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segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Moranguinho

Decidi me render a uma brincadeirinha do Facebook em homenagem ao Dia das Crianças. Pelo puro prazer da nostalgia, claro. Até dei umas boas risadas com quem queria discutir como a foto de um personagem de desenho no perfil poderia combater a exploração infantil, entre outras babaquices. Era uma foto só para matar a saudade. E eu matei.

Quase tasquei o Gato Guerreiro, porque eu era fã de carteirinha do He-Man. Mas não. Teve outra personagem mais marcante na minha infância. E tão marcante foi que povoou minha festa de 1 ano, a primeira de muitas superproduções elaboradas pela minha mãe.

Embora Moranguinho tenha me homenageado, nunca tive a boneca. Talvez por isso eu era tão fissurada pela sua imagem. Talvez por isso, ou nem pensando nisso, meu pai se aproveitou da minha inocência e me contou uma história igualmente inocente. Disse que sabia onde morava a Moranguinho. Era uma casa na rua Ernesto Beuter, bem no Centro da nossa pacata cidade. Uma casa azul, com janelas brancas, decoração singela, com detalhes trabalhados na madeira e um jardim de flores coloridas e árvores frondosas. Casa de boneca.

Acreditei piamente nisso. E toda vez que meu pai fazia menção de sair eu chorava para ir junto e ver a Casa da Moranguinho. Ele estacionava o carro do outro lado da rua e eu ficava por longos minutos contemplando a casa. Era um dos meus grandes prazeres de criança.

Nunca vi a Moranguinho. Hoje tem uma grande loja de móveis construída no lugar. Queria que a casa ainda estivesse lá, para poder bater na porta e agradecer ao morador por ter tido uma casa tão bonita, que alimentou minha fantasia. Sou uma das poucas crianças do mundo que conheceu a casa do seu ídolo. Por mais que seja uma casa de verdade abrigando um desenho e que isso não faça sentido algum, eu tive sorte. Tenho sorte de ter vivido num tempo em que a gente não precisava fazer sentido. Tenho sorte de ter a imaginação a meu favor. Tenho sorte de ter tido um pai paciente aguardando que minha imaginação viajasse em coisas sem sentido.


quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Uns 30, 40 vagões de anos de distância

Perguntei ao homem sentado na estação de trem como se chegava a tal local. Humildemente, ele me passou a informação como se pedisse desculpas. "Não tem placa aqui, né? A gente desce perdido". Puxamos conversa mutuamente. O homem negro, de cabelos grisalhos, perguntou para onde eu ia. "São Paulo". Os olhos pequenos nostalgearam: morei lá. E quase como se não precisasse perguntar, ele completou: ali perto da estação Santa Cruz.

Encontrar um homem em uma estação de trem de Osasco, para quem eu justamente pedi informação, que morava perto de onde eu morava hoje era uma coincidência que não deveria surpreender. Mas surpreendeu. "Foi na década de 70, 80", os olhos se perderam na imensidão das palavras. "Eu andava de carrinho de rolimã na rua Loefgren”. E riu.

A Loef, apelido que lhe dei, é uma descida. É a descida que eu desço todo dia para chegar em casa. Imaginei o homem em versão miniatura descendo a rua toda pilotando o carrinho. Rindo. Difícil imaginar. A minha Loef é cheia de semáforos e carros desembestados.

Como moro numa travessa da Loefgren, falei o nome da minha rua, ele falou a dele e descobrimos que não fomos vizinhos por uns 30, 40 anos. Ele então me fez descobrir que onde eu moro hoje funcionava uma tecelaria, e que a lavanderia bem em frente ao meu prédio era da família de um tal de Marcos, que perdeu os movimentos acidentado em uma moto na rua debaixo. O homem se surpreendeu que a Lavanderia Mirassol ainda existisse. Depois, contou-me que na esquina em frente morava um tal de Rodolfo, homem grande (personalidade indefinida), “que nem sei se existe mais”, e os olhos se perderam de novo na imensidão.

“Tempos outros”, comentei, imaginando que a vizinhança toda deve ter se mobilizado com o acidente do Marcos, devaneando ainda que as crianças da rua deviam se reunir todas as tardes para brincar de rolimã. “Hoje eu não sei nem o nome dos meus vizinhos, não sei quem mora no apartamento do lado”, continuei.

O homem falou ainda um pouco mais, mas pouco, o calo no coração meio que pedindo arrego. Suspirou baixo bem umas três vezes enquanto conversávamos. O trem chegou, nos dispomos em frente a portas vizinhas, mas separadas por vagões distintos. “É, velhos tempos. Bons tempos” e entrou. O homem nunca mais vi. Me deixou com nostalgia de uma São Paulo que jamais conheci.

A Paulista do homem, dos 70, e a minha, recente.