terça-feira, 30 de março de 2010

Há tempo (perdido) para tudo

Todos os dias quando acordo não tenho mais o tempo que passou
Para tudo há uma ocasião certa
Mas tenho muito tempo
há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu
Temos todo o tempo do mundo
tempo de nascer e tempo de morrer

Todos os dias antes de dormir lembro e esqueço como foi o dia
tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou
Sempre em frente
Deus pôs no coração do homem o anseio pela eternidade
Não temos tempo a perder
Não há nada melhor para o homem do que ser feliz e praticar o bem

Nosso suor sagrado é bem mais belo que esse sangue amargo
Que proveito tem o trabalhador naquilo com que se afadiga?
E tão sério
Todos vão para o mesmo lugar; todos procedem do pó e ao pó tornarão
E selvagem. Selvagem.
todos têm o mesmo fôlego de vida
Selvagem
e nenhuma vantagem tem o homem sobre os animais; porque tudo é vaidade

Veja o sol dessa manhã tão cinza
Tudo fez Deus formoso no seu devido tempo
A tempestade que chega é da cor dos teus olhos castanhos
Descobri também que debaixo do sol: no lugar da justiça havia impiedade
Então me abraça forte
Comer, beber e ser recompensado pelo seu trabalho é um presente de Deus
E diz mais uma vez que já estamos distantes de tudo
tempo de procurar e tempo de desistir

Temos nosso próprio tempo
tempo de chorar e tempo de rir
Não tenho medo do escuro mas deixe as luzes acesas agora
tempo de abraçar e tempo de se conter

O que foi escondido é o que se escondeu
tempo de procurar e tempo de desistir
E o que foi prometido ninguém prometeu
nada se pode acrescentar, e nada se pode tirar
Nem foi tempo perdido
Tudo o que Deus faz permanecerá para sempre

Somos tão jovens... tão jovens.
Deus fará renovar-se o que se passou
Tão jovens
Para tudo há uma ocasião certa.

Renato Russo & autor de Eclesiastes

segunda-feira, 29 de março de 2010

Rifa-se um coração...um simples coração humano.

Rifa-se um coração Rifa-se um coração quase novo.Um coração idealista.Um coração como poucos.Um coração à moda antiga.Um coração moleque que insiste em pregar peças no seu usuário.Rifa-se um coração que na realidade está um pouco usado, meio calejado, muito machucado e que teima em alimentar sonhos e, cultivar ilusões.Um pouco inconseqüente que nunca desiste de acreditar nas pessoas.Um leviano e precipitado coração que acha que Tim Maia estava certo quando escreveu..."...não quero dinheiro, eu quero amor sincero,é isso que eu espero...".Um idealista...Um verdadeiro sonhador...Rifa-se um coração que nunca aprende...Que não endurece, e mantém sempre viva a esperança de ser feliz, sendo simples e natural.Um coração insensato que comanda o racional sendo louco o suficiente para se apaixonar.Um furioso suicida que vive procurando relações e emoções verdadeiras.Rifa-se um coração que insiste em cometer sempre os mesmos erros.Esse coração que erra, briga, se expõe.Perde o juízo por completo em nome de causas e paixões.Sai do sério e, às vezes revê suas posições arrependido de palavras e gestos.Este coração tantas vezes incompreendido.Tantas vezes provocado.Tantas vezes impulsivo.Rifa-se este desequilibrado emocional que abre sorrisos tão largos que quase dá pra engolir as orelhas, mas que também arranca lágrimas e faz murchar o rosto.Um coração para ser alugado,ou mesmo utilizado por quem gosta de emoções fortes.Um órgão abestado indicado apenas para quem quer viver intensamente contra indicado para os que apenas pretendem passar pela vida matando o tempo,defendendo-se das emoções.Rifa-se um coração tão inocente que se mostra sem armaduras e deixa louco o seu usuário.Um coração que quando parar de bater ouvirá o seu usuário dizer para São Pedro na hora da prestação de contas:"O Senhor pode conferir. Eu fiz tudo certo,só errei quando coloquei sentimento.Só fiz bobagens e me dei mal quando ouvi este louco coração de criança que insiste em não endurecer e, se recusa a envelhecer" Rifa-se um coração, ou mesmo troca-se por outro que tenha um pouco mais de juízo.Um órgão mais fiel ao seu usuário.Um amigo do peito que não maltrate tanto o ser que o abriga.Um coração que não seja tão inconseqüente.Rifa-se um coração cego, surdo e mudo,mas que incomoda um bocado.Um verdadeiro caçador de aventuras que ainda não foi adotado, provavelmente, por se recusar a cultivar ares selvagens ou racionais,por não querer perder o estilo.Oferece-se um coração vadio,sem raça, sem pedigree.Um simples coração humano... Um impulsivo membro de comportamento até meio ultrapassado.Um modelo cheio de defeitos que,mesmo estando fora do mercado,faz questão de não se modernizar,mas vez por outra,constrange o corpo que o domina.Um velho coração que convence seu usuário a publicar seus segredos e a ter a petulância de se aventurar como poeta.
.
. (Clarice Lispector)
.

{...e quando as palavras se perdem, ou quando me sinto perdida recorro a Clarice. Algo como uma bússola,para direcionar essa falta.E não é má vontade, e sim,vontade de não errar, talvez, o cuidado com as palavras...rabisquei uns cinco post,tentando antecipar o dia, e acabei deletando todos. Pois notei que comigo não funciona assim. Não consigo programar, gosto de fazê-los no dia, ou poucas horas antes. É arriscado,às vezes dá certo e às vezes não, a mercê de emoções e sentimentos.E abdicar deste dia, seria jogar fora algo muito especial, e isso eu não faço. Então hoje eu vou de Clarice Lispector. O que pra mim não é pouco. Então, deguste à vontade...e adeus}

domingo, 28 de março de 2010

Vá ao Cinema

Sinto falta do barulho no cinema. Pronto, falei! E que todos saibam que cinema é experiência coletiva para ser compartilhada com a pessoa ao lado. E isso inclui risadas espontâneas, cochichos e comentários, disputas pelo encosto de braço e chutes na cadeira da frente.

E que, ao contrário do que o Cinemark diz, você pode, sim, deixar pipoca cair no chão. E se um celular ou outro tocar uma vez, ou outra, tudo bem, faz parte. Pra gente lembrar, desligar, e perceber que estamos diante de um portal pra um mundo paralelo bem nosso, uma experiência cinematográfica explorada em som e imagem para que você se desligue do planeta azul e preste atenção do que está ali, na tela. Verdade ou não, esse é seu mundo por 90 ou mais minutos, caso você esteja assistindo algum filme do Peter Jackson.

Quem quer silêncio daqueles absolutos de se ouvir a respiração que espere e alugue ou DVD ou vá ao The Pirate Bay.org e resolva sua vida. Sou fã de cinema, sou fã de filmes e fã DO cinema. Da sala, dos bancos, das cabeças mais altas que sentam à minha frente e me impedem de ver algumas cenas. E filme foi feito pra ver assim, aos montes, em grupos, em bandos.

Cinema é arte. Seja a sétima ou que número for, deve ser apreciada como tal. Seu veículo principal não é a cópia pessoal, o DVD, o *.mpg, mas a telinha, ver se os outros estão rindo. Ouvir alguém soluçar de choro, do outro lado da sala. Os bancos balançando de casais se pegando no fundo, lá no escurinho.

Não há registro de arte tão cara e elitista. Mesmo independente, fazer filme custa muito dinheiro. Não há sentido em fazer isso para poucos. Fazer um filme cabeça para dois ou três seria criar uma cultura que valoriza as bundas dos assentos mais caros do pedaço. Vamos popularizar o cinema. Menos glamour e mais arte. Menos papo-cabeça e mais bundinhas nos assentos, por favor. Vamos qualificar nossas poupanças. Em vez de dar pão e circo, sugiro pipocas!

Aqui, o que vale mesmo é inovar, ir além, conhecer as regras do jogo e mudá-las. Brincar com o visual. Sentir o 5.1 Dolby Surround estourar os seus tímpanos. Assistir a David Lynch e não dormir. Ver Woody Allen e não bocejar. Spielberg e sua máquina de sonhos, Spike Lee e seu engajamento ever-present, a competência de Clint Eastwood e a medriocridade de Ron Howard. Isso é cinema. Isso é gostar de cinema. Veja filmes. Vá ao cinema.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Noite ordinária

O quente dos corpos recém desentrelaçados ainda se pronunciava no ar. Apenas no ar, porque nas veias dele o líquido gelado. Esfriara quase na hora quando ela, mais uma vez, interrompeu-lhe o vigoroso impulso masculino. Ele mal entendera, na verdade mal ouvira suas explicações infantis, femininas. Explicativas. Ele entendia era a linguagem do corpo. Reconheceria melhor uma mulher tocando-lhe o interior, de olhos fechados, ou sentindo-lhe o cheiro das axilas, do que lhe observando uma foto três por quatro.

“É a última vez. A última”, prometeu a si mesmo. Virou-se de costas para ela e fingiu adormecer. Enquanto repetia a promessa em silêncio, como num mantra, mantinha impaciente um ouvido atento à respiração dela – que não tardou a se tornar pesada. Dormia, tranqüila. Certa de que na manhã seguinte teria novamente a graça de sua paciência.

- Desta vez, não. Ah, não – pensou, quase alto.

Levantou-se bem devagar, como se equilibrasse uma bandeja cheia de taças. Levou minutos. Ainda assim, despertou-a. Inventou uma desculpa qualquer sobre ir ao banheiro. Nem precisou explicar o que faria com um cobertor e um travesseiro em tão desconfortável aposento, pois ela logo voltava ao sono dos justos. Buscou na sala o notebook e, envolto no cobertor, começou a dedilhar a confissão sobre a noite de fome.

Feeling good


Como um beijo doce e delicado, você entrou lentamente cheirosa pelo salão.

Não aceitaria bebida, não dançaria uma única música, não deixaria que tocassem em suas delicadas mãos enluvadas.

As ondas do seu cabelo demonstravam a destreza dos dedos e revelava a fragilidade de uma mulher vaidosa.

(A vaidade sempre entrega as mulheres. E eu sabia disso.)

Você atravessou o bar segurando a bolsa cor de prata que chamava atenção pelo intenso brilho e isso revelava a sua necessidade de atenção.

(Brilho demais sempre entrega as mulheres. Mas disso todos sabem.)

Talvez não aceitasse um drink de qualquer panaca que estivesse babando na barra de seu vestido vermelho, grudado com a língua no chão, lambendo o teu sapato.

Mas eu não sou esse tipo de panaca.

Sou do tipo que todas acreditam ser a pior espécie de marido.

E esse tipo conheço bem.

Atrai mulheres e as deixa apaixonadas com um só beijo.

Naquela noite eu te beijei achando ser o maior sacana do mundo.

Naquela noite meu coração foi sacaneado.

terça-feira, 23 de março de 2010

Desafio

Estou lendo o Pergaminho número um, do livro "O maior vendedor do mundo", do Og Mandino, e quero compartilhá-lo.
Convido à leitura, todos os dias, conforme é pedido: de manhã e após o almoço em silêncio, à noite, em voz alta.
Você nem precisa passar para 10 pessoas. Quem não quiser ler não vai ficar sem beijar por um ano, nem vai morrer num trágico acidente, nem vai acordar numa banheira com gelo e sem um rim.
Fico no aguardo dos comentários de quem decidir ler. Eu acredito em mágica, e você?

"Hoje começo uma nova vida. Hoje mudo minha pele velha que sofreu, por muito tempo, as machucaduras do fracasso e os ferimentos da mediocridade. Hoje renasço e meu berço é uma vinha onde há frutas para todos. Hoje colherei uvas de sabedoria da mais cheia e produtiva videira da vinha, pois elas foram plantadas pelos mais sábios de minha profissão que me antecederam, geração após geração. Hoje provarei o sabor das uvas destas videiras e, em verdade, engolirei a semente do êxito incrustada em cada uva para que uma nova vida possa germinar dentro de mim. A carreira que escolhi é plena de oportunidades, embora repleta de desgostos e desapontamentos e, se os corpos daqueles que fracassaram fossem empilhados um em cima do outro, lançariam sua sombra sobre todas as pirâmides da Terra. Contudo, eu não fracassarei como os outros, pois em minhas mãos tenho agora o roteiro que me guiará por águas perigosas às praias que, ontem mesmo, pareceriam apenas um sonho. O fracasso não será mais pagamento pelo meu esforço. Assim como a Natureza não preparou meu corpo para tolerar a dor, também não determinou que minha vida sofra o fracasso. O fracasso, como a dor, é elemento estranho a minha vida. No passado eu o aceitei, como aceitei a dor. Agora eu rejeito a ambos e estou preparado para a sabedoria e os princípios que me guiarão das sombras para a luz da riqueza, posição e felicidade, bem além dos meus sonhos mais extravagantes, quando até mesmo as maçãs douradas do Jardim das Hespérides me parecerão justa recompensa. O tempo ensina tudo para quem vive eternamente, mas não tenho o luxo da eternidade. Contudo, dentro do tempo que me foi concedido, devo praticar a paciência, pois a Natureza jamais age apressadamente. Para criar a oliveira, rainha de todas as árvores, cem anos são necessários. Em nove semanas a cebola já está velha. Eu tenho vivido como uma cebola. Isto não me agrada. Agora, desejo tornar-me a maior das oliveiras e, em verdade, o maior dos vendedores. E como se realizará isto? Pois não tenho nem o conhecimento nem a experiência para alcançar grandeza e já tropeço na ignorância e caio nas águas da lamúria. A resposta é simples. Começarei minha jornada desembaraçado do peso de conhecimentos desnecessários e de obstáculos da experiência sobre trabalhos sem resultados. A Natureza sempre me forneceu conhecimento e instinto maior do que a qualquer animal da floresta, superior até mesmo ao valor da experiência em geral superestimado por velhos que parecem sábios, mas falam tolices, Em verdade, a experiência ensina a fundo, porém seu curso de instrução devora os anos dos homens e dessa maneira o valor das lições diminui com o tempo necessário para adquirir-se sua sabedoria especial. Seu objetivo desperdiça-se com a morte dos homens. Ademais, a experiência é comparável à moda; uma ação que resulta em êxito hoje poderá ser inaproveitável e impraticável amanhã. Apenas princípios permanecem e estes eu agora tenho em meu poder, pois as leis que me levarão à grandeza estão contidas nas palavras dos pergaminhos. O que eles ensinarão será mais evitar o fracasso do que obter êxito, pois o que é o êxito senão um estado de espírito? Dois, entre mil sábios, se tanto, definirão o êxito nas mesmas palavras,enquanto o fracasso é sempre descrito de apenas um modo. O fracasso é a incapacidade do homem em atingir seus objetivos na vida, sejam eles quais forem. Na verdade, a única diferença entre aqueles que falharam e aqueles que tiveram sucesso está na diferença de seus hábitos. Bons hábitos são a chave do sucesso. Maus hábitos são a porta aberta para o fracasso. Assim, a primeira lei que obedecerei é: formarei bons hábitos e me tornarei escravo deles. Quando criança, fui escravo de meus impulsos; agora sou escravo de meus hábitos, como todos os adultos. Abri mão de minha vontade própria, cedendo aos anos de hábitos acumulados e os últimos feitos de minha vida já parecem estar marcados por um destino que ameaça aprisionar meu futuro. Minhas ações são ditadas pelo apetite, paixão, preconceito, avidez, amor, medo, ambiente, hábito, e o pior de todos estes tiranos é o hábito. Se, portanto, devo ser escravo do hábito, que seja um escravo de bons hábitos. Meus maus hábitos devem ser destruídos e novos sulcos preparados para boas sementes. Eu formarei bons hábitos e me tornarei escravo deles. E como realizarei esse difícil feito? Através destes pergaminhos, pois cada um deles contém um princípio que expulsará o mau hábito de minha vida e nela recolocará outro que me conduzirá para mais perto do sucesso. Pois é outra das leis naturais que apenas um hábito pode dominar outro hábito. Assim, para que estas palavras escritas realizem a tarefa escolhida, devo disciplinar-me ao seguinte, que é o primeiro de meus hábitos: Eu lerei cada pergaminho por trinta dias seguidos, da maneira recomendada, antes de passar ao pergaminho seguinte. Primeiro, lerei as palavras em silêncio, ao acordar. Depois, lerei em silêncio, após almoçar. Finalmente, lerei de novo, antes de retirarme para o leito e, mais importante, nesta ocasião lerei em voz alta. No dia seguinte, repetirei o processo e continuarei dessa maneira por trinta dias. Tomarei, então, o pergaminho seguinte e repetirei esse processo por outros trinta dias. Continuarei assim até viver com cada pergaminho por trinta dias, e minha leitura se torne um hábito. E o que será conquistado com esse hábito? Aqui está o segredo oculto das conquistas humanas. Com a repetição das palavras diariamente, elas logo se tornarão parte de minha mente ativa, porém, mais importante, também se infiltrarão em minha outra mente, essa misteriosa fonte que nunca dorme, que cria meus sonhos e freqüentemente me faz agir de maneiras que mal percebo. Assim que as palavras destes pergaminhos forem assimiladas pela minha mente misteriosa, eu começarei a despertar, cada manhã, com uma vitalidade que jamais conheci antes. Meu vigor aumentará, meu entusiasmo se levantará, meu desejo de encontrar o mundo ultrapassará qualquer medo que um dia conheci ao nascer do sol e serei mais feliz do que jamais acreditei ser possível neste mundo de luta e tristeza. Finalmente, encontrar-me-ei reagindo em todas as situações que confrontar, como foi recomendado nos pergaminhos, e, logo, essas ações e reações se tornarão fáceis de executar, pois cada ato, com a prática, torna-se fácil. Assim, nasce um novo e bom hábito, pois, quando um hábito se torna fácil, através de constante repetição, é um prazer executá-lo e, se é um prazer executá-lo, é da natureza do homem executá-lo freqüentemente. Quando eu o executo freqüentemente, ele se torna um hábito e eu me torno seu escravo; e desde que seja um bom hábito é a minha vontade. Hoje começo uma nova vida. E juro solenemente a mim mesmo que nada retardará o crescimento de minha nova vida. Não perderei um dia sequer destas leituras, pois este dia não pode ser recuperado nem posso substitui-lo por outro. Não devo, não quero quebrar o hábito de ler diariamente estes pergaminhos e, em verdade, os poucos momentos passados cada dia com este hábito são apenas um pequeno preço a pagar pela felicidade e êxito que serão meus. Ao ler e reler as palavras dos pergaminhos, nunca permitirei que a brevidade ou a simplicidade de suas palavras me faça encarar a mensagem como se fosse superficial. Milhares de uvas são amassadas para encher uma jarra de vinho, e a casca da uva e sua polpa ainda são bicadas pelos pássaros. Assim é com estas uvas de sabedoria das gerações. Muito tem sido filtrado e abalado pelo vento. Apenas a verdade pura permanece destilada nas palavras, para ser lembrada. Beberei segundo as instruções e não perderei uma só gota. E absorverei a semente do êxito. Hoje minha pele velha se assemelha a poeira. Andarei a prumo entre os homens e eles não me reconhecerão, pois hoje sou um novo homem, com uma vida nova."

segunda-feira, 22 de março de 2010

versos bobos de uma menina com os olhos vermelhos.

esse é um post dedicado a todos que um dia acordaram, mas não conseguiram abrir os olhos: estavam com conjuntivite.

que seus olhos não fiquem inchados,
que sua cabeça não doa.
que em breve você fique normal,
caso sua conjuntivite não seja viral.

que a ardência logo passe,
que sua vista desembace.
que você receba uma boa mensagem:
você não precisa fazer raspagem!

que os dias de repouso sejam alegres,
e que as noites sejam breves.
que o oftalmologista seja um bom profissional,
e que em duas semanas você fique legal.

"nem que eu tivesse fumado toda maconha do mundo eu estaria com o olho tão vermelho assim."

domingo, 21 de março de 2010

Entre quatro paredes


O marido chama a mulher para o aposento:

- Vamu logo qui hoji é dia da gente "nhanhá", minha gordinha tesuda!

- Ihihihih! Pshhh... Ó, as criança podi iscuitá!

- Cala boca e vem logo aqui sua assanhada!

Depois de uns cinco minutos trancados no quarto, os murmuros e risinhos contidos davam lugar aos sons de gritos e gemidos de prazer. O escândalo era tão grande que os dois filhos do casal comentavam entre si com o caçula tapando os ouvidos:

- O pai e a mãe tão briganu di novo?

- Não, tão juntando suas carnes numa coisa só!

- Quê qui cê falô, Sara?

- Cê é muito novo pra sabê desses troço dos adulto, Juãozinhu! Vamu drumi.

Mas Joãozinho não conseguia pregar o olho antes dos pais terminarem com a algazarra semanal. A paz na casa só reinava depois que ele escutava a porta do banheiro bater e o chuveiro ser aberto: “- Mania de tomar banho tarde da noite, credu!” Não sabia quem ia primeiro, se o pai ou a mãe, mas ele sempre ouvia um tomar banho seguido do outro.

Dia seguinte a matriarca notou que o menino estava amuado. Bem aquietado no seu canto, no que ela lhe perguntou:

- Quéquifoi, mulequi? Por que é que cê tá com essa cara di bosta? Nem tomou sua mamadeira!

- Mainha, xô lhi perguntá uma coisa que tá isquentanu minha caixola?

- Pois pergunte qui eu detesto vê criança cum cara feia!

- O quiéqui ocê e painho fizeram ontem de noite trancados lá no quarto? É verdade que ocêis juntam suas carnes numa só?

- Valei-me, meu Jesus Cristo, qui eu tô crianu um disajustadu ni minha pópria casa!

Antes de saírem apressados, a mulher indignada esfregou a boca do menino com sabão de coco, não sem antes puxar-lhe pelas orelhas. Feito o serviço de limpeza corporal, Berenice levou Joãozinho para o padre de sua igreja lavar-lhe a alma. Ele só podia estar com o capeta. Só podia ser!


sábado, 20 de março de 2010

Ensaio para a velhice

Estou vendo o tempo passar e não sei o que isso quer dizer.

Vejo o contraste da virilidade presente em meu pai nos retratos antigos com os cabelos grisalhos da realidade que se põe a minha frente.

Quando pequeno, prometi para mim mesmo que, mesmo na inevitável ruptura com a idade tenra, conservaria em mim a vitalidade pura e sincera das crianças, unida a insaciável sede de viver pelas coisas boas e simples, sempre.

Hoje, aos 30, me afundei na ilusão de que estava perdendo o controle da situação. “A Crise” veio diante do espelho, que me insultava com sua franqueza ao expor que nada é eterno.

Essência? sabedoria? experiência? O que nos faz maduros? Os anos que se passam? A seriedade para o ato de trabalhar/viver/trabalhar? Esquecer a vida, esquecer o passado.

Não pai, não é por esse caminho que vou. Não quero chegar ao fim da vida com tristeza nos olhos, mas também não quero decepcionar aqueles que depositam em mim a esperança de que um dia crescerei.

Fiz minha escolha, num pacote completo com todos os erros e acertos, toda a dor e prazer, toda facilidade e dificuldade. Nem pior nem melhor, apenas um caminho.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Dezenove

Um dos meus pontos fracos na escola sempre foi Redação. Não chegava a tirar notas baixas, mas raramente passava de 8,0 (o que, para uma pequena CDF, era motivo de grande tristeza). Por outro lado, sempre recebia elogios de parentes e amigos pelas loucuras que escrevia no falecido blog e era até famosa pelos quadrinhos de fundo de caderno.

É bobagem, eu sei, mas até hoje quando percebo que um texto meu agrada, ou recebo convites lisonjeiros como esse para postar em blogs coletivos, lembro dos professores e corretores que tanto me desencorajaram.

Nada não. Eles não eram o meu público.









(...espero que vocês sejam...)

quinta-feira, 18 de março de 2010

Quem é o senhor do Bonfim?

Wikipedicamente falando, Jesus Cristo venerado em sua morte.
Padroeiro do coração dos baianos, e também, cidade baiana.
Pouco importa, cuidando de mim.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Para Alice, com carinho

Tentei tirar a cara de homenagem clichê, embora desconheça alguma que não seja, ainda mais no dia do aniversário do homenageado. Tentei não imprimir certo ar de nostalgia, apesar de o tempo ter passado. Tentei colocar aqui um pouco mais de você, que também é um pouco de mim...

Uma vez, tivemos a ideia de nos ocupar de apenas cinco linhas para contar das nossas vidas distantes, divididas apenas por alguns minutos de conversas instantâneas. Nada melhor para combinar com isso que a objetividade de linhas concisas, abordando apenas os temas principais: “fico com ele de vez em quando, mas sei lá”, “estou gorda, voltei para a academia”. Mas a complexidade do cotidiano foi aumentando e, da mesma forma, surgiu a necessidade de ampliar a estratégia para cinco tópicos, nos quais cada um por si só valiam cinco linhas.
Serei um tanto clichê se disser que precisarei não de cinco linhas, mas de cinco mil toques para expressar tudo o que você significa pra mim? Não o farei, até porque essa melação não combina contigo. Às vezes rola uns ataques e você solta o “eu te amo”, mas, na sua essência, você é aquela mesmo que larga um “ordinária, vai ficar nessa palhaçada até quando?”
É difícil explicar para os outros, de antemão, quem é você. Tento ‘desbocada’, ‘engraçada’, ‘hilária’, mas acabo sempre no ‘espera, você vai ver’. Aí, quando você começa a contar a história do movimento punk ou de pegar ônibus carregada de tupperware, meu interlocutor deve concluir que a falta de definição é perfeitamente plausível. É difícil explicar alguém que te faz rir até doer a barriga, debocha na sua cara até o último segundo, mas aí, quando lembra que você viveu um episódio de depressão, arrepende-se até o último fio de cabelo em questões de segundos.
Ou alguém que jamais irá esquecer que você a deixou caída passando mal e continuou a dormir, fazendo questão que o fato pese na sua consciência até o Apocalipse. Alguém que carrega, como eu, um inconformismo gritante, tão indefinível que foi denominado, em comum acordo, de ‘a coisa que cutuca’. Alguém que quer, como eu, um mundo de pessoas e lugares.
Um dia alguém te definiu como eu queria ter feito. Disse que você era uma estrela. Não lembro as justificativas. Se pelo fato de você brilhar, sempre. Ou pelo fato de você conseguir estar sempre presente, distante, mas presente. Talvez, concluo eu, estrela signifique que, de uma forma ou de outra, você sempre acaba nos guiando.

Eu te amo, Lis. Ordinária.

terça-feira, 16 de março de 2010

mito

"Entre a verdade e o mito, fique com o mito".

 Acreditar no mito é embelezar a vida. É a cor, movimento, dança, é o molho barbecue no McNuggets. A realidade pálida nos obriga a mitificar, a sonhar e acreditar nessa realidade que não existe.


Gosto do mito da nossa possível convivência sem degradação do meio ambiente. Do mito da seleção de 82. Daquilo grosso, possivelmente fora de linha, que preenche bem a sua garagem. Que o Google é o grande Big Brother. Que o governo estadunense intercepta tudo que é relacionado a bomb in a big apple.


Que o cinema brasileiro agora vai. Que o Simonal foi dedo duro. De que Cobain foi assassinado. De que morena de olhos verdes do cursinho pagava pau pra mim.

segunda-feira, 15 de março de 2010

aprendizagem

.


o livro
me ensina
espera:

palavra
na página
muda

na mão
que alimenta
o olho...


lento leitor
não deduz

que ensina
ao livro
alívio

quando dá
suas letras
à luz.


.

domingo, 14 de março de 2010

Hábito

Ele saiu do banheiro, entrou no quarto e encontrou-a deitada no lado esquerdo da cama, já completamente levada pelos sonhos que sonhava dentro da cabeça que estava apoiada no travesseiro. Mas não foi o fato de já estar dormindo que o espantou - havia mesmo demorado no banheiro, entretido com uma reportagem na revista - e sim o fato de ela estar no lado esquerdo da cama.

Dezessete anos. A vida é curta demais para as coisas que deixamos de fazer, longa demais pra aguentar a rotina diária. Dezessete anos não foram nada para o rapaz que não vê a hora de poder dirigir, terminar a escola, comprar cigarro, frequentar um lupanar, ser dispensado do serviço militar. Dezessete anos num mesmo emprego podem ser uma eternidade entediante. Em dezessete anos de casamento, não há nada que não se saiba um do outro - quanto tempo leva pra tomar banho, qual a hora preferida do dia para usar o banheiro, a localização exata de cada mancha na pele, doenças, alergias, vergonhas da infância, a cara que faz quando se preocupa à toa com os filhos, a quantidade exata de sal necessária na pipoca e o lado da cama que dorme.

Alguém já disse (muita gente já deve ter dito, provavelmente) que as pessoas não mudam de hábitos com a mesma facilidade que mudam a cor do cabelo. Por que ela mudou de lado na cama depois de dezessete anos de casamento? Não que os dois tenham jamais combinado qualquer coisa a esse respeito, mas sempre foi assim. E ninguém enjoa de uma coisa depois de dezessete anos, enjoa depois de dezessete dias, dezessete semanas, talvez. Ele não pensou em acordá-la só para perguntar o motivo. Talvez ela estivesse com dor no braço direito. Mas se estivesse, por que não disse? Perguntaria o motivo pela manhã e o problema estava resolvido. Pronto, agora era só dormir e esperar o café da manhã. Alguém já disse que as pessoas não mudam de hábitos com a mesma facilidade que mudam sua opinião sobre o seu filme favorito de todos os tempos.

Meu deus, eu já achei que Tubarão era o melhor filme do mundo! Fui ver Blade Runner quatro vezes no cinema! Agora não sei se prefiro O Poderoso Chefão ou A Lista de Schindler. Acho que tô ficando velho, só gosto de filme de velho. E como é que ela pode achar que Beleza Americana é um ótimo filme?
Tudo isso ele pensava por que não conseguia dormir do lado direito da cama - se virava pro lado direito, não conseguia achar um jeito confortável de deixar o braço direito, se virava pro lado esquerdo, não conseguia respirar direito por causa do cabelo dela muito perto do seu rosto. Levantou e foi fazer um chá.

Ele gostava mais de chá preto, mas a cafeína não ia ajudar em nada a essa hora da madrugada. Fez chá de camomila, que era o preferido dela. Ficou pensando se não havia alguma outra coisa que ela tinha mudado e ele não tinha percebido. Será que essa mudança era um sinal de que ela estava mudando ou queria mudar? Talvez fosse o primeiro sinal de muitos. E em alguns meses, ela o acusaria de ser sempre o mesmo, de nunca fazer nada diferente, de ser o tédio, o velho representando a tradição estúpida, um reacionário. Ele a acusaria de ter outro, de ter vários, de ser promíscua, inconstante, imatura, querendo ser jovem e inconsequente depois de velha. Seria um fim triste para um casamento que se não foi belo, foi pelo menos normal. O chá já tinha esfriado mais que o pé dele. Despejou o chá na pia e decidiu esquentar o pé no lado direito da cama, pois já passava das duas horas.

No quarto, ela tinha voltado para o lado direito.

sábado, 13 de março de 2010

Dia 13 postei aqui

No blog das 30 pessoas:


[A gafe já foi cometida, como é 13 e o espaço é meu, fica. Outra razão são os comentários, como apagá-los? Fica tudo. E justifico: queimando com uma febre de 40 graus, como se o inferno estivesse dentro de mim. Três injeções depois e, só agora, à noitinha, vejo o fora. O fora fica. Tudo é a vida, com seus tantos erros e acertos. Beijos a todos.] 

Do amor ou Para os que nunca dizem eu te amo

Sei que o amor exige palavras fáceis, para soar sincero, como velhos boleros, guarânias, calipsos e baladas. Não sou desses. Não rimo flor com amor, coração com paixão, nem me empenho demais, também, em rimas ricas. Escrevo o amor com a palavra sargaço, intuindo um azul que pode ser mar e céu e viração de seu olhar. Digo, apolíneo, como quem alinha o sol tendo à vista a extensão da sombra. Contorno o amor sem brusquidão, roço-o, não toco, sem desespero. Meu amor não "desfalece", ele tomba, precipitado na palavra abissal. Porque o meu amor exige sempre o melhor de mim, que a minha língua adivinhe o melaço, bagaço de cana, mel e melissa. Que a palavra escrita exprima exímia, sua delícia. Falar de amor sem paixão? Sem a ilusão da eternidade? Amor sem coronárias, pontes de safenas que não vão dar na aorta?

Mais que palavra, o meu amor é carne, e amo mais o gosto deste encontro de corpos, do não-silêncio dos lábios em busca, as artimanhas das mãos mudas, o braille cheio de manha em curvas, a virtuose dos instrumentos que dedilham finos mamilos salientes. Meu amor é todo dança, música e alguma luta desesperada. É brega, franco-atirador de setas, coração partido, bobo de paixão, coitado; e mundo-cão.

E eu queria tanto trocar o “sabe" que eu te amo pelo “eu te amo” sem sabedoria, na mesma entrega desses náufragos que só vêem pela frente o mar.

quinta-feira, 11 de março de 2010

Um Filme Sem Sexo

Eu já postei este filme uma vez, aqui. Ele foi roubado daqui. E daí que anteanteontem, segunda-feira, dia oito de março, eu achei ele de novo, aqui mesmo. Eu, que sempre achei esse negócio de dia internacional da mulher uma bobagem. Nem por feminismo, nem por machismo. Mas uma grande bobagem. Tem que ter dia pra tudo? Não pode ser todo dia? Sempre? Ou dia nenhum, nunca, sei lá.

Mais uma vez não resisti. É bem como disse a Cris Guerra, não é demais repetir:

Feliz Dia Internacional da Pessoa (atrasado).

terça-feira, 9 de março de 2010

Amor de radiador

Descobri hoje que a cor da pele e o roxo produzem um degradê fascinante nos nós dos meus dedos da mão. Basta que eu esqueça as luvas em casa.

Não, não foi assim que começou a história. Eu as deixei em casa propositalmente. Trata-se do par "oficial" de luvas de lã cinza, de mangas compridas que chegavam até o cotovelo e furos para que os dedos ficassem unidos*. Comprei-as ano passado e resolviam minha obsessão tola por blusas e jaquetas que não alcançavam meus pulsos.

Mas hoje decidi deixá-las em casa, e apenas cogitei levar o par de luvas do camelô**, mais fáceis de manusear.

Fui confiante na minha posição de veterana. Levava o segundo inverno na flauta, em comparação com o primeiro. Há poucos dias me dei conta de que já era março, estava na rua sem gorro e sem luvas e não tiritava.

Ignorei que isso havia sido há poucos dias, quando os graus Celsius estavam por aqui em dúzia, e hoje metade deles havia sido levado pelo vento para longe da Calle Barcelona, onde fui para tirar fotos da intervenção feminista da rua dos imigrantes. O segundo destino só se podia alcançar a pé. E só lá parei para ver as minhas mão. Os dedos, Roxo 5 graus. Contraste com o esmalte Vermelho 40 graus.

Claro que, como veterana, também havia abolido o combinando calça-dupla. Nada como meia hora no ponto de ônibus para que os joelhos comecem a dançar por conta própria.

O corpo agüentou como pôde. Cheguei em casa faminta e só mesmo o radiador para derreter o gelo do lado de fora. Pensei em várias metáforas para explicar o gelo do lado de dentro e criar um post digno desse blog. Mas do lado de dentro a temperatura está confortável, o clima está ameno, a vida vai bem.



*Aprendi no Canadá que o calor do próprio corpo é mais eficaz que o de membros envoltos só em lã, e por isso as luvas que deixam os dedos juntos esquentam mais.
**Aprendi no Canadá que lá elas são inúteis.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Meu primeiro celular

Semana passada comprei meu primeiro celular. Na verdade foi o terceiro, porque o primeiro meu pai me deu quando eu tinha uns 18 anos. E eu chorei.
Eu odiava celular. Eu odeio celular. Ganhar um aparelho era uma ofensa, então devolvi, recusei, sem apertar um botão sequer.
O segundo foi quando casei, não tinha telefone fixo e meu pai me deu pra usar como se fosse telefone de casa. Era um tijolão usado, que a bateria não durava nada. Novamente devolvi, recusei, sem apertar um botão sequer.
Agora eu comprei um, o primeiro de verdade. Vou passar mais de hora por dia em ônibus, ruas, sozinha, e realmente vou precisar.

Sinto falta dos cartões, das fichas, local e ddd, em longas carreiras de papel.De ligações para o pai buscar, de ficar ouvindo o papo alheio na fila, dos trotes a cobras para a Bahia.
Odeio celular, vejo mais pessoas nas ruas com celular do quê com cigarros.
Um dia fui comer no Mcdonalds (o que pra mim é um passeio capitalista e gostoso) e um cara solitário teve uma longa e alta conversa no celular enquanto comia. Achei uma puta falta de respeito com seu bigmac.

Não adianta, pra mim a pessoa está falando sozinha, rindo sozinha, brigando sozinha, gritando no meio da rua sozinha. E se não tiver falando com ninguém? E se estiver mesmo falando sozinha? Se for uma louca?
Uma vez um cara chapado, bêbado talvez, andava numa rua perto da minha casa, tinha uma conversa bem gesticulada na calçada, ele conversava com um 2, um 2 pixado no muro perto da firma.
Celular pra mim é um 2, um 2 pixado no muro.

domingo, 7 de março de 2010

dois corpos esticados na calçada da grande avenida.

a declaração de amor entre
os passos, as conversas, as risadas abafadas
se perdia dentro deles. era eles.

dois corpos esticados na calçada da grande avenida.

essa é a minha primeira lembrança viva de amor
além de mim.

sábado, 6 de março de 2010

Neblinas, Sombras e Vermouth

Ao som de ">


O poeta está mudo, perdeu o lápis,
Sem saber o que fazer decide por não ter decisão alguma
E passeia pelas ruas.
Não há ninguém nas ruas,
Somente sombras e neblinas.
A sensação de o próprio passo parecer ser o de uma multidão,
Não parecia estar tão frio antes.
Uma sombra ele reconhece,
Que nunca abandonou nem se fez abandonar,
Uma garrafa de Vermute.
A paixão não veio pelo gosto,
Pelo nome, Vermute,
Ainda mais se escrito com a grafia, Vermouth,
Nada mais agradável poderia sair daquela neblina ,
Da garrafa não saí nenhuma bebida,
Tem música,
e entorpece.
O poeta volta para casa,
Chegou não sabe como, chamou de acaso.
O poeta pensou ter achado
Mas era só sombra
E neblina


Vlado Galli

quinta-feira, 4 de março de 2010

É bom pra pele. Paga mal, mas pega bem

Eu tinha duas alternativas: me mandar ou fingir que não me importava. Só que a logística de ir embora trazia implicações práticas que estavam fora do meu alcance (largar o trabalho, mudar de casa...). Optei por fazer o simples.

Mas quem disse que seria simples? Quem disse que seria simples não escolher os números do seu celular gravados na memória do meu? Quem disse que seria simples escrever alguma coisa que não fosse um aviãozinho de papel atirado contra o seu coração? Sua cabeça, minha pista de pouso no ar.

Sim, não é tão palpável como trocar de endereço ou tentar a sorte como garçom em um pub londrino, mas mudar o que se sente de lugar também deixa suas tatuagens na casca dura - âncora enferrujada fincada em nuvens de faz de conta.

Quem disse que seria simples? Ao contrário, é como transportar cristais na corcova de um camelo embriagado. Alguma coisa sempre acaba quebrando. E depois de quebrado, não tem saliva, farinha ou Super Bonder que restaure o quadro todo.

Quem sabe, descalça e distraída, você ainda não corta o pé num desses cacos de tristeza que espalho pelo chão? Seu sangue azul pintaria avisos de contramão pela avenida. “Acidentes acontecem”, você dizia (ou imaginava?).

Quem disse que seria simples fingir cegueira diante de tubos de pasta de dente, cremes, xampus, lingeries, óculos escuros e páginas grifadas de um romance inacabado. Aliás, fui a única coisa que você começou e terminou, literalmente.

No meu lugar, você faria o quê? Fogueira com as tranqueiras românticas que empilhei na sua escrivaninha? Queimaria uma floresta inteira com meus poemas chulos e escreveria com fumaça preta um pedido de socorro? E quem te salvaria?

Os heróis estão de férias.

Quem disse que seria simples seguir em frente? Sou um coelho de quermesse trincando de desejo - e entrando na casa errada mais uma vez. A gente poderia simplesmente ficar parado, não podia?

E olha que eu sempre tive duas alternativas: me mandar ou fingir que não me importava.

Só que me mandar tinha lá os seus prazeres. A ilusão de começar de novo em outra praia, com outra identidade e um novo corte de cabelo. É... A ideia era boa, mas optei por fazer o simples. Ficar.

(Fake no Twitter; fake no Orkut; fake no Facebook; fake na frente do espelho do banheiro; fake no fake que carrego comigo nos dias úteis e feriados prolongados. Lembre-se de nunca mais acreditar em mim, tá?)

Quem disse que seria simples? Foi preciso inventar atividades lúdicas para não pensar na sua cara de desconforto ao me ver atravessar a rua. Talvez me quisesse atropelado, talvez me quisesse do outro lado do mundo. Me queria chinês, Inês?

Agora, quem disse que seria simples? Quem foi o filho do cão que, na boa intenção de consolar um amigo, emplacou essa cascata? Não, nunca seria simples.

Não com você. Não pra mim.

Quem disse que seria simples? Uma matemática para iniciantes, divisão de números pares, dois pra cada lado e pronto. Vou multiplicando sua conta, caderneta cheia de pendências. Saldos, dívidas e empréstimos. A única coisa simples é calcular quem saiu perdendo. Noves fora, sempre eu.

Portanto, não facilite as coisas pra mim. Não queria jogar o bote salva-vidas depois que a água já baixou. Não me ofereça nada que eu deseje muito, mantenha-me fora do seu esquadro - como num velho bolero, “risque meu nome do seu caderno”. Quem disse que seria simples? Sofra um pouquinho. Só um pouquinho. Humaniza. É bom pra pele. Paga mal, mas pega bem. Não pode ser sempre tão fácil, meu amor.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Um filho

Eu sempre quis ter um filho, ou um punhado deles, e isso sempre me pareceu algo certo na vida. Quando minhas amigas falavam que não queriam, que não teriam por nada no mundo, eu achava que elas estavam blefando.
Já agora que estou mais velha as coisas não me parecem mais tão simples assim. Eu? Mãe? Eu mal sei passar uma roupa, meu café é doce demais e meu ovo frito sempre gruda no fundo da panela. Como vou cuidar de alguém?
Fora as probabilidades de tudo dar errado. Traço listas mentais de prós e contras. Bebês são bonitinho, mas e se o meu não for? E se e ele for esquisito? Tá, isso é superficial, eu sei. Mas e se ele for um drogado que vai vender toda a minha mobília em troca de pedras de crack? Um assassino, um serial killer, matando e esquartejando por ai. Culpariam quem? A natureza falha? A anatomia cerebral? A sociedade opressora? Não, eu seria a culpada. A mãe. Ausente, violenta, ou sei lá o que. Não importa se levava café da manhã na cama, se comprava brinquedos bacanas, o título mãe bastaria pra me transformar em culpada e ponto final.
E o problema é que eu não poderia simplesmente mandar ele voltar pro lugar de onde veio. E tirando filhos, o que mais na vida é pra sempre? Casamento não mais e tatuagem também não. Ok, ainda temos AIDS, herpes e outras doenças, mas essas coisas a gente não escolhe, então não vale.
Sim, ele pode ser um bebê amável, é verdade. Risonho, de bochechas rosadas, mas que foi parar no jornal nacional por ter sido abandonado no balcão de uma loja de departamento. Claro que é possível! Eu esqueço meu celular, minha chave, minha carteira,minha blusa, tudo, e se eu esquecer meu bebê? Já imaginou? Eu seria presa, abandono de incapaz. O delegado não acreditaria na minha justificativa. “Defict de atenção? O caramba! Joga essa ai na cela 12”. E lá estaria eu, separada das outras presas, jurada de morte,com um advogado indicado pelo estado, porque nenhum outro quis me defender.
Não, não é tão simples ter um filho.

terça-feira, 2 de março de 2010

caderno velho

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Pensei em escrever aquele texto, aquele que nós começamos a fazer juntos, mas preferi não fazê-lo. Aquele texto começou em uma noite com vinhos e fotos, a medida que bebíamos e falávamos mais, mais fotos eram tiradas. Era como se tudo precisasse ser registrado, como se soubéssemos que noites iguais aquela não se repetiriam. De repente, você surgiu com um caderno, uma caneta e uma proposta...cada um escrevia uma parte e outro completava, tendo liberdade de adaptar a história como preferisse. Nós fizemos isso, é fizemos...a história foi tão adaptada que descaracterizou-se toda, não reconhecíamos mais as personagens, as situações, o enredo. Depois de um tempo, o caderno foi deixado de lado, nós nos deixamos de lado e a história ficou suspensa...sem final.
Acho que não somos bons com desfechos, só introdução e clímax.
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segunda-feira, 1 de março de 2010

eu acho é muito




normalmente escrevo meus textos alguns dias antes e programo pra ser publicado no dia primeiro. acontece que desta vez decidi acordar e escrever. é que os dias têm sido tão diferentes, que sei lá, se eu programasse ontem a noite o que dizer hoje de manhã, seria algo totalmente diferente do que estou vivendo agora. não que isso interesse a você, mas preciso contar que os últimos meses não têm sido fáceis, o que não significa que não foram bons. by the way, de nada adiantou esperar pra escrever hoje, pois vou falar mesmo é do carnaval em recife. enfim. uma viagem linda e estranha à uma cidade que amei e quero voltar pra ela o mais breve possível. lá vivi o carnaval, o meu primeiro carnaval em vinte e nove anos. sim, não gosto, mas precisava experimentar aquela coisa toda pra dizer que não quero mais. o bloco eu acho é pouco - bom demais - descendo as ruas de olinda e se afunilando a cada verso de suas músicas e que me fez lembrar o metrô de são paulo em horário de pico, só que com pessoas lindas, felizes e bêbadas. o galo da madrugada, o maior do mundo, provando que tristeza tem fim, felicidade não. os encontros na escadaria em frente ao museu de arte contemporânea na treze de maio, com seus beijos, agarrões e arrastões denotando um desrespeito consentido, uma decepção sem arrependimentos, uma vergonha alheia e a vontade de voltar pra casa. brennand, casa de banho, arrecifes e outros passeios maravilhosos. o desencontro com amigos de são paulo, o encontro com desconhecidos e amores eternos sem identidade que terminaram em vinte segundos. as mais de quatrocentas mensagens trocadas, os telefones anotados e apagados em seguida, o sentimento de inferioridade e a alegria de ver a imensidão da praia de boa viagem. as festas vip, os shows, a vodka. a despedida definitiva enquanto aguardava pra retirar a bagagem na volta à minha cidade e a espera surpresa no aeroporto. porto de galinhas não é tão bonita como pensava, mas os últimos minutos naquela praia valeram a viagem. as hospedagens camaradas, as recepções sempre boas e acaloradas, o sotaque pernambucano... ah, o sotaque....

no fim, creio que também deixo lembranças boas na cidade. algumas delas faço questão de esquecer, como aquela sombrinha de frevo que ganhei e acabei deixando por lá. no mais, trago comigo algumas fotos, uma cicatriz de queimadura de cigarro no braço direito e outra aqui dentro.

mas volto ao meu marco-zero.

e sem máscara.
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