sexta-feira, 31 de julho de 2009
quinta-feira, 30 de julho de 2009
Não verás nenhum país como este
Entrar na USP é motivo de puta alegria. No meio do zoeira do trote que aconteceu na noite de 22 de fevereiro de 1999, o calouro Edison Tsung-Chi Hsueh teve de mergulhar numa piscina. Sem saber nadar, morreu afogado. O Ministério Público denunciou 4 estudantes de Medicina por homicídio qualificado. Advogado de defesa de um dos réus, Márcio Thomaz Bastos teve de abandonar o caso para tornar-se Ministro da Justiça. Começou bem o exercício, mandando sustar o processo. Frederico Carlos Jana Neto, conhecido na época como “Ceará”, hoje é médico especializado em ortopedia/traumatologia e atende na Zona Lost paulistana. De traumas ele entende bem.
Passou o inverno sem companhia, garotão? Seus problemas estão para acabar. Falta pouco para você cruzar com Suzane Von Richthofen por aí nas quebradas. Parecer da penitenciária considerou-a “presa exemplar” e ela pretende em pouco exibir seu bom comportamento fora do xilindró. A loira já cumpriu um sexto da pena por conta de uma bobagenzinha que aprontou acompanhada do namorado, o que lhe dá direito a pleitear o regime semiaberto. Dura lex só aqueles indefectíveis pratos âmbar, baby.
Os caminhos divinos são insondáveis. Depois que a bispa Cleycianne disse que ela e o Estevam foram presos para evangelizar o terceiro cabra mais procurado pelo FBI, minha fé deu (com cacófato) uma guinada. Que felicidade ver o agir sobrenatural também na vidinha do ex-deputado Fernando Ribas Carli Filho. Acho até que ele queria voar como anjos quando estava dirigindo alcoolizado a 190 km por hora. Nem dá pra evocar Drummond e dizer que havia duas vidas no meio do caminho. “Agradeço a Deus pela vida e a todos que estão orando por mim”, diz o outdoor que decorou as ruas de Guarapuava (PR) por duas semanas. O papai de Fernandinho disse que ele deve voltar à política. Ambiente perfeito para gente dessa laia.
Maluf, Elias Maluco, Casal Nardoni, os 5 playboyzinhos que agrediram a doméstica carioca “porque parecia prostituta”... A lista de exemplos é sobremaneira extensa e provocaria inevitável laceamento escrotal. O fato é que de tempos em tempos aparece “uma vítima ocasional, que se converte no objeto do ódio de todos e passa a ser por reconhecimento unânime o bode expiatório”, na explicação do filósofo francês René Girard. Alguém pensou no José Ribamar Ferreira de Araújo Costa, atual alvo do emputecimento verde-amarelo? Yes, esse é o nome de batismo do presidente do Senado, hoje mais evocado por menções nada honrosas à sua progenitora.
Prezaria saber o que se passou na mente de um cara-pintada após ver a foto recente do Lula e o Collor se abraçando. Hoje me penitencio pelos adjetivos que dirigi na época àquela molecada. Afinal, hoje os nossos protestos usam técnicas de viral e nem precisamos tirar a bunda mole da cadeira para qualquer ação. Os coquetéis molotov dos protestos na década de 60 evoluíram para modernas hashtags. Basta um #forasarney para sermos invadidos por aquele sentimento de dever cumprido. Após a catarse via twitter, podemos voltar ao nosso liliputiano mundo pequeno-burguês e distrair as pessoas com textos tão genuinamente rebeldes quanto o Supla.
Rememorar esses casos me deixou com o sangue em ebulição, agravada pela certeza de que o sentimento se extinguiria em alguns minutos. Ao comentar a morte de judeus no holocausto, o escritor Avishai Margalit ajuda a compreender esse tipo de desconforto: “Esquecer a morte deles seria o mesmo que tirar-lhes a vida pela segunda vez”. Bingo. Daqui a pouco estaremos ocupados com a estreia do Gugu na TV Record, celebraremos mais um título do Verdão e creditaremos os males do mundo à Dilma. Enquanto isso, Sarney estará na Ilha de Curupu curtindo tudo o que este país abençoado por Deus proporcionou ao seu clã nesta e nas gerações vindouras.
Imortal da Academia de Letras, quem sabe o maranhense se aventure a ler um pouco de Olavo Bilac para os petizes da família, terminando o momento literário com a frase quase épica de João Ubaldo Ribeiro: Viva o povo brasileiro!
Sérgio Pavarini de Merda
quarta-feira, 29 de julho de 2009
Batendo papo com Drummond...
Estava disposta ao diálogo, mas ele sequer movia os lábios. Uma teimosa querendo atenção do “homem atrás do bigode, sério, simples e forte...quase não conversa...tem poucos, raros amigos, o homem atrás dos óculos e do bigode”. Havia algo de natural e semelhante, éramos dois errantes, dois anjos tortos , sem lugar no mundo. E foi no olhar que consegui decifra-lo (ou devora-lo?), pois “Satânico é meu pensamento a teu respeito, e ardente é o meu desejo de apertar-te em minha mão, numa sede de vingança incontestável pelo que me fizeste ontem. A noite era quente e calma, e eu estava em minha cama, quando, sorrateiramente, te aproximaste. Encostaste o teu corpo sem roupa no meu corpo nu, sem o mínimo pudor! Percebendo minha aparente indiferença, aconchegaste-te a mim e mordeste-me sem escrúpulos.
Até nos mais íntimos lugares. Eu adormeci..
Hoje quando acordei, procurei-te numa ânsia ardente, mas em vão..
Deixaste em meu corpo e no lençol provas irrefutáveis do que entre nós ocorreu durante a noite. Esta noite recolho-me mais cedo, para na mesma cama, te esperar. Quando chegares, quero te agarrar com avidez e força. Quero te apertar com todas as forças de minhas mãos. Só descansarei quando vir sair o sangue quente do seu corpo...”. desceu o suor, pescoço molhado, dificultando a brincadeira do vento em jogar os cabelos pra lá e pra cá. desejo pelo desejo nada perdura pois “O amor é grande e cabe nesta janela sobre o mar. O mar é grande e cabe na cama e no colchão de amar. O amor é grande e cabe no breve espaço de beijar...mas fácil é abraçar, apertar as mãos, beijar de olhos fechados, difícil é sentir a energia que é transmitida. Aquela que toma conta do corpo como uma corrente elétrica... quando tocamos a pessoa certa."
vencida...já,
Não queria interromper nosso silêncio. E a vontade de ficar quieta, parada e imóvel transbordava.Olhava para os lados, ruas, tanta gente a olhar o mar. Olhava a areia e os passos marcados e pensando em quantos passaram por ali, com os pés na areia, chinelos nas mãos, mais alegre do que triste ou mais triste do que alegre; ricos e pobres,homens e mulheres na maioria pensativos. Não seria má idéia se os pensamentos acompanhassem o tempo e o corpo. Assim, seria mais fácil extrair o máximo de cada dia.Os pensamentos dificilmente se fixam num único lugar. Agora, neste exato momento, escrevendo, pensamentos não estão concentrados no que faz. Há uma infinidade que faz pensar em tanta coisa ao mesmo tempo. hora no passado, no que aconteceu há minutos ou há anos...Talvez na profundidade do mar ou na rasa superficialidade humana. Foi então que lembrei “A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca e que, esquivando-nos do sofrimento, perdemos também a felicidade.” ....há verdadeira verdade nisso...
[...fragmentos de Carlos Drummond de Andrade ]
terça-feira, 28 de julho de 2009
O Jardim de Dentro
segunda-feira, 27 de julho de 2009
Souvenirs que amamos - King Kong
Kong escapa e destrói quase toda a cidade em busca de sua amada. A cena final, no Empire State Building, é uma das cenas mais reproduzidas da história.
domingo, 26 de julho de 2009
Que tal essa então???
Acha que isso é fotografia de National Geographic???
Talvez com a ajuda de equipamentos de ponta e de última geração você consiga esses resultados???
Bem, fiquem tranqüilos, meus caros leitores, essas fotos foram feitas por mim em coisa de uns 15 minutos e em casa.
Existe um termo que alguns colegas usam que se denomina "strobist", que em resumo é simplesmente o uso de flashes convencionais para iluminar o ambiente e fazer a foto, o que se traduz como uma forma econômica de se conseguir resultados quase profissionais com equipamentos de custo baixo, e o termo strobist vem de um website do mesmo nome.
Bom, o que isso tem a ver com as imagens acima???
Simples, foram feitas na melhor e mais perfeita definição do que o strobist traduz, (do próprio site: This website is about one thing: Learning how to use off-camera flash with your dSLR to take your photos to the next level.) fotos feitas em casa, com custo ZERO (a não ser o próprio equipamento), um pouco de paciência e bastante diversão!!!
Este vídeo do youtube explica e mostra exatamente o que se pode conseguir com um pouco de paciência e foi daqui que retirei a inspiração para fazer as fotos que vocês viram.
Espero que vocês se arrisquem a fazer uns clicks e, por favor, me mandem suas fotos no meu e-mail para eu dar uma olhada nos resultados.
Um abração e até o próximo mês!!!
Curtas:
2- conheçam o mobile me da Apple, que me permitiu recuperar esse texto e as fotos, mesmo estando fora de casa,
3- sorry Boss São Lucas, atrasei mas não falhei!
sábado, 25 de julho de 2009
Um mundo sem chatos não é um mundo bom!
Vivendo numa cidade ainda estranha, com poucas amizades "reais", isso é ainda mais frequente.
Outro dia li um artigo não sei onde com o título de "5 coisas que a modernidade está mudando em sua vida". Um dos itens era exatamente esse: cada vez menos estamos convivendo com gente chata.
Pense bem, é uma benção. Você cria seu próprio mundo, trazendo para ele só as pessoas com quem se identifica e afastando todos os inconvenientes. Depois que terminamos a faculdade, o único lugar que resta para se socializar com os malas é o trabalho. Mas é bem simples, você coloca o fone de ouvido e pronto. Está no seu próprio mundo e adeus gente chata. O problema que isso gera é a total intolerância que nutrimos contra esses malas. E querendo ou não deixamos de ver outras perspectivas de vida, por mais diferentes que elas sejam da nossa.
Venho percebendo isso recentemente. Antes, para classificar alguém como chato, levava um tempo e vários tipos de análise. Hoje não. Bastou falar alguma coisa babaca ou fora de hora que já perco a paciência e coloco na lista.
Fora que hoje convivo com um bando de gente igual a mim, com os mesmos gostos, mesmas opiniões e até mesmo os mesmos preconceitos. Uma pequena ilha social. Blergh! Que coisa entediante!
Existe um poetas desses de rua, que me persegue em Buenos Aires. É um sentimento dúbio que sinto, assim como para com a maioria de pedintes que me abordam. Você tem dó e até mesmo compaixão pela situação de bosta dessa pessoa, mas não pode evitar de sentir raiva certas vezes, quando eles interrompem uma conversa e insistem além da conta. O tal poeta já me abordou umas 3 vezes em Palermo e outra na Recoleta. Numa apenas disse não bem ignorante. Na outra, tive dó e ouvi a ladainha inteira. Depois fingi que eu era gringo e fiquei falando "no compreendo".
A próxima eu juro que dou uns tabefes. Se ele reclamar digo que a culpa não é minha. É tudo culpa da modernidade!
sexta-feira, 24 de julho de 2009
Solidão
Sul FRÁGIL universal!
Mãos que se des ENCONTRAM...
Existe um caos ordena DOR?
quinta-feira, 23 de julho de 2009
No Rain
O frio que faz
Solidão e paulista é pleonasmo. (é ou são? – que diferença faz, não ligamos para plurais também)
Estudei e trabalhei demais, não me preocupei tanto em encontrar alguém. Ou me preocupei demais. A verdade é que nunca pensei que sentiria tanta falta dele assim.
Penso em como ele é, onde está, o que está fazendo, o que gosta de fazer. Será que também pensa em mim? Será que é feliz?
Será que ele também sente minha falta quando vai dormir e quando acorda?
Eu quero chorar. Mas lembro que todo o resto da minha vida vai muito bem. Isso é insano.
Então durmo. Leio um livro. Corro. Fujo. Fujo da solidão em que se tornou minha vida. Escapo.
Todo o resto está ótimo. Só sinto falta de alguém que me diga...
quarta-feira, 22 de julho de 2009
De frente pra trás.
Foram poucos os segundos em que nossos olhos se encontraram, mas pra mim foi um momento eterno por encontrar aquele velho amigo. Eu sorri e ele não sorriu de volta. Ele não se lembrou de mim.
Lembro que eu estava caminhando pelo Memorial da América Latina com meu melhor amigo. Ele estava na fila para comprar ingresso e assistir uma das tantas sessões do ANIMA MUNDI e eu estava entrando em uma sessão diferente.
Foi ano passado que eu o encontrei. Pra mim ele continua igualzinho. Talvez um pouco mais alto, mas com a mesma carinha de nerd, as mesmas roupas e os mesmos óculos.
Quando terminou o cursinho nós nos distanciamos. Esquecemos de trocar orkut, MSN, telefone ou qualquer outro meio que pudéssemos manter contato. Ele foi viver a vida dele e eu a minha.
Nós ficamos amigos quando descobrimos que tínhamos algo em comum: o gosto pela animação. Tudo bem que eu preferia assistir e criticar e ele fazer e criar, mas foi nosso ponto em comum durante aqueles seis meses de correria e estudos.
O conheci logo no primeiro dia de aula do cursinho. Ele era o típico nerd de filme do SBT. Era alto, usava roupas e óculos relaxados e não ligava a mínima para os murmurinhos que faziam sobre ele. Eu o admirava bastante, afinal ele era muito inteligente e fazia desenhos incríveis. Seu objetivo era cursar a Belas Artes.
Isso foi há três anos, junto do colégio, quando comecei a fazer cursinho pré-vestibular. Era uma correria só: de manhã a escola e de tarde o cursinho. Lembro que eu saía de casa às 6h30 e voltava perto das 22h ou 23h. Era o dia inteiro estudando e ele foi minha salvação na época.
terça-feira, 21 de julho de 2009
Do latim, humilitas
Um exemplo? Imaginem aquela moça bonita. Corpo escultural, rostinho de anjo, voz de cantora de MPB das antigas. Ela sabe que é naturalmente linda. Ainda assim, se arruma pra sair e o produto final é digno de festa do Oscar ou capa da Vogue. Quando chega na balada, os amigos dizem "nossa, como você está linda!" e ela, com toda a falsa modéstia politicamente correta do mundo responde "são seus olhos", ou, então, começa a encontrar defeitos em si. Coisas do tipo "mas meu cabelo tá cheio de frizz e estou barriguda nesse vestido", quando, em sua mente, está pensando "diga algo que eu ainda não saiba, meu bem".
Até acredito que tenha gente cuja auto-estima se encontre logo abaixo do tapete do banheiro, mas a verdade é que casos como esses são raros de se encontrar. Geralmente, uma mulher sabe quando está zuada e quando está arrasando. Sabe qual calça realça sua região glútea, qual blusinha favorece seus seios ou barriga, qual penteado lhe proporciona o melhor ângulo e por aí vai. Então, quando uma fulana, nitidamente produzida, recebe elogios com um "não precisa mentir pra se enturmar" ao invés de um simples "obrigada", saiba que ela está sendo falsamente modesta.
Sinceramente acho que não há nada de errado em assumir-se. Não que precise esnobar, mas se diminuir também não ajuda em nada. Pelo contrário, apenas serve para depreciar os menos favorecidos pela natureza que você. Isso vale para todos os quesitos da existência. Algumas pessoas são mais engraçadas que as outras, algumas mais inteligentes, outras mais malandras e blábláblá. Alguns têm o dom da escrita, outros da retórica, e fingir que não só para aparentar humildade não faz sentido algum. Também porque, se for atrás da definição literal do termo, vai notar que ele também pode ser lido como mediocridade, coisa que, no fundo, ninguém quer ter associada a si, certo? Enfim... ainda usando o dicionário como base [pra não dizerem que estou inventando coisas] humildade não é fingir que não sabe ou que não é, é saber pedir ajuda quando julgar necessário, agradecer com sinceridade o apoio recebido e, principalmente, saber reconhecer os próprios erros. E lembre-se: somos apenas reflexos dos paradigmas uns dos outros.
bjsmecontesta.
segunda-feira, 20 de julho de 2009
Sobre borboletas e maldições
Hoje (19) sai para dar umas voltas de bicicleta e, não sei por qual motivo, me peguei pensando no livro O Escafandro e a Borboleta enquanto pedalava. Talvez o filme tenha vindo a minha cabeça por sentir que estou desperdiçando algo valioso, pois o filme apresenta, resumidamente, um cara que vivia da exploração da beleza e futilidade, era editor da revista Elle francesa até que perdeu todos os movimentos de seu corpo - menos o movimento dos olhos e, assim, através de uma técnica elaborada por uma pessoa próxima (acho que a enfermeira ou médica, não lembro bem) ele se comunica piscando os olhos: ela ia dizendo o alfabeto e, quando chegava na letra por ele desejada, ele piscava. Assim ele escreveu o livro O Escafandro e a Borboleta. A história é linda e verídica.
Bem, tento observar a vida por diversos ângulos que não os usuais, me ferrei muitas vezes por insistir em seguir um caminho que as vezes nem mesmo existia, teimo em não seguir métodos, arrisco, abuso, colho vezes coisas boas, vezes coisas ruins, mas o caso é que estou ficando velho e, na verdade, não construi nada de efetivamente relevante. Nem pra mim nem pra ninguém. Gostaria de oferecer ao mundo pelo menos um trabalho significativo, seja para o sentimento, para a alma, para a mente... talvez uma história, uma música, não sei.
Os dois parágrafos acima estão profundamente interligados. Há algum tempo, eu era um pai de família com 19 anos de idade e sem o segundo grau completo. Como a vida me cobrava pesado naquela época, tive que me submeter a qualquer trabalho, foi assim que me tornei porteiro - possivelmente o porteiro mais novo de São Paulo - assim fiquei por quase 3 anos. Apesar da frieza da vida dentro da portaria, onde eu era invisível, acho que foi alí que descobri o que eu era. As vezes pegava dois turnos seguidos de 12 horas no fim de semana e, ao ver os pais felizes brincando no playground dos condomínios com seus filhos, eu chorava mesmo, derramava lágrimas oculto pelo vidro fumê do aquário chamado portaria, que separava o porteiro do mundo social. Um dia, indo da minha casa para o trabalho, eu estava desolado dentro do ônibus pois sabia que tinha algum potencial e talento para ganhar mais do que 350 reais por mês. "Será que essa vai ser minha vida pra sempre? Será que estou morto em plena vida?" Eis que, ao pensar isso, uma borboleta pousou no vidro do ônibus, na parte de fora bem ao lado do banco que eu estava sentado. O que me chamou atenção foi que, no dia anterior, eu tinha assistido o filme de Patch Adams e me lembrei da parte em que ele está a beira de um precipício e pede um sinal para Deus. Nesse momento surge uma borboleta e ele compreende que aquele era um sinal. Pois bem, a minha borboleta estava alí na minha frente, numa posição um tanto desconfortável, numa base de ângulo 90 graus e se agarrando desesperadamente no vidro para que o vento não a levasse. Era como se dissesse "Ei Denis, não duvide de você rapaz, prepare-se pois sua vida vai mudar em breve". Ela resistiu por uns 2 minutos até levantou vôo e me deixou alí, bem mais leve e disposto a enfrentar o mundo e escrever minha história.
Alguns anos depois lá estava eu, publicitário e jornalista. Por um tempo isso me bastou, eu me sentia vitorioso mas... depois de um tempo, tudo parecia tão vazio. Escrever coisas que não eram sobre o que eu sentia, criar releases persuasivos e vendedores... aquilo não fazia mais sentido pra mim... eu queria mudar o mundo, por isso estudei jornalismo, parece que alguém me enganou.
Não, ninguém havia me enganado a não ser eu mesmo. Jornalistas não mudam o mundo, pessoas mudam. Era preciso ser uma pessoa, um ser humano, não um jornalista, porteiro, músico, médico, militar ou o que quer que seja, não é a profissão que muda o mundo, mas as pessoas que estão por trás destes títulos. Pedi a demissão da agência que trabalhava por me sentir mal com o trabalho e fui me dedicar ao meu blog e pronto.
Bem, assim estou há mais de um ano e ainda me sinto vazio.Tão subestimado quanto nos dias de portaria, tentando entender o que tinha dado errado até há umas três semanas. Seria a maldição humana o sentimento de eterna insatisfação? Ou talvez nossa maior dádiva seja a própria insatisfação afinal, ela nos move, nos tira da zona de conforto e nos motiva a criar, certo? Mas o que estamos criando aqui? (conversa que surgiu na casa de um amigo, enquanto bebíamos cachaça e tocávamos viola caipira, cajon e berimbau), um mundo cada vez mais confuso pra minha mente já confusa. Um corpo político que me dá aflição, ligamos a TV e vemos um tal de funk carioca que nada tem a ver com a gente, as modas refletem tendências estrangeiras e vejo vergonha nas pessoas em ser brasileiras, parece que vivem tentando passar uma ideia europeia ou norte americana de ser, com suas roupas e gostos, ser brasileiro hoje está definitivamente off.
Foi justamente por isso que decidi aprender capoeira e a tocar viola caipira no ano passado, mas depois daquela cachaça na casa do meu amigo, parece que as ideias ficaram mais... energizadas. Ligamos para um cara que toca funk num grupo chamado Comitê do Soul. Propomos a criação de um movimento legitimamente brasileiro - com toda a miscigenação que o brasileirismo pede. Durante a semana, falei com meu mestre de capoeira, falamos com estilistas e produtores de moda, fotógrafos, cineastas, jornalistas e produtores culturais. O resultado disso é que em novembro, o anfiteatro do CEU Aricanduva vai receber o lançamento do Movimento da Valorização da Cultura Brasileira, com música, roda de capoeira, desfile de moda baseada na brasilidade, exposição de fotos e mais ações que estão sendo voluntariamente agregadas. Uma série audiovisual também está em andamento e temos planos para teatro e dança também. A ideia aqui é fazer história, tem gente trabalhando para captação de recursos públicos (Rouanet/ PAC Paulista), gente trabalhando na assessoria de imprensa, gente querendo entrar... gente querendo fazer do movimento uma espécie de Tropicália ou Semana da Arte Moderna, os ânimos estão nas alturas.
Pois bem, sento-me aqui para escrever um texto de improviso no dia 19 e o termino no dia 20, relembrando um pouco da minha história e tentando justificar para mim mesmo e para o mundo de que vale a pena sair da zona de conforto para tentar mudar, criar, explorar, viver e que não é preciso nenhum escafandro para que nos lembremos disso. Graças a uma cachaça na casa de um amigo criamos coragem para fazer convites que as pessoas estavam esperando chegar há muito tempo. Convite este que estendo a você, que quer fazer história mas sabe, como nós, que é complicado ser percebido quando se está sozinho. Me mande um e-mail se quiser mais informações sobre o que está sendo feito e se quiser se juntar a nós será bem vindo. Fiz questão de que este blog fosse o primeiro veículo a publicar informações sobre o Movimento e que vocês fossem as primeiras pessoas a saber. Espero que daqui a alguns meses, ao relermos este texto, fiquemos satisfeitos com os resultados alcançados.
Fim do improviso, não vou nem revisar o texto, perdoem-me pelos erros gramaticais e tudo mais, mas assim o texto está mais sincero e vivo, agora... não se surpreenda se uma borboleta pousar do seu lado depois de ler.
Amplexos!
domingo, 19 de julho de 2009
Harpa d'agua
Desculpe o atraso, é que furou o pneu do trem... (pô, baita mentira né?) bom, espero nao estar sendo incomodo, mas me ocorreu um pensamento alarmante qdo estava no trem que queria participar a maravilhosa equipe do blog dos 30 porisso entrei num internet café pra gastar um pouco de dedo... e depois voltar a botar o pé na estrada.
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Mais que uma questão semantica, é uma questão zen-quantica, se é que isso existe! E este nivel subatômico me lembrou que assim como o espectro cromático, o espectro sonoro é basicamente originado atraves do movimento oscilatorio das ondas de frequencia que podemos perceber atraves de nossos mecanismos sensoriais de cognição.
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Então fiquei aqui pensando que se um som tem uma frequencia tão baixa que não pode ser ouvido talvez não devesse ser classificado como som... mas um cachorro ouve outras frequencias, e outros bichos reagem de maneiras diversas às freqüencias sonoras e luminosas. O visivel pode ser invisivel assim como sons podem ser inaudiveis.
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Pois então um, som inaudivel talvez não seja som, embora o possa ser para outras especies e imagino que certos sons vibrem apenas dentro do meu cranio. E resta pois a pergunta que não cala e ecoa nos meandros da existência humana neste maravilhoso planeta de agua com pedacinhos de terra com serzinhos complexos e laboriosos de curta existencia:
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Existe musica, depois da morte?
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sábado, 18 de julho de 2009
O ópio do povo (e meu também)
Se gostei de uma menina logo estou imaginando ela na arquibancada e eu fazendo gol e apontando pra ela. Presencio uma injustiça e já me vejo ganhando uma copa e usando a visibilidade daquele momento pra meter o couro e derrubar os ''grandes chefes'' feito aquela música bonita do Beirut. E é assim com tudo, cada pequena alegria vivida é uma pedalada na minha cabeça, ir bem numa prova é acertar uma cobrança de falta, presentear alguém e sentir que esse alguém gostou de verdade do que lhe foi dado é um passe pra gol. Quando tá tudo uma bosta eu me imagino na torcida passando mal porque meu time foi campeão. A bola não gosta muito de mim não, já eu não vivo sem ela.
- Como a senhora explicaria a um menino o que é felicidade ?
- Não explicaria, respondeu.
- Daria uma bola para que jogasse.
(Pergunta feita por um jornalista à teóloga alemã Dorothee Solle)
sexta-feira, 17 de julho de 2009
A “apesar de” e “aquela que só tinha qualidades”
Porque só elas entendiam determinadas expressões e porque certas histórias só arrancavam gargalhadas das duas. Naquele breve reencontro não puderam relembrar todos os momentos hilários que tinham dividido. Dedicaram-se mais a contar o que tinham feito nesse meio tempo – reviravoltas tamanhas – e filosofar sobre a vida.
Pararam em um café, onde diante do vai e vem de gente conseguiram pôr em voga suas divagações, que, igualmente, se dissipavam com o vento.
- Sempre quis morar em outro país – disse a mais nova.
- Às vezes eu me dou conta que se deu certo para tanta gente, eu deveria ter tentado. Mas agora já era – respondeu a outra, não tão mais velha, poucos anos a mais.
- Sabe, um dia você me perguntou uma coisa que me fez pensar bastante. Você queria saber onde eu sonho estar. Até hoje penso nisso. Para onde estou me projetando.
- Olha, hoje eu prefiro evitar de pensar.
- Ah, que boba.
- Pra que Londres, se a gente pode ter essa paisagem aqui, não é? – disse a mais velha, apontando para o lado de fora, onde a neblina, a chuva, as pessoas encasacadas correndo davam a impressão de que as duas estivessem incólumes em um aquário de vidro, enquanto a vida continuava do outro lado da parede.
A mais nova olhou a mulher diante de si e a invejou. Ela contava dos homens que, embora tivessem passado pela sua vida, de alguma forma estavam sempre presente. E de amigos e trabalhos e sonhos que vão e voltam. E teve a impressão de que a fortaleza diante de si não desmanchava por nada. Ou pelo menos não por muito pouco. Ora, ela era capaz de se dar bem em qualquer lugar. E enquanto isso, a menina pensava consigo se um dia haveria de ter essa capacidade de adaptação.
- Às vezes eu me sinto como aquele poema do Fernando Pessoa, que em um verso diz: “serei sempre só o que tinha qualidades”. Aquela que todo mundo diz: ah, mas ela é tão inteligente, tão querida. E a impressão que eu tenho é que eles queriam completar: Mas coitada. Essa aí vai ficar aí, não vai passar disso.
A outra, a fortaleza, balançou a cabeça.
- Então, eu sou a “apesar de”. Apesar de ter cara de chata, até que ela é legal. Apesar de ser rabugenta, ela até que trabalha bem. Sempre tem um apesar...
O tom de desventurança pairou no ar. Era hora de ir. De enfrentar o inverno lá fora. De esperar pelo próximo encontro. De saber que a outra sempre fará falta. Mas fará parte do que faz forte. E vai reaparecer, de surpresa, quando convir, ou quando quiser.
quinta-feira, 16 de julho de 2009
Embriagado
Naquele futebol despretensioso uma bela jogada. Escrever um texto que lhe encha de orgulho. Realizar um trabalho digno de elogios. O doce primeiro beijo conquistado de uma paixão nascente.
São momentos memoráveis. Estes, que por algum momento, me tornou a pessoa mais feliz do mundo. Sim, foi especial. Uma certeza que é pura intuição e que marcará para sempre a memória. Independente do que aconteça.
Queria ter a possibilidade engarrafar tudo isso.
Nâo se trata de saudosismo: céticos de plantão.
Não quero me privar de novos momentos especiais, apenas gostaria de ter certeza que senti. Duvido. Em alguns momentos que fui capaz disso. Não é raro, sentir-me amordaçado pela cascata de automatismo que se apodera do meu cotidiano, que obscurece tudo, que deixa tudo sem gosto. Que me faz duvidar de mim e daquilo que sou capaz.
Para esses momentos eu abriria a garrafa e me embriagaria com as sensações desses momentos.
quarta-feira, 15 de julho de 2009
fotografias de viagem
terça-feira, 14 de julho de 2009
Decifra-me
- Ontem eu terminei de ler um daqueles livros que quando chega ao fim deixa um buraco no peito, sabe? Estava pensando... Eu tenho um caso de amor estranho com a Literatura.
- Como assim?
- Por exemplo, eu julgo conhecer as pessoas pelos seus livros favoritos. Certa vez li diversos títulos da geração beat porque estava a fim de um cara. Ele era um aventureiro, meio hippie, participava de movimentos estudantis e andava com os cabelos negros em desalinho, pegando carona por todos os cantos do País. Idolatrava Kerouac. Em suma, era lindo e inteligentíssimo, combinação rara, doutor.
- E você acha que o conheceu mais profundamente pelos livros?
- Claro! É impressionante como as pessoas tendem a cultuar aquilo que elas se reconhecem ou que reflita o que elas querem ser. Outra vez li Tao Te Ching, depois de ganhar de um ex um livro de meditação que citava essa obra. Era começo de namoro, sabe como é. Fiquei intrigada com o presente, tentando descobrir alguma mensagem secreta nas entrelinhas.
- E você descobriu algo?
- Não, só que ele era um pouco espiritualista demais e que estava tentando me moldar ao seu gosto. Não durou nem três meses a relação.
- Me fale mais disso. Teve outros casos parecidos?
- Ô se teve! Escuta essa: uma vez um amigo que eu não via há anos me achou em uma dessas páginas na Internet e me convidou para sair. Fomos jantar juntos e eu percebi que ele estava com muito lenga-lenga pro meu lado... Veio com um papo de que gostava de piano e que estava escrevendo um livro, tudo muito forçado, sabe? Me controlei para não rir na hora. O cara não sabia nem fazer a concordância verbal direito e me dizia que era um escritor? Fiquei imaginando as pérolas que devia sair. “As criança foram...”. Juro, ele falava assim! Sem citar as mensagens que ele me mandava pelo celular. “Lindinha saudadez de você !”, com “z” e espaço entre a pontuação, acredita?! Não ria, doutor, é verdade.
- Ah, teve outro caso bizarro também. Já fazia umas três semanas que eu estava saindo com o André, não estava apaixonada nem nada, mas ele já estava insistindo para namorarmos. Até que um dia o assunto enveredou para Literatura e ele teve a pachorra de me contar que odiava ler. Sim, ele usou a palavra “odiar”. Ainda teve o disparate de dizer que tinha uma coleção de clássicos herdada do avô e que já tinha queimado diversas obras. Eu quase tive um surto psicótico quando ouvi isso e fiz ele me dar os livros que haviam sobrevivido a sua fogueira particular. Não preciso nem dizer que nunca mais saí com ele, né. O que foi, doutor? Por que está me olhando com essa cara?
- Estava imaginando qual é o seu livro preferido. Não vai me dizer?
- Ah, não! Você já quer concluir a terapia? Ainda estamos na terceira sessão para você querer me conhecer assim.
segunda-feira, 13 de julho de 2009
"Lis", ou "a imprescindível queda no degrau da escada"
domingo, 12 de julho de 2009
¼. Quatro.
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Há um mês.
Havia um mês naquele quarto. Um mês antes de tudo que acontecia agora. Antes da morte. Se ele apagasse o cigarro no parapeito ou jogasse parabaixo e caminhasse até o quarto, constataria o computador amarelo de seta piscante gritando para que ali algo fosse digitado. O amarelão gritava: mande ela para o inferno sem escalas, mas fale algo.
Eu sentia que ela aguardava por um telefonema, um e-mail, por isso não dava sinal de vida. Aguardava, nem que por uma voz que desejasse bom dia no abre e fecha da geladeira no desencontro do café da manhã.
Ele precisava escrever pra ela, desabafar uma resenha de todos os poemas que havia lido nas últimas noites.
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Há um mês... e duas semanas.
E quando havia um mês e duas semanas, ele ainda lembrava de Aline, mesmo após um mês e duas semanas. Aline era assim... dispersa. Eu amava ela. Sempre dizia pra todo mundo que eu amava ela. Eu amo ela. Era completo. Era rústico. Era sincero. Eu amo ela. Eu dizia.
Aline tinha pele clara. Branca não, clara. Cabelo preto, mas que não deixava muita saudade. Não como sua altura, sentia saudade de cada centímetro de seus um metro e setenta e cinco, seus olhos quase verdes e suas calças, sempre escondidas por algum sobretudo, com cheiro e costuma de brechó. Ali, envolto por duas coberturas de pano e uma de seda, morava algo de cheiro apaixonante, que faria qualquer homem sonhar com seres de roupas brancas caminhando sem destino. Os olhos também eram levemente puxados, mas eu sabia que não havia nenhuma chance de um parente de quinto ou sexto grau vindo do oriente mundo. Eu a chamava de Winnie. Ela era magra.
Aline encontrou Luciano por aí. Nem lembra ao certo. Num começo de noite, a desculpa dele foi o frio. Ela, vinho. Procuraram por um bar de paredes claras perdido numa rua deserta do centro da cidade onde moravam. Encontraram e entraram e descobriram que precisavam comprar fichas numa portinha. Nada pior pra quem procura descanso.
Lição um: nunca beba num bar onde as fichas são compradas antes.
Lição dois: nunca coma num restaurante com fotos de pratos no cardápio.
A segunda lição ele havia tirado de um filme. Aline pediu o catálogo de vinhos da casa. Virou a garrafa e olhou com atenção mestra o rótulo do único vinho que havia por ali. Uma cara de quem se fazia entender cada ingrediente e corante ali descrito. Pediu como uma dama, como se tivesse o poder de negar e escolher pela marca adversária. Como se o fabricante estive atrás de nós, a taça veio. O barman entregou com tamanho gosto que parecia ter acabado de definhar as uvas. Meu conhaque também. Sem gelo. Há quem peça com.
Aline o beijou. Apenas após o segundo copo. Na sacadinha do bar para onde foram, foram se aproximando. Os pés se tocaram, as canelas também. Ela ainda pôde rir. Ele fez que não viu. O assunto ainda pautava, mas ele pouco ouvia. As coxas também e o tronco. Sua boca encontrou o pescoço, bem próximo a nuca. Os pêlos loiros levantaram. Ela se contorceu. As bocas se encostaram. Uma delas tinha os lábios secos. Tudo ficou úmido. Depois, molhado.
Após vinte minutos, estavam entrando em seu apartamento, número 51, com cuidado pra não pisar em alguém que dormia pelo chão da sala principal. Após vinte e um minutos, ele trancava a porta do quarto usando alguns livros técnicos de fotografia e ela destrancava sua calça. Ele, a dela. E o que havia parabaixo.
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¼. Três.
Roberto estava morto. Mas vi apenas seu pé esquerdo.
Era como se o cheiro me tivesse levantado da cama e me enrolado na toalha suspensa pela metade na cadeira giratória. A toalha cheirava.
Eu poderia caminhar até o quarto em frente, desvendar o corpo deitado e cobrir aquele pé que me chateava. Eu poderia. Poderia também ir até ele e checar sua respiração, seu pulso. Quem sabe não daria tempo de reanimar o seu corpo moribundo?
Aquele cheiro me prendia na sacada. Fechei o vidro com força. Com força traguei. Me acorrentava e me embolava naquele quatro por um.
Um dia, todos nós sofreremos com as agressões da morte, ele dizia em meu ouvido. E que coisa absurda de se dizer. Ninguém quer ouvir falar da morte de tão perto. Muito menos se dita ao pé do ouvido. Aos pés. Aquele pé esquerdo estava com as unhas por fazer. Tinha um casco grosso. E pude me lembrar dos dias que aqueles cascos encostaram-se nos meus.
Roberto estava morto. Pelo menos pra mim.
Acho que também pra você.
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sábado, 11 de julho de 2009
Quanto vale o show?
Esta semana, enfim, foi a audiência do caso do meu vestido que a lavanderia perdeu. É, a lavanderia perdeu o vestido que eu desenhei e mandei fazer pro casamento da minha irmã, já pensando também no casamento de uma grande amiga minha, 5 meses depois. O casamento da amiga era numa sexta, a lavanderia se deu conta do sumiço do vestido na terça, ninguém me ligou, eu fiquei sabendo por acaso na quinta à noite, véspera da sexta em que era o casamento. E mais: sem outra opção de roupa pra ir ao casamento, e sem tempo de providenciar, já que trabalho o dia inteiro com um horário de almoço super corrido. Ou seja: era a perda do vestido mais bacana do mundo, a falta de roupa pra ir ao casamento, a falta de tempo para tomar providência e o transtorno e a frustração que tudo isso traz. Pro juiz, isso tudo valia R$ 1.000,00. Pra mim, valia uns R$ 2.000,00, que dava pra mandar fazer outro vestido igual e ainda sobrava um trocado pra valer pelo dia sem trabalhar e sem almoçar e pelo mau-humor na festa. Pra advogada da lavanderia, devia valer por aí também. Pro dono da lavanderia, não valia nada. E pra evitar mais dor de cabeça, acabei fazendo um acordo de R$ 550,00.
Voltando do Juizado Especial das Relações de Consumo, fui pensando no valor subjetivo das coisas. Não quero fazer propaganda de cartão de crédito, mas o que tem preço pra uns, muitas vezes não tem pra outros, e vice-versa.
Sabe a história do avião da Air France que fazia o vôo AF447 e caiu no mar? Pois é. Imagina quem calcula as indenizações que os familiares das vítimas vão receber! Quanto vale o príncipe descendente de D. Pedro II? Só porque ele era príncipe? E o bebê? E se ele fosse bebê de proveta e tivesse custado caro pros seus pais? E se ele fosse herdeiro de uma fortuna? E se ele fosse filho único de um casal que não pode mais ter filhos? E se ele fosse doador de medula e sua vida valesse por duas? E a vida inteira que ele tinha pela frente? Tinha um casal? Será que era a única chance de dar continuidade a uma família? Será que eles eram responsáveis pelo sustento dos seus pais, idosos? Será que eram voluntários num hospital de caridade e ajudassem a salvar a vida de outras pessoas?E aquele pai de família? Quantas pessoas dependiam dele pra viver? A esposa, os filhos? E aquele outro que não trabalhava, não sustentava ninguém, não era voluntário nem fazia caridade, não era príncipe nem bebê de proveta? Que falta ele faz pra família dele? Que falta ele faz pro mundo? Quanto ele valia?
Quanto custa existir? E quem calcula o preço de não existir mais, pra quem vai e pra quem fica?
quinta-feira, 9 de julho de 2009
Vou fugir pra Lisboa, casar com um garçom e viver numa casa com azulejos na parede.
A garoa do lado de fora só consigo perceber em um persistente pedaço do toldo, de onde caem duas gotas a cada tantos segundos. Daquelas gotas gordas que vão se acumulando até pesar o suficiente para desafiar a gravidade, a minha lei favorita da Física. A rota, brevíssima, só tem um rumo: a calçada de mosaico português. De repente me surpreendo com o tamanho da redundância. Que outro tipo de mosaico se espera encontrar em Lisboa?
Do lado de dentro o teto segue seco e um casal multinacional mantém uma conversa daquelas que parece ter começado muito tempo antes de pedir o cardápio do almoço, e que, mesmo com as xícaras de café vazias e o cinzeiro cheio, não deve nem ter chegado à metade. Ele fala inglês britânico. Ela responde em francês com sotaque, e às vezes eles trocam de idioma. Com o garçom, usam o português básico para turistas: "Eu querrro um café."
Eu quero comer muito, mas sei que só comerei o que devo. Demoro alguns eternos minutos subtraindo o que está na minha carteira pelas cifras no papel e imaginando se, no restaurante Fonte dos Passarinhos, me entenderiam se eu pedisse o combinado de peixe, sem o peixe.
O garçom me explica que a omeleta é suficiente para uma pessoa e a salada também é farta. Deve pensar que eu como igual passarinho, o que não só inspira qualquer piada sem graça sobre o nome do local, mas explicaria também a minha menos engraçada fome, agora que o prato se esvaziou.
Ali fora, a Penélope Cruz acaba de passar, em versão gigante, estampada nas laterais de um elétrico. Aqui dentro, o canal Sport-TV1 transmite ao vivo a brava resistência do Arsenal, agüentando a pressão do Tottenham Hotspur na casa do inimigo, com um homem a menos desde o final do primeiro tempo. A partida segue sem golos.
Meu garçom não tem tempo de ver o jogo. Está ocupando vestindo calça social preta e camisa de botões branca, com finas listras horizontais cinzas e verticais vermelhas. Dobrou as mangas para revelar metade do antebraço sem relógio. Dois botões se recusaram a entrar nas respectivas casas.
Quero me casar com ele. A pele clara da sua nuca ressalta algumas pintas desenhadas a esmo abaixo dos cabelos fartos e escuros. Pelo rosto, apenas três: duas no lado esquerdo do queixo, uma acima do osso da bochecha. Vizinha do nariz com canto fino e ponta larga e colega dos olhos negros que se espremem quando sorri. Desliza pelas mesas, aparece sem avisar pelo meu lado direito e exerce tanta autoridade sobre os copos na prateleira que eles parecem já saber onde ir, sem que precisem ser tocados.
Nosso casamento está ameaçado. Seus sonhos ultrapassam as paredes do Fonte de Passarinhos. Fala com o casal trilíngüe sobre a vontade de visitar Viena e Praga. Pede dicas sobre cervejas brasileiras e escuta que o ouvi verde e amarelo não é bom. Recebe outro cliente regular repetindo o popular “yes, we can” e contando histórias sobre sua viagem de alguns dias aos Estados Unidos. Endireita as costas para inspirar melhor enquanto se lembra dos detalhes. Apóia o peso do corpo na perna direita e olha para fora do restaurante, onde a chuva já foi e voltou três vezes e a goteira mantém o exato comportamento de alguns parágrafos atrás.
Talvez esse romance dê certo. Ele busca um horizonte com a mente, mas só vê uma praça onde várias pessoas esperam chegar o autocarro. No Jornal de Notícias, a “reportagem de domingo” ocupa as páginas 4 e 5 com depoimentos de portugueses emigrantes. Querem deixar a Península Ibérica para morar em Luanda, onde o salário é três vezes maior e há tanta procura que a lei angolana permite apenas uma cota de um terço de funcionários estrangeiros por empresa. O repórter avisa que só sobrevive à aventura quem abandona os “saudosismos e paternalismos” na velha metrópole e aceita “trabalhar muito” para enfrentar a concorrência de chineses e brasileiros. Estão redescobrindo o mundo, dessa vez sem caravelas.
Mas aqui na Fonte dos Passarinhos, onde meu marido fará carreira e eu comerei o pequeno almoço todos os domingos, não há crise. Não se fala em desemprego, embora eu entenda pouco o idioma falado, cheio de expressões mais próximas ao espanhol que ao tal brasileiro a que se referem constantemente quando citam a língua que eu falo.
Em cinco minutos completarei 24 horas vivendo em Portugal. Amanhã, serei novamente residente da Galiza. Mas tenho vontade de dizer ao garçom que já conheço muitos países do mundo e que ele pode ficar tranqüilo. Porque não há lugar melhor que esta cidade bagunçada, com calçadas em mosaico encravado no asfalto, edifícios antigos e descuidados, mas lindíssimos com suas fachadas cobertas de azulejos. De todas as cores e formas. Que, se ele quisesse, eu viveria aqui, em um desses edifícios. Comeria rabanada e pastel de nata, aprenderia a fazer pataniscas e passearia com ele pelo teleférico no Beiratejo, onde veríamos o entardecer mudar as cores do céu.
quarta-feira, 8 de julho de 2009
roxanne
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terça-feira, 7 de julho de 2009
As estações são bailados de lembranças de um fim pré-suposto
porque aquelas tantas flores e cores eram apenas exterior naquela primavera de um ano que não sei mais. dentro de mim era cinza de lembranças do fim pré-sentido. poeira nas fotografias em preto e branco e o antigo que faz-se presente irremediavelmente. o fado mais triste insistia, aqueles tão morte. e as pessoas que dançavam e rodavam e caminhavam pelas ruas eram bossa-nova. você com seu guarda-sol enorme colhendo flores, antes do temporal. sem perceber que era o temporal todos aqueles anúncios de alegria em out-doors invisíveis e aquele nosso amor que parecia tão contrário quando falávamos de fim. porque a vida insistia dessa maneira. um eterno rasgar a pele e sarar após e até no tempo e re-rasgar e nós numa repetição em acreditar. e desde então e agora. essas tantas flores e cores apenas exterior.
Verão
sempre esse mormaço verão me lembrando você. a maneira como penetra no corpo e aquece até o ponto quase desmaio de tantas lembranças. eu acordando sempre suada, o banho frio às 6 da manhã que nunca foi antes de você, mas que durante. e os vestidos leves, as pernas mostrando-se, o nosso cheiro sempre no ar. o meu pitanga e o teu homem. eu chegava no teu pescoço e te cheirava. eu parava de respirar para te cheirar. sempre ofegando, a sensualidade brotava. e depois de amar quando eu abria a janela, nenhum sol. nenhum. as nuvens meio cinzas cobriam tudo. eu não acreditava. era um calor com tristeza e eu não queria acreditar. uma tristeza que aquecia. uma transformação lenta. e era você. ainda é, mas hoje diferente e tão. como se eu estivesse preparada para não me entregar. os pés, os braços por pouco tempo na água morna. o rosto na água fria acordar só. o corpo todo coberto. as partes que não são, eu rabisco. até a indiferença aparecer, mas. depois de tanto tempo e você ainda. ainda no ar. eu desisto. desmaio.
Outono
e o outono insistia. batia portas, derrubava os quadros, estilhaçava as vidraças do que era frágil. o que poderia ser apenas e obviamente anúncio de tempestade ou da estação seguinte inverno ou qualquer qualquer outra coisa passageira era o alarme do adeus inevitável. e desde então e agora. essa ausência dentro. no silêncio e no meio de tudo que restou passado: teu retirar meus cabelos da face e segurar minha saia durante o vendaval e além de todas as coisas e principalmente me segurar porque eu nunca soube se permanecia ou não. tuas tantas mãos. teus tantos você. até o limite sustentável da conveniência. o acender da tristeza. a desfolhação era interna e minha, o resto insistia. as flores folhas e cores presas nos galhos fingindo-se intactas. quando percebi já era cinza o só eu. e desde então e agora essa mesma nuvem pairando. eu assisto essa estação em mim.
Inverno
o inverno sempre como teu abandono. minhas lágrimas caindo como e com a chuva. enquanto nossos corpos deitados na areia. esparramados no pouco que ainda restava do que éramos. e a eterna espera pelo além do presente. aquele mar em revolta nos alcançava como presságio e impossibilidade de fuga. a chuva nos molhando e o mar e minhas lágrimas, por quê chorar o fim que ainda não. minhas lágrimas e você as lambia. você lambia meu corpo inteiro como um passeio. tua saliva me invadindo poro por poro. e você sem discriminar o que era eu ou você ou a natureza daquela conexão absurda. e logo o suor de você me penetrando e toda. toda aquela água lubrificando o sofrimento. tentativa vã para não doer aquele mistério do após. e eu não pude sequer ouvir ofegando. o gozo. o último. meus dentes cravados no teu ombro até ir morrendo lentamente. tantas cicatrizes e tantas invisíveis e internas. o que era líquido e depois foi concretizando-se. do que sobrou chuva e lágrimas nessa estação. a necessidade de sempre guarda-chuva.
segunda-feira, 6 de julho de 2009
Segunda-Feira
Pulou da cama num salto só. Nem parecia que era segunda-feira e que lá fora chovia e fazia um frio tremendo.
Catou suas coisas e foi para o chuveiro, era necessário se apressar, o tempo passava voando e não queria perder um segundo se quer.
Era incomum, pois na maioria dos casos as pessoas odeiam a segunda, mas ele não, ficava radiante.
Vestiu a roupa mais bonita que tinha, se perfumou, colocou sapatos bem lustrados, ajeitou seus óculos e se olhou algumas vezes no espelho. Segunda-feira era o dia que ele se sentia mais bonito.
Colocou seu sobretudo, pegou seu guarda-chuva, saiu do quarto, trancou a porta, foi para a saída e se dirigiu ao metrô.
Conseguiu pegar a mesma linha de todas as segundas, sentou no mesmo banco de sempre, estava ansioso para a próxima parada. Todas as pessoas que embarcavam naquela parada entraram, menos uma.
Ficou desolado, desde que a conhecerá nunca havia falhado uma segunda-feira. Era sagrado, segunda era o dia de encontrar a mulher mais amável e frágil que já virá em toda a sua vida, mas ela não entrou.
Sabia pouco sobre ela, mas estava empenhado em conhecê-la melhor, porque era doce e encantadora demais.
Na dúvida, se segurou para não se aproximar de duas garotas que sempre embarcavam junto dela e perguntar por que a moça não havia vindo.
Não aguentou. Quando percebeu já estava na frente delas perguntando qual o motivo da ausência.
Elas se entreolharam, ficaram receosas em falar, até que uma delas disse, com os olhos lacrimejando: - Beth se foi ontem à tarde. Você é o Frederico?
Tinha um nó na garganta, mas respondeu que era e então a mesma moça o entregou uma carta.
Com a carta nas mãos, as pernas bambas e um coração destruído, desceu numa parada qualquer. Sentado na praça, com olhos cheios de lágrimas leu a carta que trazia uma grafia fina e graciosa.
Querido Frederico!
Quase não o conheço, mas o estimo demais desde o primeiro momento que você me segurou aquela vez dentro do metrô. Se não fosse você, teria caído e me machucado e o meu estado não permiti fortes abalos.
Víamo-nos apenas uma vez por semana e várias vezes você me perguntava por que eu não pegava o metrô àquela hora nos outros dias da semana. Fugia, não queria contar a verdade, porque eu sabia que o meu tempo era limitado. Mas você me fazia tão bem e parecia feliz quando me via que preferi nada dizer. Talvez eu tenha errado, mas fiz uma escolha.
Segunda-feira é o dia do meu tratamento, por isso nos encontrávamos, mas desde a última quarta-feira não consigo mais sair da cama, minhas pernas não me obedecem e o meu corpo está mais cansado do que de costume.
Já percebi que minhas horas estão terminando, por isso uso minhas últimas forças para te escrever essas linhas, apenas para te demonstrar o quão bem fizestes às minhas segundas-feiras, foram dias mágicos, não importando se chovia ou se fazia sol.
Que fiques bem para sempre e que continues a transformar a segunda-feira de outras pessoas.
Com eterno carinho, Beth.
Ao invés de ficar desnorteado, sorriu levemente e agradeceu por ter podido conhecer uma pessoa tão incrível em uma segunda-feira que podia ter sido tão sem graça.
domingo, 5 de julho de 2009
Vende-se este corpo.
sábado, 4 de julho de 2009
jururu.
"ela anda tão jururu."
pode bem ser coisa de amor.
sexta-feira, 3 de julho de 2009
Pequenas desilusões musicais
Entrou no bar um pouco perdida, mas logo que ouviu as primeiras notas se achou, era Dois pra Lá, Dois pra cá. De onde estava não podia ver a figura de quem tocava, mas os amigos afirmaram que era o pianista fixo do bar. Ficou tentada a conhecê-lo, mas era tímida.
Sempre quis convencer seus namorados a gostar de João Bosco, mas nunca conseguiu, e assim começou a sonhar com o dia que conheceria alguém para dividir seu gosto, sem ter que insistir e explicar nada. Era seu sonho secreto. E por falar em sonho, começou a sonhar com o pianista. Quem sabe era ele? Ele também acharia Kid Cavaquinho engraçado?
Em poucos minutos pode visualizar o namoro, as músicas tocadas só pra ela, as madrugadas, tudo. Todos diriam que nasceram um para o outro. Casariam rápido. Tocaria Dois pra Lá, Dois pra cá, óbvio. Talvez no lugar da Marcha Nupcial, se o padre permitisse.
-Mais uma cerveja?
O garçon interrompeu seus planos. Olhou mais uma vez para o piano e dessa vez pode ver uma mão. Era uma mão morena. Sim, devia ser bonito. E o cabelo? E o sorriso? Foi então que os amigos falaram em pedir a conta. Sentiu-se desesperada. Como? Rápido assim? E agora? Tinha que agir, mandar um bilhete, qualquer coisa. Sem conseguir definir um plano, levantou e avisou aos amigos que iria ao banheiro. Seguiu confiante rumo ao piano, embora de cabeça baixa, pois sentia seu rosto queimando de vergonha. Devia estar muito vermelha.
Olhou novamente para o piano, agora já podia ver nitidamente a figura do futuro amante. Não era bonito como imaginara, olhando separadamente era um tanto sem graça, aliás, mas assim, no piano, até que tinha lá seu charme. Até dava para superar os bons centímetros a menos.
Tomou coragem e disse oi. Ele respondeu, sorrindo.
-Onde fica o banheiro?
E foi aí que o sonho desmoronou. Tinha a voz fina. Explicou atenciosamente, mas tinha a voz fina. Terrivelmente fina. Não, não podia suportar um homem com aquela voz. Agora entendia tudo, o porquê do piano. Pianistas não costumam cantar.
-Entendeu?
Não se lembra se chegou a responder. Traída em seus sonhos, virou as costas e foi embora com os amigos para outro bar.
quinta-feira, 2 de julho de 2009
Mensagem de consolo
quarta-feira, 1 de julho de 2009
apenas o fim
nossa relação já não estava boa há muito tempo e acabou, de fato, há poucos dias. ainda estou me acostumando a acordar e saber que não estamos mais juntos, mas depois de tanto tempo percebi que não, não dava mesmo para continuar. a cada dia ficávamos mais distantes e vi que apenas insistíamos no erro.
no começo era tudo curtição. constantes passeios, cursos, teatro, livraria, cinema, shows, bares, restaurantes, era como se eu necessitasse de sua presença, que me proporcionava uma sensação de segurança sem par. só de imaginar sua ausência, eu já me sentia sem direção.
acontece que o que era pra ser uma relação fugaz tornou-se cada vez mais íntima. eu sabia que não podíamos dormir juntos, mas às vezes esquecia que isso era uma atitude 'errada' e quando via, o despertador do celular anunciava que já era o dia seguinte. não conseguíamos ficar distantes e desde a hora em que acordava até o momento de dormir, eu só tinha a mesma coisa na cabeça, enfim, um vício, que aos poucos foi tomando conta da minha vida a ponto de chegar a pensar que seria pra sempre.
lógico, como toda a relação havia aquele período de indiferença. às vezes eu enjoava e trocava só pra não cair na rotina. acabei até me encantando com outros mais bonitos, mais finos, mais velhos ou novos, mas não adiantava, era como um imã ou um bumerangue, que quanto mais longe eu arremessava, com mais força voltava.
obviamente não foi fácil lidar com o fim e tive de procurar ajuda médica. para suportar a dor, tomei remédios fortes que me faziam dormir. após o término, apesar de sentir um alívio, fiquei 5 dias em casa, só fugi para ver o show do caetano veloso, no dia 13 de junho.
é... pra quem nunca usou óculos pode parecer besteira, mas para mim, que os tive comigo durante vinte anos, sei bem do que falo. acontece que foi preciso dar um fim neles e agora, que rompemos de vez, sei que fiz a escolha certa e tenho sido uma pessoa mais feliz desde o dia 09 de junho, quando fiz a cirurgia para correção de miopia e astigmatismo.
agora eu não dependo mais deles e se antes eu via desfocado, sei que os graus que me impediam de enxergar são apenas números sem importância que desapareceram com a aplicação de um laser, assim como espero que aconteça com algumas lembranças cujas duas lentes de vidro tanto presenciaram mas, vira e mexe, insistem em gritar nos meus ouvidos, ressucitar feridas quase cicatrizadas ou saltar às minhas vistas, agora nuas, como palavras cortantes perdidas em anotações virtuais do ciberespaço.
e apesar do charme que - dizem - os óculos me proporcionavam, não há mais tesão da minha parte por eles e um relacionamento entre nós não daria mais certo mesmo. por isso, posso dizer sem medo de errar:
eu não preciso mais de vocês.
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