas. Ou alguém realmente acredita que definir o que é família impedirá os diferentes e/ou iguais de se relacionarem tendo em vista que o homem é um ser social e precisa do outro, portanto, viver em comunidade, família, seja o que for.

Ou acreditam que definir o que é família vai impactar as demandas?

Sem pestanejar creia que definir o que é não contribui em absolutamente nada para impactar demandas e problemas sociais das famílias.

Hoje compreendo que o conceito de família é amplo e, portanto extrapola o âmbito do fanatismo religioso, extremismo teórico e oportunismo político de classe social privilegiada.

Mas sabe o que é?

Agora estou pescando. É isso mesmo, estou caindo pela tabelas, lutando contra o sono. Mas garanto desenrolar noutro instante o que considero família.


Sendo deixo o vídeo para mostrar um pouco:

ay qué família yo tengo
***

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

líquido


líquido
adjetivo
1. fís. diz-se do estado da matéria intermediário entre os estados sólido e gasoso, caracterizado por apresentar forças de coesão intramoleculares mais fracas que as dos sólidos, e mais fortes que as dos gases.
2. que flui ou corre como água.

Era o segundo cigarro que acendia em menos de quinze minutos. Assoprou a fumaça enquanto olhava de soslaio para a carta fechada em cima da mesa. Tamborilava os dedos no tampo de madeira enquanto dava mais um trago.

Anne, 28 anos, solteira, virginiana, ascendente em aquário. E quem raios escreve e envia uma carta hoje em dia?!

Apagou o cigarro no cinzeiro e ficou encarando o envelope. Ela sabia quem era, conhecia aquela letra cursiva do diabo mais do que gostaria de admitir. E adorava e odiava aquela caligrafia.

Amor fati. Amor líquido. Tantas definições apenas para esconder o quanto foi otária.

 “Líquidos mudam de forma muito rapidamente, sob a menor pressão. Na verdade, são incapazes de manter a mesma forma por muito tempo. No atual estágio “líquido” da modernidade, os líquidos são deliberadamente impedidos de se solidificarem. A temperatura elevada — ou seja, o impulso de transgredir, de substituir, de acelerar a circulação de mercadorias rentáveis — não dá ao fluxo uma oportunidade de abrandar, nem o tempo necessário para condensar e solidificar-se em formas estáveis, com uma maior expectativa de vida.” (BAUMAN, Zygmunt)

Levantou da cadeira e começou a andar pelo apartamento.

“...  Tudo para disfarçar o antigo medo da solidão.”

Olhou para o chão enquanto andava, os braços cruzados e inquietos.

Eventualmente, tudo o que queria era não se sentir descartável. Aquela carta, e não precisava nem abrir para saber aquilo, carregava uma série de feridas antigas, promessas que deixaram de se cumprir e outras coisas largadas pelo caminho.

Não foi ela quem simplesmente desistiu de tudo. A ela só coube encarar com dignidade e seguir em frente. É isto o que fazemos quando acreditamos demais, fingir que superamos e aguardamos silenciosamente pela próxima decepção, virando a esquina. Acender um cigarro, olhar para os dois lados e atravessar a rua, uma parte sua torcendo para chegar do outro lado enquanto todo o resto deseja ansiosamente pelo motorista ensandecido que vai te fazer voar pela pista. Talvez quando você estiver no seu leito de morte no hospital, quem você espera surja, falando o quanto você fez falta.

Mas foda-se. Não vai acontecer e ninguém perguntou nada.

E a carta ainda estava ali. Chegou junto com as contas, como se fosse algo banal.

Talvez banal fosse mesmo a palavra.

 “As relações se misturam e se condensam com laços momentâneos, frágeis e volúveis. Num mundo cada vez mais dinâmico, fluído e veloz. Seja real ou virtual.
(...)
 Vivemos tempos líquidos, nada é feito para durar, tampouco sólido. Os relacionamentos escorrem das nossas mãos por entre os dedos feito água”.

Olhou mais uma vez para o envelope em cima da mesa. Inquisidor. Pegou o isqueiro.

“...as pessoas precisam sentir que são amadas, ouvidas e amparadas. Ou precisam saber que fazem falta. (...) Ser digno de amor é algo que só o outro pode nos classificar. O que fazemos é aceitar essa classificação. Mas, com tantas incertezas, relações sem forma - líquidas - nas quais o amor nos é negado, como teremos amor próprio? Os amores e as relações humanas de hoje são todos instáveis, e assim não temos certeza do que esperar”.

Apreciou a carta enquanto pegava fogo. Não precisou nem abrir para saber o que era. Se seu remetente tinha sido covarde por tantos anos (e não era menos covarde agora), não cabia à Anne ser corajosa ou forte mais uma vez. Pra que se dar a chance de se machucar novamente, por alguém que foi sem olhar para trás?

Não importa. Meios que justificam fins inacabados só são detalhes.

E aquilo, num mar de promessas inacabadas, estava finalizado.

“E foda-se você” – disse, ao acender o cigarro no envelope.

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Projeto Desapega Parte #1

Depois de muitos meses sem postar volto a dar o ar da graça com um novo projeto.
Quero me desfazer das coisas que não uso e ter uma vida mais leve e organizada.
Sei que esse é um processo a longo prazo e espero não desistir no meio do caminho.
Para que isso não aconteça, vou compartilhar com vocês cada etapa.

A cada mês vou focar em um dos itens abaixo:
- Material de estudo de Ingles
- Material de estudo de Espanhol
- Material de estudo de Frances
- Apostilas 
- Livros
- Documentos
- Sapatos
- Roupas
- Cremes
- Dispensa 

Farei um levantamento do que tenho, do que quero me desfazer, e de como organizar o que ficar.
A idéia não é finalizar cada um em um mês, mas sim iniciar um novo item a cada mês e atualizar o status de todos.  

Comecei pelo Material de Inglês. 
Foto de como ele está hoje: 


Como quero que fique:
Apenas esse caderno com anotações
Levantamento do que tenho para organizar/ estudar:
- passar 29 folhas de rascunho a limpo
- 274 páginas de livros diversos (xerox)
- 1 livro com 148 páginas (Ingles para Secretárias)
- 1 livro com 456 páginas (Anybody Out There? - Marian Keyes)
- Curso de Idiomas Globo Ed 1 a 9
- Curso Alps Step 9 (2 livros + 1 CD)

Recompensa: Livro "Objective IELTS advanced student´s book"

Não consigo prever quanto tempo vou levar para terminar de revisar todo esse conteúdo, mas espero conseguir dedicar pelo menos 1 hora do meu dia à esse projeto.
Quem tiver interesse nesse material se manifeste, pretendo doar todos, menos os rascunhos e as xerox de livros.
Wish me luck! :-)

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Meu Aurélio particular

A língua portuguesa conta hoje com quase meio milhão de palavras. Qualquer um diria que com esse número de palavras dá pra bater um lero bom. Há sinônimos para uma infinidade de adjetivos e o sujeito mais preciosista pode dizer, sem margem para imprecisão, se está triste, infeliz, desgostoso, consternado ou, em alguns casos mais preocupantes, lúgubre. 

Dia desses, entretanto, ouvi uma frase com a qual não posso deixar de concordar: "O dicionário é o cemitério da língua". Sim, a língua é fluida como as águas de um rio (como diria Marcos Bagno) e as palavras novas e mesmo os significados atribuídos às palavras antigas mudam a cada dia, dependendo de variáveis como região geográfica, contexto ou até mesmo a idade do sujeito que a pronuncia. Um dicionário, por sua vez, se não acompanhar o fluxo dessas mudanças, será somente um depósito de palavras caquéticas.

Pensando na fluidez da língua, um fenômeno interessantíssimo de se observar é a existência de léxicos familiares, ou seja, um apanhado de palavras que só são inteligíveis dentro da unidade familiar e que, se utilizado fora desse contexto, é encarado como esquisitice. Dito isso, quero compartilhar com vocês parte do léxico de minha família de origem, o nosso "Aurélio particular".

Gostaria de iniciar pelos termos mais pudendos porque creio que é aqui em que reside o cerne da questão, porque acredito que as famílias não se distinguem pelo sobrenome, mas pelo modo como nomeiam suas partes pudendas. O órgão feminino é, sem sombra de dúvida, aquele que mais atenção recebeu por aqueles de minha laia. A forma mais popular para designá-lo é o curioso monossilabo tchó, que se pronuncia de maneira análoga à palavra tchau. O uso era (é) tão forte que as mulheres de minha familia de origem, ao quererem exprimir preguiça ou impaciência, diziam "não tô com tchó pra isso hoje" (e jamais utilizavam a palavra "saco" nestes casos). Um outro vocábulo para referir-se à tchó é o não menos curioso dissílabo pota (lê-se "póta"), mais largamente utilizado pelas gerações mais antigas e invariavelmente num contexto mais pejorativo do que aquele em que o inocente tchó está presente. A expressão pota lisa (em tradução livre: tchó sem pêlos) pode ser entendida, por exemplo, como alguém que quer se aparecer ou, para utilizar outra expressão de meu léxico familiar, alguém que quer nome.

O órgão masculino, por seu turno, também recebeu entre os meus alcunhas memoráveis. Os mais antigos referiam-se a ele por malacha (malatcha) ou simplesmente mala. Os de minha geração adotaram o vocábulo benga e, os mais jovens, referem-se ao ditoso membro por badola, demonstrando que o léxico familiar também está envolto por conflitos geracionais.

Mas não só de partes baixas vivia nosso léxico familiar. Assim, deixo as partes pudendas para compartilhar com vocês o mais importante e multifuncional dos vocábulos de minha família, a conhecidíssima palavra colega, que em minha casa sempre foi um grande enigma. A palavra colega sempre era utilizada para designar algo que se queria ocultar. O colega gelado, por exemplo, queria dizer sorvete e era usada nesses termos quando utilizada próximo a crianças para que estas não ficassem com vontade ou algo do tipo. Um adulto poderia dizer no meio do almoço em família, por exemplo: "Alguém comprou um colega gelado para a sobremesa?". O mesmo valia para a pizza que era a colega redonda: "Vamos pedir a colega redonda hoje ou deixamos para outro dia?". E por ai vai. O colega, era sempre alguém tacitamente conhecido pelos interlocutores mas cuja pronúncia do nome era indesejável, geralmente pela existência de um terceiro na cena. Inevitavelmente volto às partes pudendas: "estou com coceira no(a) colega" ou "Não esqueça de lavar o colega cheiroso" eram outras aplicações bem frequentes do coleguismo.

O mais interessante é que este vocabulário próprio saía com naturalidade. Aliás, eu jurava que algumas dessas palavras eram de domínio público até muito tarde. Foi só quando algumas pessoas passaram a me olhar meio torto que eu fui percebendo que era só em casa que eu podia dizer que tinha sobe (dó) de alguém ou que alguém era bocolão (bobão) sem ser taxado de estranho. E mesmo hoje, após tanto tempo de imersão no mundo público, sempre que escuto alguém referindo-se a outro por  "colega", dentro de mim se forma instantaneamente um sorrisinho de cumplicidade.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Ufa! Deu tempo!

Desculpem pelo mês passado, e pela demora de hoje!
Vida mais corrida do quê o costume!
Mas tá aí!
Abração, e até o mês que vem! 

domingo, 20 de setembro de 2015

Pretérito Imperfeito

Escolher. Tentar. Errar. Aprender. Melhorar. Acertar.

Com tantas opções com as quais nos deparamos ao longo da vida, essa parece uma sequência inevitável. Do sabor da pizza a algo que muda nossas vidas para sempre, estamos inevitavelmente sujeitos a errar na escolha. Tem o lado bom. Aprendemos, melhoramos, desenvolvemos experiência e tudo mais.

O lado ruim é a lei da ação e reação, emprestada da física para ser empregada metaforicamente na vida. Além de ações ruins implicarem em reações ruins, nossas situações de escolha se tornam ainda mais complexas quando relacionadas com as de outras pessoas.

É difícil conciliar interesses, expectativas, desejos e vontades. Às vezes erramos em uma simples omissão, coisa boba, ou mesmo na reação que temos quando a outra pessoa erra. Por um momento nem parece que somos humanos, pois cobramos uma perfeição inexistente.

Diante de escolhas, erros e acerto, a ponderação parece ser primordial. Nem tudo é imperdoável, nem sempre precisamos ser inflexíveis, nem todo erro deve ser marcado com ferro quente para que deixe uma cicatriz eterna.

O tempo é abstrato demais para determinar determinar decisões concretas. Pode ser que a melhor opção seja deixá-lo passar, tranquilo e sereno enquanto nosso interior está revolto e caótico. Um dia percebemos que certas escolhas têm volta, sim. Nossa aprendizagem se concretiza quando nos proporcionamos uma nova tentativa, depois de ter tentado, errado, aprendido, melhorado, para finalmente acertar.


terça-feira, 15 de setembro de 2015

De raiz

Desde que casaram, meus pais nunca se mudaram de casa. Ela já passou por várias reformas e hoje não se parece nada com aquele bloco quadradão rodeado com a calçada vermelha que parecia infinita quando eu era criança. Mas continua lá, na mesma rua, que até já mudou de nome. 

Em compensação, eu já tive outras nove. Comecei saindo de casa cedo, para terminar o colegial. Me mudei para fazer cursinho. Durante as duas faculdades, foram outras três diferentes moradas. Vivi um ano em outro país e, apesar de saber que ali eu tinha um prazo de validade determinado, também considero que tive um lar. No traumático primeiro emprego, tive uma diferente casa brevissimamente. Mudei-me outra vez para trabalhar na mesma cidade na qual terminei o colegial e ali permaneci pelo maior período de tempo em um mesmo lugar, tirando a casa dos meus pais. Há alguns meses estou na maior cidade da América do Sul, também a trabalho. 

Às vezes me pergunto se um dia isso irá acabar. Se em algum momento, assim como meus pais, eu terei um CEP fixo. Da mesma forma, me questiono se eu quero que isso aconteça. Ainda não encontrei respostas, mas confesso que elas não são relevantes. Estar sempre de mudança é chato, trabalhoso e doloroso. Em contrapartida, traz experiências poderosas que só entende quem é meio nômade, assim como eu. Com a vida cigana, conheci lugares incríveis, aprendi a me virar na cozinha, economizar no mercado, usar transporte público, ser menos desorganizada, mais criativa e até a limpar calhas. O mais importante: fiz amizades que, mesmo que de convivência efêmera, permanecem até hoje. Mudanças assustam, mas novidades me encantam.

Diferente dos meus pais, talvez eu nunca crie raízes físicas. Entretanto, quando a coisa arrocha é para a velha casa de número 655 (hoje com calçadas brancas) que eu volto correndo. É lá que eu passo as férias e ganho sopa quando estou doente. Foi para lá que eu sempre corri aos prantos quando o coração partiu ou apertou. É lá que eu quero estar quando eu preciso recarregar a bateria. 

Eu já nasci com raízes. Mas não me entenda mal. Elas não são feitas de tijolos e argamassa, com um teto por cima. Elas são invisíveis, superelásticas e me ligam a dois seres iluminados que respondem prontamente quando eu grito "mãe!" e "pai!". Só coincidiu de elas estarem geograficamente no mesmo lugar durante toda a minha vida.

Quarentolândia


O corpo humano considera que cruzar a fronteira da Quarentolândia é um grande feito. Por isso ele celebra com vários eventos comemorativos no seu organismo que é para você ter certeza da doce alegria que é trilhar o caminho para a velhice. 
 
Aos 40 anos, suas costas doem. Músculos que você nem sabia que existiam doem. Você se pega esticando o braço e colocando o papel lá longe porque não consegue mais ler as letras tão pequenas. É, meu caro. Sua vista, assim como todo o resto do seu corpo, está cansada. 

Certeza que os 12 Trabalhos de Hércules, o coroa quarentão, incluem “colocar linha na agulha” e “ler a data de validade na cartela de Tylenol”. É o paradoxo da bula. Quanto mais você precisa de remédios, menos consegue ler as instruções.
  
Aos 40 anos, você atinge uma nova marca. Quarenta em algarismos romanos é XL. EXTRA LARGE. Ou seja, você agora é gordo até na idade. 

Seguindo essa linha de raciocínio, o universo resolveu me dar de presente uma gordura localizada nos quadris chamada carinhosamente de “culote”. Que é mais ou menos como se as suas coxas estivessem eternamente entre parênteses.

Até então eu tinha sido gorda em apenas um sentido – não apenas o literal, mas frente e verso. Barriga e bunda. Norte e sul. Agora sou gorda também para os lados. Para todos os lados. Trezentos e sessenta graus de pura fofura. 

Mas eu não sou velha, eu sou retrô. Sou old school. Sou vintage (quarentage, como diria @andreh77). Sou um clássico.

E como acontece com todos os bons clássicos, fizeram uma remasterização para marcar essa data redonda – e bota redonda nisso! Por isso, ao completar quarenta anos, eu não engordei para os lados. Eu simplesmente fui relançada numa edição especial em 3D.

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Oi! Que Bom Te Ver Aqui...

Mas não fique muito perto e nem fale nada.

Qualquer assunto que fluir entre nós, assim como sempre acontece, vai me fazer derreter novamente.

Não quero derreter de novo, pois demoro a me recompor.

A não ser que você me dê um beijo agora, ingrediente primordial pra me dar consistências suficientes pra enrijecer nossos laços e dar base a qualquer assunto, ação ou situação que vier a calhar.

Agora é assim, só aceito sob essa condição. Me beije pra que eu não desmorone e me torne atônito.

Me beije e terei força pra dar fluidez a tudo que nos envolver e assim, poderás permanecer ao meu lado, mais próxima que quiser, sem que eu derreta e suma nas pequenas entranhas da minh'alma.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Sobre você

Cansei de escrever sobre mim. Vou escrever sobre você.
Sobre seu medo de avião.
Sobre seu prazer em cozinhar comigo.
Sobre seu olhar apaixonado.
Sobre sua mania de achar que tudo tem que ser do seu jeito.
Sobre sua mania de inventar apelidos e carinhos e promessas.
Sobre seu carinho por sua família.
Sobre sua falta de organização.
Sobre suas músicas e seus livros.
Seu time.
Seu trabalho.
Seu signo.
Sua cama.
Sua barba.
Sobre como você me acha engraçada.
Sobre como você gosta do meu café.
Sobre como você dispensa a sobremesa.
Sobre sua groovagem frenética.
Sobre seus pesadelos.
Sobre seus sonhos.
Sobre quando você começou a me amar.
Sobre todo amor que sinto quando você me abraça forte,
Quando dança comigo,
Quando inventa musiquinhas,
Quando passeamos de mãos dadas...
Quando você entrou em minha vida (como um sol no quintal), e me deixou entrar na sua.






Para ouvir:


terça-feira, 8 de setembro de 2015

Vai Corinthians!

Sentada no ponto de ônibus ouço voz de homem chegando e repetindo:
  -Vai Corinthians! Vai Corinthians! Vai Corinthians!

  Olho pro lado para ver quem é o tonto, vejo um cego com um cachorro guia que quando chega no ponto diz:
  -Pára Corinthians!

imagem: pimaucs.blogspot.com.br

domingo, 6 de setembro de 2015

Limites

Genésia é uma senhorinha, Dona Genésia. Dona de oitenta e tantos anos, e não há nada em sua aparência que a distinga das demais senhorinhas: cabelos brancos, rugas, óculos de grau para longe e para perto, roupas de avó.
Seu diferencial era odiar os filhos, todos eles: a primogênita, os gêmeos, o seguinte, a próxima e o caçula; detestava os beijos frouxos que lhe davam, os abraços que não deixavam marca na blusa.
 Sempre fora conhecida por sua delicadeza, na juventude a pele clara, os olhos cor de mel, os cabelos castanhos claros e o gênio dócil lhe conferiram o apelido de delicadeza.
Na época gostara da alcunha dada. Aliás, por um dos muitos pretendentes.
Exercera o máximo da fragilidade feminina: em casa, quando posta para mexer o tacho de doces, sempre conseguia rápida substituição. Usava luvas. Crê em alguém usando luvas no interior quente de Minas? Pois usava. Certo é que na época todas as mocinhas de romances usavam, mas na realidade só ela ousava.
Gostava de caminhar com a sombrinha cor-de-rosa pelas estradinhas de terra; cumprimentando vizinhos, ouvindo gracejos respeitosos dos admiradores, de ganhar frutos retirados do pé, fresquinhos. Quando ia aos bailes deslizava no salão, parecia bailarina, quanta leveza! A vida era intensa nas delicadezas de ser vivida. 
Agora era avó de alguns netos, todos crescidos, que poucas vezes a visitavam. Um tanto quanto melhor: odiava eles também, mais polidos do que os pais, onde já se viu?!
Ninguém mais a chamava de delicadeza. O encanto da palavra passara de descrição de sua aparência e personalidade a definição de sua condição; as gentilezas substituídas pelo tratamento obrigatório que se deve a uma mulher de oitenta e muitos anos. 
Um dia surgiu Luca, um mocinho dono de apenas cinco anos, olhos pretos e grandes, cabelos crespos bagunçados, pele negra. Era filho de Maria, senhorita de seus vinte cinco anos, nova namorada de um dos netos insossos, era ela mesmo uma insípida, quando apresentada a dona Genésia não despertara querência, tocara lhe de leve, o beijo no rosto mal se encostou à pele envelhecida. 
A moça não era quista pela família, já tinha filho, onde já se viu? E que moleque capeta, viu o pulo que deu na vó, quase a desmonta! 
- Ah que precioso! - suspirava Dona Genésia, sem ouvir os blá blá blás dos filhos.