Depois de algumas décadas o mesmo grupo volta ao poder, seguindo o mesmo terror do passado. Com uma interpretação radical e insana da religião como justificativa, ameaçam opositores de morte, desprezam a ciência, sufocam a cultura e menosprezam as mulheres, com o líder se referindo à própria filha como resultado de ‘uma fraquejada’.
Agora o Afeganistão segue o mesmo roteiro, com instituições ainda mais frágeis e ações mais radicais do grupo paramilitar que ocupou o poder, o que leva a população ao pânico, exceto aqueles que concordam com a interpretação fundamentalista do islamismo e ainda acreditam que levam alguma vantagem com o governo Taleban.
Lá e cá um governo de lunáticos, ainda que armados, não se sustentaria sem o apoio de parte da população, para a qual não importa o caos em que o país agonize, desde que sejam mantidos privilégios, que vão desde a isenção de impostos milionários e o tráfico internacional de ópio, até ações mesquinhas, como não dividir o aeroporto com os pobres e obrigar as mulheres a usarem burca.
Além da ausência de um poder moderador, que lance ao menos uma nota de repúdio às arbitrariedades do governo, os afegãos têm uma diferença marcante. Querem, ao menos no discurso, romper definitivamente com qualquer vestígio do ocidente. Ainda que líderes do Taleban tenham acesso ao luxo que vetam à população, a ideia é manter o país sob o rigor da sharia, a lei islâmica. Aqui os patriotas batem continência para a bandeira norte-americana e vendem o patrimônio nacional a preço de banana.
Desde o fim teórico da escravidão a elite brasileira tem uma obsessão: transformar o país em um território europeu ou norte-americano. Voltam de viagens ao exterior maravilhados com a organização, segurança, limpeza e como a sociedade funciona de forma harmônica.
Apesar da estupefação, qualquer tentativa de reformas sociais que sigam o padrão europeu coloca a mesma elite em pânico. Taxar grandes fortunas, regulamentar a mídia, prestar assistência aos necessitados, fazer reforma agrária ou manter empresas estratégicas sob a tutela do Estado são medidas apocalípticas para a classe média verde e amarela.
Diante da mera sugestão de um país um pouco menos desigual, a elite brasileira não hesitará em derrubar um governo e apoiar um genocida. Para isso tem apoio da classe média, que prefere achar que é rica do que se assumir muito mais próxima dos pobres.
Assim imitamos o Afeganistão e esperamos que com isso tenhamos um resultado europeu. Naturalizamos as armas, as ameaças, a tortura – que após a ditadura militar segue praticada na periferia –, com milicianos aliados a líderes religiosos. Diante dos olhares incrédulos do mundo com a política medieval, bolsonaristas, ao melhor estilo Taleban, afirmam libertar o país.
Temos uma pequena vantagem. Ao menos em teoria as eleições ocorrerão no ano que vem. Uma derrota maciça dificultará os delírios golpistas do atual governo. Resta saber até que ponto os brasileiros estarão dispostos a imitar o Afeganistão visando a Europa.