Esperar pela entrega de um produto comprado pela internet é cruel. Da pizza mais simples ao celular último modelo, o maior zen budista mergulha na ansiedade enquanto a campainha não toca. Esse é um dos motivos de uma greve dos correios dar aflição.
Funcionários da maior empresa de entregas do país de braços cruzados soa absurdo. É tentadora a ideia de diversas empresas privadas disputando nossa preferência com irresistíveis combos de pronta entrega e baixo custo. O problema são os bastidores de nosso conforto.
No filme “Você não estava aqui” (Sorry We Missed You), do diretor britânico Ken Loach, vemos os desdobramentos de um trabalhador que ganha por entrega, sem vínculos empregatícios nem garantias trabalhistas. Se um filme do Reino Unido parece muito distante, podemos abrir a janela e olhar para os entregadores sem vínculos com as empresas daqui.
A empresa pública é uma forma do Estado prestar serviço à sociedade de forma eficiente. Se não é assim que funciona, é isso que devemos reivindicar. Empresas privadas existem para dar lucro, não para oferecer conforto.
A maneira de dar lucro é cortar gastos sem que o cliente perceba. Como empresas de entrega oferecem um serviço, não dá para cortar gastos reduzindo a qualidade do produto, a única forma de aumentar o lucro é explorando o entregador.
É perfeitamente compreensível a indignação causada pelo mau funcionamento de uma empresa pública, afinal é o dinheiro do contribuinte que está em jogo. Por isso as democracias devem ser valorizadas e exercidas. Assim o governo pode e deve ser cobrado pela gestão do que é público, para que faça os investimentos necessários e entregue os serviços devidos.
Empresas privadas de entrega sequer devem cumprir as leis trabalhistas, já que não empregam formalmente os trabalhadores. Por mais que tentem emplacar a ideia do entregador como um empreendedor de si mesmo, na prática vemos pessoas em jornadas extensas, ganhando o mínimo para sobreviver.
Se por um lado a corrupção e má gestão de empresas públicas são passíveis de punição, a falta de empatia com um trabalhador mal remunerado e com jornadas exaustivas é só falta de empatia mesmo.
Ao exercer o direito de greve os trabalhadores dos correios lutam por garantias constitucionais, às quais todos deveriam ter acesso. Para um país mais justo a luta deveria ser para que todos tenham direitos; demandas que extrapolam o desejo de receber mercadorias em casa, com conforto e alienação.
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