E posso garantir uma coisa: sempre houve algo de instável no ar.
Sim, é uma tragédia que crianças cresçam em um país como o Brasil, instável, flutuante. Porque apesar dos esforços dos pais, elas respiram o ar que existe aqui, um ar de uma eterna tragédia se aproximando.
Não lembro quantos anos eu tinha. Meu pai ganhou uns broches que diziam ''Diretas já'', um movimento que crescia cada vez mais, o objetivo era a retomada de eleições diretas ao cargo de presidente.
Eu não tinha a menor ideia do que isso significava, mas adorei os broches, eram a bandeira do Brasil e nela estava escrito ''Diretas já''.
Coloquei na minha mochila e fui para a escola. Ao entrar, senti quando uma professora puxou minha mochila e arrancou meu broche, abrindo um buraco na minha mala. Muito brava ela disse ''aqui não''.
Eu não tinha nem dez anos! Chorei por horas pela minha mala rasgada. Sempre fui de cuidar as minhas coisas e ver minha mala rasgada quebrou meu coração. Era só um broche! Mas no Brasil política é um nervo exposto.
No dia da eleição para presidente, agora em 2022, observei algumas crianças. Pareciam famintas de informação, sem entender o ambiente ao redor delas, estavam inquietas e infelizes.
Sim, o Brasil é um péssimo país com as suas crianças, mas essas nuvens que nos cercam fazem mal a todos.
Lembro da minha infância com essa nuvem das ''Diretas já'', a morte do presidente eleito, Tancredo, o ar instável e sofrido.
Crianças percebem o que acontece, podem não ter condições de entender naquele momento, mas sentem o clima pesado.
De quem é a culpa? De todos. Péssimas escolhas nos levaram a um lugar ruim, quando tudo já estava péssimo.
Ao sair da votação vi um menino esperando o pai. O pai saiu e o garoto entregou um boné, com uma mensagem política. O pai escondeu o boné na calça e disse ao menino ''depois você coloca''.
Lembrei do meu broche. Aqui não, disse a professora.
Já se passaram mais de trinta anos e não esqueci da minha mochila estragada e do meu broche que ela jogou no lixo.
O Brasil é antes de mais nada, um país de ignorantes e pessoas violentas, sem a menor noção do que é democracia.
Nada mudou. Tenho pena dessas crianças. Tenho pena de todos que estamos aqui, em um pântano político, sempre imprevisível, sempre volúvel, sempre Brasil.
Iara De Dupont
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