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domingo, 20 de março de 2016

Menos sangue, mais chocolate

Falta uma semana para a Páscoa. Não sei muito sobre a Páscoa. Sei que era uma festa que já existia nos tempos de Cristo, que por coincidência, dizem, ressuscitou no domingo da festa. Também sei que a data é calculada de uma forma complicada, fazendo com que sempre caia em um domingo, precedido de dias marcantes.

A sexta-feira santa é o dia que não se pode comer carne como símbolo de penitência, para isso muitos trocam o bife por uma farta bacalhoada. Talvez a penitência sejam as prestações em que se deve dividir a conta do banquete.

Mas uma prática que me intriga ocorre no sábado. Tudo bem que como boa parte das tradições religiosas, essa também vem perdendo força, mas sábado é o dia da malhação de Judas. Muito condizente com o perdão e o amor ao próximo pregado pela religião, católicos fazem um boneco de pano e praticam o linchamento simbólico, instigando crianças a apedrejar, espancar, esquartejar e queimar a representação de um ser humano.

A prática não precisa se restringir a Judas. Talvez seria meio desestimulante, ninguém conheceu o cara, só ouvem falar. Não sei se por diversão ou utilidade, mas suspeito que unindo o útil ao agradável, na representação de Judas colocam a imagem de algum odiado da vez. Políticos são sempre bem representados, por vezes algum criminoso que esteja em evidência, uma personalidade de quem não gostam, etc.

Nunca participei de nenhuma malhação de Judas. Histerias coletivas definitivamente não me atraem. De qualquer forma, entre todas as incoerências entre teoria e prática dos católicos, essa é uma que costuma passar despercebida, parece um ato inocente, levado na brincadeira, afinal Judas foi o traidor mor, o malvado indefensável.

Não sei o que Jesus pensa dessa história. O cara perdoou ladrões, defendeu prostituta, ajudou mendigos, era do povão, da galera. Talvez abra uma exceção já que no caso de Judas as consequências foram sentidas por ele na pele, mas o que realmente preocupa são as consequências atuais de se naturalizar e ensinar o linchamento como forma de punição até mesmo para crianças.

De vez em quando algum caso de linchamento no país vem à tona, o que não quer dizer que são os únicos. A barbárie da prática infelizmente é mais comum do que a imprensa nos mostra e indica uma sociedade extremamente violenta e agressiva. Claro, isso não se deve somente a tradição da malhação de Judas, mas transformar o ato em uma brincadeira de criança é uma forma de ensinar desde cedo.

Mesmo em situações que as pessoas não cheguem ao extremo do linchamento, a ideia de que o castigo físico tenha alguma eficácia na punição de um erro é recorrente. Isso reflete a alta taxa de apoio à pena de morte e castigos violentos.

Como forma mais direta vemos como a histeria coletiva transforma pessoas até então pacatas em seres dispostos a aplicar o castigo milenar de Judas em situações cotidianas. Torce para o time rival? Lincha. Praticou algum roubo em área nobre? Lincha. Apoia outro partido político? Lincha. A vizinha é acusada de sequestrar crianças para ritual de bruxaria? Lincha. Ah, era só um boato e a vizinha não tinha nenhuma relação com o caso? Que Deus a tenha e perdoe os linchadores, afinal Deus é amor e sempre perdoa.

É bem comum aceitarmos determinadas práticas que já estão enraizadas na sociedade sem pensar no absurdo que elas representam, ainda assim não custa nada refletirmos sobre o efeito de ações violentas, que pouco a pouco acabam formando uma sociedade extremamente violenta.

Não é difícil imaginarmos alguns nomes que serão homenageados no próximo sábado na malhação de Judas, afinal já tivemos algumas amostras de violência gratuita nas ruas em determinadas manifestações. Acho que vou lançar a campanha “menos sangue, mais chocolate”. Uma vida mais doce vem a calhar ultimamente.

sábado, 7 de abril de 2012

Domingo é Páscoa e resolvi escrever algo a respeito.  Queria um texto que não fosse exatamente confessional, mas que abordasse a tônica, o sentido e a essência da data.  Resolvi recorrer ao meu baú e ressuscitei esse textinho, originalmente publicado no "Diz Que Fui Por Aí", em abril de 2009.  Confiram:

NÃO APODREÇA... RENASÇA!



Fim do primeiro período na faculdade. Provas, entrega de trabalhos, notas... A disciplina era Antropologia Cultural e a professora lembrou da resenha para ser entregue no próximo encontro. Como se tivesse caído de paraquedas no meio da sala de aula naquele instante, perguntei prum amigo que diabo de resenha era aquela. Ele me explicou que era sobre um livro do Roberto DaMatta. Vergonhosamente, nem o nome do livro eu sabia. "O que faz o brasil, Brasil"- foi a resposta.

Desesperado e, detalhe, duro igual a um coco, procurei alguém que me emprestasse o tal livro. Nenhuma alma caridosa se prontificou a me ajudar. Muito mal me deixaram ler a orelha. E em cinco minutos, eu tratei de resumir o que o autor pretendia ali.

Na aula seguinte, lá estava eu, mais cara de pau que nunca, entregando o trabalho conforme pedido pela professora.

Semana seguinte, ela entra em sala, falando que as notas haviam sido muito baixas. A impressão que tava é que ninguém havia lido o livro. Gelei. Crente que era esperto, fui pego no pulo.

Ouvi então meu nome. A professora, em sua mesa, me esperava; o calhamaço de folhas suspensos no ar em minha direção. Aproximei-me, sem graça. Ela, só sorrisos.

"Parabéns! Seu trabalho está ótimo! Nota dez!"

Sim, queridos. Nota dez. Não pensem que me orgulho disso, mas minha trapaceira manobra me garantiu um CR digno no fim daquele semestre. É claro que mais tarde me redimi e li a obra doDaMatta. O livro levanta a questão da identidade nacional. Há algo no Brasil que nos faz únicos. E é disso que quero falar nesse Domingo de Páscoa.

Mas, peraí... Páscoa, O que faz o brasil, Brasil? O que tem a ver uma coisa com a outra?!?

Páscoa é uma festa cristã. Melhor: é a festa cristã por excelência. Melhor ainda: é a festa judaico-cristã por excelência, afinal, ela já era comemorada antes da passagem de Cristo pela terra.

Para os judeus, rememora a fuga do seu povo do cativeiro do Egito. É a passagem da escravidão para a libertação.

Para os cristãos, celebra-se a vitória de Jesus sobre a morte na cruz. Três dias depois, o túmulo de Jerusalém estava vazio e Cristo ressurgia em toda sua glória.

Portanto, meus amigos, não importa que fé você professe - ou que deixe de professar. Vivemos num grande caldeirão de culturas (esse era um dos temas do livro) e, mesmo que a festa de hoje pra você, seja vazia de significado, os ovos de chocolate e as felicitações de Feliz Páscoa não faltarão. É um daqueles tempos em que tudo se impregna, mesmo que seja pelo forte apelo comercial que a data carrega.

De qualquer jeito, fica a mensagem: que o dia de hoje sirva de reflexão. Renasça. A água estagnada apodrece.

Friedrich Hegel (1770-1831)filósofo alemão, interno no seminário protestante em que estudava, durante uma Sexta-Feira da Paixão, teve um insight valioso: a Páscoa nos revela a dialética objetiva do real - tese, antítese e síntese. Viver é a tese, morrer é a antítese e ressuscitar é a síntese. 

Pensa sobre isso, entre um ovo e um bombom... E uma grande Páscoa pra você e pra todos os seus!