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sexta-feira, 6 de maio de 2022

Marés

Silêncio nos dedos.

Os textos relidos em goles,

tragados esparsamente.

Eco que escorre a cada sílaba. 

As pálpebras se contorcem

as lágrimas pingam sobre a pele. 

O gosto de mar. 

A língua introduzida no veio sonho acordado. 

Quente.

Enquanto há luz reflexo.

Horizonte.

Tanto espaço, tanto seio pele.

Tanto peito abraço.

Tanto cheiro completo.

Se contorce e espreme.

Se renova e sente.


segunda-feira, 4 de outubro de 2021

Iluministas

Cada tecla do piano
É uma parte do trilho
Se não te toco te dedilho

Invento palavras novas que lhe dão gatilho 
Organizada, mente, gosta que desorganizo

Barman é Bauman 
Vendedor de sonho é um livro

E se isso é um concerto
É você que me desconcerta
Um arranjo num octoecho
Muda toda orquestra

Sou desabafo  
Harmônica, até você desatina
Quando era pagão 
Tu foi bizantina 

Demasiado errados quanto Licínio 
Fomos derrotados por Constantino 
Só renascemos depois do romantismo
Éramos sol hoje somos iluminismo



segunda-feira, 16 de agosto de 2021

O Caso do Circo





Nossa mãe, o que é aquele
vestido, naquele prego?

Minhas filhas, é o vestido
de uma época que passou.

Passou quando, nossa mãe?
Éramos não-nascidas?

Minhas filhas, boca presa,
que memória  é chicote:

se recua, toma força,
se retorna, bate forte.

Nossa mãe, dizei depressa,
que história é este vestido?

Minhas filhas, já me esqueço,
esqueçam disso também.

O vestido, nesse prego,
é fogo morto, passado.

Nossa mãe, esse vestido,
tanta renda esse segredo!

Minhas filhas, escutai
palavras de minha boca.

O circo vinha de longe,
andante de déu-em-déu,

trazia no ventre de lona
artistas de línguas outras.

Do meu ventre, já paridas,
as filhas que Deus me deu

sem saber se eu queria
ser esposa, mãe ou o quê.

Fui vivendo sem vontade
de me haver nessa viagem,

existindo assim, sem brilho,
sem viço, sem assombro.

Quando o circo cá esteve
com todo seu explendor,

me atravessou por dentro
um medo de permanência

e o ardor de uma paixão
de pele se iluminar.

Quis não ser espectadora,
quis a lona por meu lar.

Deixei vocês com a avó
e com o circo me casei.

Nossa mãe, porque nos faz
confissão de abandono?

Minhas filhas, escutai
o que conto e não escondo,

insistiram que eu lembrasse,
pois partilho tudo, agora.

Secai vossas lágrimas,
já que aqui estou de volta.

Mil cidades adicionei,
fiz cartaz, bilheteria…

mas foi como equilibrista,
sapatilha de cetim,

que meu brilho se fez sol
e existir ganhou sentido.

O vestido era a glória
dos meus dias bailarinos;

meu funâmbulo viver
foi feito de fantasia;

tive amores de plateia,
semeei risos suspensos;

me atirei em rede baixa,
fiz da queda meu descanço;

plantei vogal de surpresa,
tantos aplausos eu colhi.

 Passei terras, passei pastos,
passei ponte, passei rio,

conheci diverso povo,
mandei cartas e retratos

perguntando à vossa avó
como estavam minhas filhas.

Poucas palavras voltavam,
pontuando os meus dias,

os meus dias que voavam
nas alturas do equilíbrio.

Por um fio ia a vida
variando experiências,

mais enchendo de vontades,
vontades que, enfim, eu tinha.

Sonhei em sumir no mundo.
O mundo é grande e pequeno.

Um dia, porém, sem jeito,
em meu peito fez-se susto.

Pequeno, inocente, mudo,
no princípio nem me dei.

Era um aperto, um entrave
de fazer perna tremer

quando deveria andar.
A cabeça me pesava

pensamento sem ideia,
só um nó no raciocínio

de ver tanta gente embaixo
que babava por meu tombo:

mesmo que nem percebessem,
desejavam a vertigem

de presenciar, de frente,
próximo passo em falso

seguido de um corpo em queda
rumo ao chão sem proteção.

Olha, eu mesma me disse,
olha como são pequenos

e te enxergam pequenina
qual formiga caminhando,

a qual basta uma brisa
para ser arrancada

de tudo o que conhece,
de tudo aquilo que se é.

Eu não tinha mais impulso
de andar quase miudo

naquele arame fino
de bamboleio certeiro.

Quede o brilho que eu tinha,
quede força ovacionando?

Quede anseio de aventura
que deixava a assitência,

inquieta, em silêncio?
Quede a vida me chamando?

Tudo isso se passava
em meu medo indomado,

em meus olhos fez morada
a indesejada Morte.

Me senti feita de vidro,
frágil, atarantada, humana.

Despertava em madrugadas,
suada, sobressaltada,

arrancava os cabelos,
gemia, encolhia pernas.

Não sabia pesadelo
ou se estava acordada.

Antes o pavor não vinha,
ao depois pavor pesou.

No rodar de mundo, o circo
retornou à esta cidade

Da lona, fui partejada,
pesando quilos de casos,

com a pele amarrotada
e marcada pelo tempo.

Saí do picadeiro
sem voltar minha visão,

para ignorar a morte
que o risco me gritava.

Parei no portão de casa,
sua avó me recebeu,

disse: eis aqui vossas filhas,
te esperam cochilando.

O vestido que eu usava
ficou pregado à parede,

confundindo aqui dentro
um sentimento esquisito

de que tudo foi um sonho, 
vestido não há, nem circo.

Minhas filhas, guardem bem,
que este conto não repito.

........................................................................................................


Esse texto, junto com mais outra versão, foi escrito em 2017 para uma intervenção poética. É uma variação do famoso poema de Carlos Drummond de Andrade 'O CASO DO VESTIDO'. 
Como experiência, parti do poema original (me valendo da mesma métrica e quantidade de versos do poeta mineiro, bem como de uma ou outra frase), mas propondo uma origem completamente diferente para o objeto Vestido. 
Talvez publique, em outra oportunidade, a segunda experiência que escrevi para esse narrativa-poema-dramaturgia. 



sábado, 6 de março de 2021

Conexão

Somos fantasia, corpos sem beijos,
desejo.

Inalamos o ar, buscando o que seria o gozo pele, suor e saliva.

Devaneios de encontros.
Nossos olhos miragem: mãos, seios, bunda, bocas, peito.
Infinitos em abraços vazios.

Somos movimento no ar.
Reflexo lânguido do que queremos.

Seus cabelos se emaranhado nos meus dedos.
Meu cheiro preenchendo seus poros.
Nossa papilas se molhando,
nos envolvendo.
Sexo de nossos corpos inteiros.

Vivemos a realidade,
conectados em encontro,
Aquecemo-nos.

domingo, 26 de julho de 2020

minha sílaba


"estava cortando a cebola quando o celular tocou"
imagina rasgar a vida pelo meio
minhas dores em mise en place
o sal hidrata os meus lábios rachados
lágrimas tão brancas como o sêmen do meu homem
perdi o olfato a vontade a viagem 
meus cavalos estão trocando sozinhos as selas e os arreios
os cachorros tomam seus banhos
escravos escarro cuspo e menosprezo
enquanto atendo este telefone
queria ir embora com as nuvens
mas vivo sempre deslocada como a terra
ofegante e interessada
a vida aqui é um mangá sentida de trás pra frente
alô


sábado, 6 de junho de 2020

Acordares distantes


Quando o isolamento começou foi o incio da saudade, da coragem.
A gente escolheu seguir por casas diferentes, por dias distantes, por ligações de vídeo em meio ao barulho de silêncios.
E cada acordar se torna abraço do que somos juntos. 

      10h13

O amanhecer

veio no sussurro
das palavras.
Do bom dia
do café
prometido
adiado.
Um acordar de
gosto
compartilhado
nos desejos atos:
das grades tombadas,
da simplicidade
gingada
passeando
entre danças, transas.
Amanhecendo em
risada.




Fabrício Zava e Renata Cirilo Projeto #aoamor

sexta-feira, 22 de maio de 2020

Parar para ver o Outro

O rei invisível
coroado até no nome
Sem proferir uma palavra
Fez o mundo todo parar.

Parar para ver o Outro
o Outro que não é alheio
Já que tudo o que faz por ele
Atinge também a mim
Porque tudo se conecta
Se contagia
Tudo é viral.

Parar para ver o Outro
O Outro a quem sem demora
Se amará mais e agora,
pois a firme garantia no Depois
é coisa que ficou no Antes.

Parar para ver o Outro
O Outro a quem não se via
Os subnotificados
do dia a dia
mascarados de cara limpa
Sem home, mas com fome,
Sem office, mas com óbice.

Parar para ver o Outro
o Outro que também sou eu.

(...)

E já não há retorno
É um caminho sem volta
Para uma nova forma de olhar.
Para uma nova forma de ser.

(...)

O rei invisível
coroado até no nome
Fez o mundo ver,
enfim,
Que sem o Outro
Será o fim.











quarta-feira, 22 de abril de 2020

Cão que lattes

O professor universitário
Mestre em pós-modernidade
Doutor em fenomenologia
Pós-doutor em Filosofia da Consciência
Que fala com desenvoltura
Sobre ética em Espinosa
Epistemologia em Kant
A esfera pública em Habermas
O poder em Foucault
Ontologia em Nietzsche
Não sabe ligar o ventilador.