terça-feira, 1 de março de 2016

Saudosismo, miopia e pequenos seres peludos viajantes do espaço.




Conforme me aproximo dos 30, assim como as minhas companhias mais frequentes, percebo que certas coisas que ouvi a vida toda são uma grande baboseira.  Não nego, o apelo emocional nos faz amar o período da infância: os desenhos, as brincadeiras, os sabores. Tudo isso se articula com o período em que (ao menos a maioria de nós, espero) temos menos responsabilidades e nossa vida parece mais agradável e simples.
Todo esse preâmbulo desnecessário, sobre o qual pedagogos, psicólogos, mães e irmãos mais velhos falariam melhor para chegar ao sentimento que me interessa: o saudosismo, em sua pior forma. Aparentemente, a ideia de “nostalgia” é muito valiosa a todos, assim que passamos pela puberdade e meados da adolescência.   Voltamo-nos para o passado como se os anos dourados acabassem anteontem, eternamente, e isso nos dá a certeza de que tudo que surge “hoje em dia” é inferior.
                As reclamações são muitas: “o politicamente correto deixou o mundo muito chato”, “o país já era”, “a internet acabou com as pesquisas de verdade”. Concorde você ou não com algumas dessas coisas (exceto a primeira. POR FAVOR não diga que o problema do mundo é o “politicamente correto), há de se notar  que grande parte dessas críticas se vale de uma comparação injusta: você não pode, em geral, reproduzir na sua vida adulta aquilo que viveu na sua época favorita. E isso não deveria ser razão para você olhar torto para o que a vida lhe traz.
                Uma das reclamações mais recorrentes que eu ouço, principalmente de gente com apego ao passado acima do comum, é que os desenhos animados e brincadeiras de sua infância eram incríveis, e os atuais são “lixo”(Não vou falar de música hoje, isso daria outro texto enorme).  E nisso, meus caros, eu tenho algo a dizer: provavelmente não são.
                A geração atual de “crianças e adolescentes” tem às sua disposição coisas incríveis como Steven Universo, Gravity Falls, e o desenho que mais me impressionou nos últimos tempos: Wander Over Yonder (Galáxia Wander, na tradução do Netflix). A animação trata de um pequeno personagem peludo (Wander) e sua companheira Sylvia(um cavalo espacial ) e suas viagens pela galáxia ajudando pessoas desconhecidas e espalhando felicidade no geral. Parece bobo e inofensivo, mas é muito mais do que isso.
                O que esse desenho, aliás todos os citados acima, tem de diferente e que não lembra a minha infância?  Os temas. A coragem de tratar de assuntos que, durante os meus 10-14 anos, seriam ignorados. Fala-se sobre bullying na internet, os personagens desconstroem histórias clássicas de princesas e cavaleiros, trata-se protagonismo feminino e até mesmo sobre como ser feliz o tempo todo pode ser danoso (Divertida mente mandou abraços). E é “só um desenho".
                A verdade é que, mais que um desenho fofo, educativo e questionador, Wander Over Yonder é uma prova. Não a única, não a melhor, não a “diferentona”, mas uma evidência de que os desenhos as artes, a cultura como um todo, não eram melhores antes. O problema  é nossa percepção de que o mundo azeda quando nos soterramos de responsabilidades e alcançamos os  “grandes problemas da vida adulta”. Então , se quer um conselho,  sente-se, coloque o desenho do “bicho vermelho peludo” e do “cavalo espacial” e confronte suas memórias. Deixe uma coisa tão simples quanto uma animação infantil te lembrar  que nem tudo piora, e que a vida nem sempre é melhor anteontem.  Apesar do pessimismo padrão nesses tempos pós-pós-pós-modernos, coisas boas acontece. Essa animação e´uma delas.

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