*A foto acima é de uma
repressão policial contra manifestantes, em Istambul-Turquia, no
dia 1 de junho, de 2013. O protesto começou na
noite de segunda-feira após construtores cortarem árvores do Parque
Gezi, uma das poucas áreas verdes da cidade. Os manifestantes são
contra a construção de um shopping em formato de quartel otomano,
que derrubaria 600 árvores. Com o tempo outras reivindicações
foram se agregando as manifestações, que seguem até hoje. Foto:
Bulent Kilic/AFP *
O Direito de Passar
Livre Pela Cidade
Ah! A cidade....
Os burgos cheio de
pessoas, ratos e peste negra.
A cidade como resultado
do processo da revolução industrial. As vilas operárias. Os
proletários e suas proles espremidos em espaços minúsculos.
As pequenas vilas em
pequenos clarões em uma mata, próximas aos rios. Por elas passavam
mercadores, mascates, bandeirantes....
As povoações com uma igreja no meio. Moças nas janelas.
Cidade que rima com
modernidade. (Rima com liberdade?)
Máquinas.
Os amontoados
populacionais.
O lugar das grandes
experiências arquitetônicas.
O concreto criando
muros, viadutos, pontes.
A cidade como o lugar
das trocas. O lugar da diversidade. O lugar das grandes circulações
monetárias, mas também da concentração de capital em poucos
bolsos.
O lugar da CIVILIZAÇÃO.
O lugar da música urbana, do Itamar Assumpção.
O caos. O trânsito.
Barulho de britadeiras. As pessoas vivendo empilhadas e andando de
elevador, escadas rolantes, trens subterrâneos....
As pessoas meio
máquinas, acopladas a alguma estrutura tecnológica. Celulares,
fones de ouvido,
carros. (Ainda somos
humanos? Que espécie de homo sapiens? Alguém sabe?)
As luzes da cidade. O
cheiro do asfalto molhado, quando chove. O verde, o amarelo, o
vermelho colorindo as nossas peles na noite. Os helicópteros
sobrevoando nossas cabeças.
Zona leste, zona norte,
zona sul, zona oeste e outros tipos de zona, para todos os gostos.
Onde tantos migrantes
chegam cheios de esperanças e sonhos em busca de leite e mel.
O lugar das
contradições. Das desigualdades exacerbadas. Onde milionários e
desempregados compartilham o mesmo trânsito às 18hrs.
Lugar onde a natureza
foi devastada para a construção de mais prédios, avenidas,
estádios e estacionamentos. Um rio foi transformado em esgoto.
O lugar das
possibilidades impossíveis.
Dos encontros e
desencontros. Das profundas solidões.
Shows, festivais, workshops, exposições, teatros, mostras de
cinema, companhias de dança...
A cidade.
O lugar das discussões
poderia ser o lugar do consenso? Ou o consenso significa calar a
boca, abrir pra reclamar, fechar e saber em silêncio que você não
é um dos vencedores. A ordem estabelecida. O poder vigente. As
regras. Quem escolheu? Quem decidiu?
Poderia ser diferente.
O coração bate resistente e ao mesmo tempo pressionado por uma
angústia. Como acreditar que as coisas podem mudar? Que esse jogo de
dominador e dominados um dia terá fim e surgirá novas polaridades?
Quem está no poder quer manter o controle. A ordem e o progresso.
Controlam a polícia. Com balas de borracha não há diálogo, nem
negociação.
Poderiam todos usufruir
do direito de ir, vir, ficar , morar por onde se queira na cidade?
O direito de passar
livre pela cidade, de circular nela e conhecer seus cantos e
moradores. O direito de ao circular poder se expressar. Dar
significados a lugares, ruas, bares e outros pontos de encontro, e
ter o direito de reconhecimento da apropriação desses espaços.
Apropriação simbólica, cultural que muitas vezes possuem mais
valor para aqueles que nela existem do que para o proprietário que
especula.
O direito de ser
consultado sobre as intervenções, as mudanças espaciais, assim
como o de poder propor, sugerir, planejar, plantar uma horta.
Ser cidadão, morador
da cidade, não devia ser simplesmente ter de arcar com suas
obrigações de cidadão: trabalhando, pagando impostos, respeitando
as regras de trânsito, aguardando que as pessoas saiam do vagão
antes de você entrar.
Passar livre pela
cidade, por toda ela. Poder ir e vir por milhares de motivos e
vontades e não só necessidades. E que esse direito seja de todos e
não só daqueles que possuem carro e dinheiro.
Passear em suas praças.
Poder descansar debaixo de uma árvore, mesmo estando em uma grande e
moderna cidade.
Quem sabe assim podemos
resgatar tantos valores que se perderam ou que foram sacrificados
para que a cidade pudesse existir. Valores que são mais relacionados
com o rural, com o sertanejo: como a solidariedade, o sentimento de
comunidade. Quem sabe então poder ser e conviver como seres menos
individualistas e competitivos.
- Esse texto não tem
fim. Terei que interrompe-lo, assim, abruptamente.-