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sexta-feira, 22 de maio de 2015

Os livros de minha filha (parte I): Chapeuzinho Amarelo

Uma das coisas mais legais dessa história de ser pai é poder revisitar a infância. E quando falo em revisitar quero dizer participar do universo infantil só que, desta vez, pela perspectiva do adulto. A literatura infantil tem sido uma dessas revisitas, quiçá a mais interessante. Quando leio um livro pra minha filha (ela tem 2 anos), na verdade, estou lendo pra mim também. É incrível como tem coisas que ela percebe e que às vezes passa batido pra mim. E é igualmente incrível como agora eu percebo coisas e "piro" em detalhes que, quando era criança, simplesmente não me diziam nada. É triste pensar que se os livros para crianças forem lido só por crianças, todo esse tesouro de pirações será negligenciado. Pensando nisso, fiz uma seleção de alguns livros de minha filha que proporcionaram "pequenos momentos de iluminação", como diria a senhora minha esposa. Não são necessariamente os melhores, não são necessariamente os que ela mais gosta e tampouco são necessariamente os que eu mais gosto, mas são aqueles que proporcionaram tais momentos. Comecemos por Chapeuzinho Amarelo!

Chapeuzinho Amarelo

São poucas as histórias que ganharam mais versões do que o clássico conto de "Chapeuzinho Vermelho", a menina de capuz vermelho que foi incumbida de levar doces para a sua idosa avó. Vinda da tradição oral, a história demorou para ganhar uma versão escrita. A primeira compilação (séc. XVII) é catastrófica e pertence ao francês Charles Perrault. Nessa versão não há final feliz: a menina e avó são devoradas por um lobo faminto e ponto final.  A segunda compilação (do séc. XIX, acredito que a mais conhecida) é bem mais atenuada e é de autoria dos irmãos alemães Jacob e Wilhelm Grimm. Aqui aparece a figura do caçador, macho alfa que retira avó e neta vivas da barriga do lobo (ahãn... claro, claro) e levam o pobre animal à morte ao colocar pedras dentro de sua barriga. Mais recentemente, surgiram versões mais ousadas, como a de Orlando de Miranda (intitulada "Chapéu Vermelho II - as bocas do lobo), em que Chapeuzinho, após seu fatídico episódio com o lobo, mudou-se para a cidade grande (São Paulo) e precisa levar medicamentos psicotrópicos para sua avó (que numa dessas também tinha mudado para a paulicéia desvairada), tendo que, para isso, atravessar o Largo do Arouche a noite, com muito cuidado para evitar cair nas armadilhas do "lobo" (aqui representado pela violência urbana). 

Em meio a todas essas versões acredito que existe sempre a ideia moralizante do "bom caminho". A menina de traje claramente comunista só se complica, faz crer a maioria das versões, porque se desviou do caminho sugerido pela mãe, enfim, porque "não andou na linha", o que nos remete à tão recorrente prática da culpabilização da vítima, que foi estuprada porque andava com roupa curta demais, que foi assaltado porque andou por um caminho sinistro demais e por ai vai. Perpassando todo este moralismo está a chamada "cultura do medo", o medo que cada um tem dos "lobos" de nosso cotidiano.

A dupla de gênios Chico Buarque e Ziraldo conseguem resgatar essa essência no clássico "Chapeuzinho Amarelo", a menina que tinha medo de tudo, que era amarelada de tanto medo e que deixava de fazer tudo nessa vida por conta do medo (o que nós deixamos de fazer por conta do medo, hein?). E, entre tantos medos, não podia faltar o medo do lobo, que era seu "medo mais que medonho". E mesmo com tanto medo do lobo (ou seria medo do medo de encontrar o lobo?) um dia Chapeuzinho acabou se encontrando com ele, assim como nós que, sem hora marcada, acabamos por topar com nosso medos por aí.

A grande sacada do livro é mostrar que o medo de uma coisa geralmente é muito mais aterrorizante do que a coisa em si. Ao se deparar com o lobo, Chapeuzinho acaba por achá-lo inofensivo, sobretudo ao compará-lo com o medo que tinha dele. O "lobo" virou tão inofensivo quanto um "bolo". Transformação semântica feita por Chico. Transformação gráfica magistralmente feita por Ziraldo, na ilustração mais incrível do livro (reparem que o vazio deixado entre um lobo e outro vai formando, paulatinamente, a figura de um bolo. Algo parecido acontece quando se repete muitas vezes a palavra "lobo", que com o tempo vai se confundindo com a palavra "bolo").

O casamento perfeito entre texto e ilustração (Ziraldo inspiradíssimo) fazem deste livro um clássico, uma das versões mais interessantes que já li da tão revisitada Chapeuzinho Vermelho. E é por isso que o tirei por alguns minutos da estante da minha filha para mostrá-lo a vocês.

Ah, coloquei abaixo um áudio-livro com a história na íntegra!

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Autor: Chico Buarque
Ilustrador: Ziraldo
Ano da primeira edição: 1970 (a primeira edição ilustrada por Ziraldo é de 1979)
Editora: José Olympio Editora



terça-feira, 22 de abril de 2014

O Fotógrafo: Uma história no Afeganistão

Uma fotografia não é apenas uma imagem imortalizada no papel. Uma fotografia também é o seu fotógrafo. Uma mesma imagem pode ser fotografada de infinitas maneiras dependendo de quem a fotografa, dependendo da intenção e das motivações do fotógrafo. Podem-se variar ângulos, enquadramentos, intensidade de luz, foco e por ai vai. E é por esse aspecto humano, pela alma do fotógrafo que carrega em si, que a fotografia é considerada uma forma de arte, tal qual seus irmãos, o cinema, o teatro, a pintura e, não me venham com preconceitos, a história em quadrinhos.

A lógica é a mesma. Experimente fazer o exercício de ler uma história em quadrinhos com o olhar de um camera man (lembre-se que um vídeo nada mais é do que uma sequência de fotografias). Sim, imagine que está com uma câmera invisível nas mãos! Você perceberá que de uma cena a outra precisará fazer arranjos com sua câmera invisível para poder acompanhar a dinâmica da história. Em alguns momentos terá que usar o seu "zoom" imaginário para mostrar uma cena panorâmica ou para mostrar detalhes do rosto de um personagem. Às vezes terá que mudar o ângulo para poder mostrar o personagem sendo visto de cima pra baixo, de baixo pra cima, de viés, de frente, etc. Nada disso é por acaso, assim como não é por acaso (ou não deveria ser) a ordem com que um escritor vai apresentando as tramas de seu romance ou a paleta de cores que um artista utiliza para compor sua pintura. Tudo é e deve ser intencional e a maneira como se arranja essas variáveis é o que faz cada obra ganhar a marca registrada do artista, sua personalidade.

As artes, como se vê, são expressões interdependentes da alma humana. Elas se prestam harmoniosamente umas às outras. Sendo assim, por que não misturá-las de uma vez por todas, de maneira explicita e sem medo de ser feliz? O quadrinista Guibert, o fotógrafo Didier Lefèvre e o colorista Lemercier, todos franceses, encararam este desafio e o resultado ficou nada menos do que genial. A série de três livros intitulada "O Fotógrafo - Uma História no Afeganistão" (Editora Conrad, 2010) registra com maestria a viagem que Lefèvre fez ao país asiático em 1986, momento no qual os afegãos estavam sob a tensão da invasão soviética ao país, acompanhado da comitiva da Médicos sem Fronteiras. O grande mérito deste trabalho em conjunto é o de intercalar história em quadrinhos e fotografia de maneira perfeitamente harmoniosa, fazendo com que o relato transformado em quadrinho se complemente e ganhe mais verissimilhança acompanhado da fotografia.

Recordem-se que eu disse que uma fotografia também é o seu fotógrafo. Pois bem, Lefèvre estava num país em guerra, caminhando dias sem fim em caravanas precárias, vendo de perto pessoas morrendo, vitimadas pelo horror dos bombardeios. Entretanto, isso não é mostrado na fotografia de Lefèvre da maneira estereotipada com a qual a história oficial nos acostumou. Lefèvre busca mostrar as pessoas comuns do Afeganistão, com seus sonhos e inseguranças, além das paisagens que fazem do país um dos mais bonitos do mundo, segundo ele. Didier não é irresponsável ao ponto de extirpar os problemas do país, mas tem o mérito de mostrar que não é só isso, que o Afeganistão não é sinônimo de guerra ou que até mesmo no meio da guerra é possível se enxergar a beleza.

Em suma, "O Fotógrafo" é uma série que eu estava relutante a ler, mas que foi um dos meus grandes achados recentes. Mais um que recomendo!

sábado, 22 de março de 2014

Graphic MSP: A Turma da Mônica de um jeito que você nunca viu!

A Maurício de Souza Produções (MSP) anda bem saidinha ultimamente. Primeiro apostou na força dos mangás japoneses e no potencial de mercado do público adolescente e criou a Turma da Mônica Jovem. A aposta deu certo, as edições não param de sair e até já foi criada a Chico Bento Moço, revista que coloca o menino Chico Bento, agora um jovem universitário, se virando na cidade grande. Depois, em 2009, para a comemoração dos 50 anos de carreira de Mauricio de Sousa, foi lançado o projeto MSP 50, uma série de três livros (MSP 50, MSP+50 e MSP Novos 50) em que diversos artistas (50 em cada edição) foram convidados para fazer releituras dos personagens da Turma da Mônica. Ideia inovadora e genial, encabeçada pelo editor Sidney Gusman, e que presta uma grande homenagem ao grande mestre do quadrinho brasileiro que é Maurício de Sousa (ainda que criticas possam ser feitas ao caráter extremamente comercial que acabou se tornando a Turma da Mônica e seus trocentos produtos licenciados).

Se ver a Turma da Mônica ficando adolescente, casando e envelhecendo possa ser algo deprimente, ainda que bastante inovador no mundo dos quadrinhos, ver ela ganhando novos traços na mão de outros artistas é algo que considero particularmente divertido, sobretudo para quem passou a infância lendo as histórias do lendário bairro do Limoeiro. Eis alguns resultados do projeto:

Jotalhão, Cebolinha, Magali, Mônica, Cascão e Franjinha,
por Felipe Massafera
Sansão, Mônica e Cebolinha, por Adão Iturrusgarai

Chico Bento, por Vitor Caffagi


Os trabalhos foram tão bem recebidos que ganharam juntos 6 prêmios HQ Mix, uma das maiores premiações da nona arte brasileira. Além disso, os artistas da própria MSP foram convidados a deixar o rigoroso padrão Turma da Mônica de desenho para produzirem livremente em seus próprios estilos, o resultado foi o livro Ouro da Casa, de 2012, representado aqui por esta versão de Mauro Souza para os personagens Rolo, Zecão, Pipa e Tina:

Rolo, Zecão, Pipa e Tina, por Mauro Souza
Com tanta aceitação, de crítica e de público, a MSP não pararia por aí. O que era apenas uma homenagem virou um grande plano infalível, mas não aqueles desastlosos arquitetados pelo Cebolinha, mas uma bem sucedida criação de graphic novels da Turma da Mônica, assinada por alguns dos artistas do projeto MSP 50: surgia o selo editorial Graphic MSP. Para quem não sabe, graphic novels são publicações em quadrinhos com roteiro maior e geralmente mais desenvolvidos do que o das publicações que vemos nas bancas. Geralmente são editados em capa dura e com material de boa qualidade. As quatro primeiras edições (com as capas mostradas abaixo) foram lançadas entre 2012 e 2013. São elas: Astronauta  - Magnetar, por Danilo Beyruth, Turma da Mônica - Laços, pelos irmãos Vitor e Lu Cafaggi, Chico Bento - Pavor Espaciar, por Gustavo Duarte e, mais recentemente, Piteco - Ingá, pelo paraibano Shiko.

Capas das primeiras edições do selo Graphic MSP

O segundo deles (Turma da Mônica - Laços) já caiu em minhas mãos e posso dizer que vale muito a pena. Maurício de Souza, ao conhecer a história do Chico Bento que Vitor Cafaggi fez para o projeto MSP, teria dito ao seu editor Sidney Gusman "Quem é o Vitor Cafaggi? Eu quero casar com ele". E ele não estava exagerando. A riqueza de detalhes e o cuidado com cada traço faz do trabalho de Cafaggi algo para não se cansar de ficar admirando. Mas a cereja do bolo é a parceria com sua irmã mais nova, a até então pouco conhecida Lu Caffagi. As cenas de flash back desenhadas por Lu (veja abaixo) são pura covardia, capazes de provocar bons sentimentos até nos mais brutamontes. O livro começa justamente num desses flash backs, que narra o momento em que Cebolinha, ainda bebê, ganha seu cãozinho Floquinho. Esta cena, aliás, é fundamental para o enredo que trata justamente do desaparecimento do pobre animal. 


A trama é bem simples, mas na prática é o que menos importa, já que a arte e as surpresas que os irmãos espalharam pela HQ já valem si mesmas. Deveria eu revelar spoilers? Claro que não. Mas saibam que referências dos anos 80 pululam por entre as páginas, caracterizando uma homenagem à infância de muito marmanjo. E não pense que as referência ficam apenas ao mundo dos quadrinhos. A Magali, por exemplo, pode ser vista comendo churros na barraca de um certo Sr. Ramon antes de entornar um refresco de tamarindo. Zás, me escapuliu um spoiler!



A Panini ainda não está lançando os volumes com periodicidade regular, mas a expectativa é que sejam lançados trimestralmente a partir de 2015. Para 2014, no segundo semestre, já existem 2 lançamentos programados. Em Agosto, será lançada Bidu, por Eduardo Damasceno e Luis Felipe Garrocho. Em dezembro, será lançada Astronauta II, assinada pelo mesmo Danilo Beyruth de Astronauta - Magnetar. Programados para 2015 estão Penadinho, por Paulo Crumbim e Cristina Eiko, Papa-Capim, por Marcela Godoy e Renato Guedes, Turma da Mata, com Tocchini, Calil e Fujita e, por fim, Turma da Mônica 2, com os mesmos irmãos Cafaggi, de Laços. É só aguardar!

Capas das Graphic Novels previstas para 2014 e 2015

Não sei até onde eles vão chegar, mas uma coisa é certa: a Rua do Limoeiro nunca mais será a mesma!

Abraço,

Felipe Lários

Atualizado em 25.03.2014:

Como eu gosto de matar a cobra e mostrar o pau, de contar o milagre e dizer o nome do santo, segue o link: https://docs.google.com/file/d/0B066HbH0NhBwZGRDUzBTY1dtQm8/edit

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Gen - Pés Descalços

 Para aqueles que não gostam de se influenciar antes de ler qualquer coisa, um resumo do post: LEIA Gen - Pés Descalços!
(Um amigo, pois quem avisa amigo é)


Fazia uma linda manhã de sol em Hiroshima. Já passava das oito e o povo da cidade já tomava às ruas para mais uma segunda-feira de muita luta. Os adultos partiam para o trabalho para tentar garantir o sustento de suas famílias, o que nem sempre era fácil, já que o Japão estava em guerra e a maior parte dos alimentos servia para alimentar os soldados que estavam no front. As crianças caminhavam para mais um dia de aula, sempre na esperança de na volta encontrarem mais comida em casa que no dia anterior. O céu estava azul e sem nuvens e quem olhasse para ele veria um avião...

(...)

... um avião que algumas horas tinha partido do outro lado do mundo carregando uma bomba de urânio, a grande promessa do casamento entre a física moderna e a indústria bélica naquelas primeiras décadas de século XX. Promessa esta que era capaz de produzir uma reação química em cadeia e, em segundos, destruir vidas de milhares de pessoas como eu e você, a quem pouco importava a física moderna ou a indústria bélica.

E assim se fez. Alguém decidiu que aquelas pessoas - homens, mulheres e crianças inocentes - deveria morrer naquela manhã de 6 de Agosto de 1945 e quem olhasse para o céu azul de Hiroshima veria que do avião caia uma luz mais forte do que milhares de flashes juntos, uma luz que se aproximava e se intensificava e que, 45 segundos depois de ter surgido no céu de Hiroshima, consumava o maior crime de guerra da história da humanidade. 

Não satisfeitos, e sem a esperada rendição do Japão, os EUA fizeram o mesmo com outra cidade japonesa. Três dias depois, uma outra bomba - desta vez de Plutônio -  destruía a cidade de Nagazaki . 

O mundo jamais seria o mesmo.

(...)

Cento e quarenta mil pessoas morreram naquele e nos dias subsequentes em Hiroshima. Cerca de oitenta mil morreram em Nagazaki. Outras milhares continuaram morrendo nos anos e décadas seguintes por conta dos efeitos da radiação. Entre os sobreviventes estava um menino de 6 anos que só não morreu porque o muro de sua escola o protegeu dos efeitos da bomba. Seu nome era Keiji Nakazawa, o autor de Gen - Pés descalços.

Gen - Pés Descalços é uma daquelas obras-primas que devem ser lidas por todo aquele que respira. São 10 volumes (dos quais 5 já foram traduzidos pela Editora Conrad para o português) em que Nakazawa narra a história de sua família desde alguns dias antes do fatídico 6 de Agosto de 1945, passando pelos terríveis desdobramentos que a explosão da bomba atômica causou na população de Hiroshima. O poder narrativo de Gen é impressionante e me fizeram ler mais de 1000 páginas de mangá (os 4 primeiros volumes) em apenas 9 dias. O fato de Nakazawa ter vivido tudo aquilo torna tudo mais real, mais palpável, e a empatia com cada personagem é inevitável. A impressão que tinha é que estava lendo a história de um amigo próximo.

São muitas as questões que podem ser extraídas deste fantástico mangá, questões estas que não podem ser encaradas como questões do passado, mas questões eternas. E este é o grande mérito de Nakazawa: ele dá vida e voz para os mortos de Hiroshima (e Nagazaki). Saliento, entretanto, que a crítica contida em Gen não se restringe aos EUA, mas à própria guerra em si. Ele critica o próprio governo japonês, que liderados por um imperador com status de Deus (Hirohito), impelia milhares de jovens para morrer numa guerra cada vez mais sem sentido. Critica as guerras, todas as guerras, porque sempre os maiores prejudicados não são aqueles que fazem a guerra, mas invariavelmente a população mais pobre, vide os conflitos atuais no Oriente Médio.

E Como após ler Gen não conseguia parar de pensar no assunto, segue abaixo outras produções com as quais me deparei nos últimos dias.

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Gen - Pés Descalços (anime)

Em 1983, Gen foi adaptado para o cinema. Não gosto de fazer a clássica afirmação "o livro (ou o quadrinho) é melhor que o filme" porque entendo que são duas artes distintas  e sem comparação. O primeiro anime é uma adaptação dos 4 primeiros livros, além de passagens que não constam no mangá. Recomendo que o anime seja assistido após a leitura dos mangás. A versão que está lincada aqui está com legenda em inglês, porque recentemente o You Tube retirou a versão em português. Entretanto, ainda é possível encontrar a versão fragmentada em vários videos pequenos.


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Luz Branca, Chuva Negra: A destruição de Hiroshima e Nagazaki (filme de 2007) 

Keiji Nagazaki é um dos 14 sobreviventes entrevistados neste ótimo documentário dirigido por Steven Okazaki. O maior trunfo do documentário é a raridade do material exibido, mostrando cenas da época, bem como trazendo histórias de pessoas que sofrem até os dias de hoje por conta da bomba.

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Hiroshima, a cidade da calmaria (mangá de 2005, de Fumiyo Kouno)

Com um traço leve e uma narrativa quase poética, o mangá feito em decorrência dos 60 anos das bombas de Hiroshima e Nagazaki, mostra a história de duas jovens que não viveram a época da guerra, mas que ainda assim são marcadas pelo estigma da bomba. A mangaca mostra como uma bomba lançada há 60 anos ainda está provocando seus efeitos devastadores.
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Keiji Nakazawa morreu de câncer no último mês de Dezembro.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Pedro e Bianca



Pedro e Bianca é a mais nova série da TV Cultura, de São Paulo. 

Acabei descobrindo a série por acaso e resolvi assistir porque duas coisas me chamaram a atenção logo de cara: a primeira delas é que um dos criadores é nada mais, nada menos que Cao Hamburger, conhecido por ser diretor de ótimos trabalhos como "Castelo Rá-Tim-Bum" (para a própria TV Cultura), "O ano em que meus pais saíram de férias" e "Xingu" (estes para o cinema). A segunda foi o fato da série ser gravada na Escola Estadual Alberto Torres, escola em que minha mãe estudou nos anos 50 e que fica no bairro do Butantã, a uns 10 pontos de ônibus do prédio onde habito.

Pedro (Giovanni Gallo) e Bianca (Heslaine Vieira) são dois irmãos gêmeos, de classe média baixa, que vivem na periferia de São Paulo. Até aí tudo bem. A peculiaridade desta família logo é percebida, no entanto, quando percebemos a total falta de semelhança entre os dois irmãos. Numa possível, porém improvável coincidência genética, Pedro é branco como a mãe (Gorete Milagres) e Bianca é negra como o pai (Thogun Teixeira). Outra idiossincrasia desta família é o fato do pai ter sofrido um acidente em seu trabalho de eletricista e sofrer algumas descargas de eletricidade quando fica nervoso.

Pois é, mas não pensem que Pedro e Bianca é uma série pós moderna cheia de personagens com poderes especiais. Não. A cota de fuga do cotidiano se resume aos dois casos já citados. Todo o resto de Pedro e Bianca é bem palpável, bem humano até. E esse é o maior trunfo, o maior diferencial da série em relação a outras produções semelhantes. A começar pelo fato das cenas serem gravadas numa escola pública, com problemas de escola pública, tendo por figurante os alunos da própria escola e tendo por pauta problemas vividos, de fato, por estudantes de escola pública.

Até mesmo em produções da própria TV Cultura, o tema "escola" quase não aparece. Em "O Mundo da Lua", Lucas Silva e Silva (Luciano Amaral) frequenta uma escola particular e que quase nunca é citada. Em "Castelo Rá-Tim-Bum", Pedro, Biba e Zequinha (Luciano Amaral, Cinthya Rachel e Freddy Allan) apenas se referem "que foram à escola hoje", enquanto Nino (Cássio Scapin), do alto de seus 300 anos, não frequenta escola alguma. Na Rede Globo temos, há quase duas décadas, a novela "Malhação", mas esta está longe, muito longe, de representar a realidade do jovem de periferia. As demandas são definitivamente outras.

Em Pedro e Bianca, temos a dificuldade de conciliar o trabalho com os estudos. Temos as possíveis tensões que podem ocorrer diante da chegada de um estudante que acaba de sair da Fundação Casa. Temos o traficante que tenta tirar vantagem da falta de dinheiro dos estudantes da escola do bairro. Temos retratados problemas que bem poderiam ser os da escola em que estudávamos ou da escola pública ali da esquina.

É isso. Tenho medo de sair contando mais coisas e estragar possíveis surpresas.

Pedro e Bianca é indicado para adolescentes e para interessados em adolescentes (me refiro aos educadores e não aos pedófilos). Como não é lá muito divulgado, acredito - temo - que poucos sequer saibam de sua existência. Então, vamos lá: Pedro e Bianca é exibido pela TV Cultura, aos sábados e domingos, às 14 horas. Para os que não assistem TV, todos os episódios podem ser vistos no site da TV Cultura: http://tvcultura.cmais.com.br/pedroebianca/episodios/exibidos

Para dar uma amostra, segue o primeiro:



É isso.

Um abraço e até 22 de Agosto,

Felipe Lários

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

A invenção da infância

Outubro passou e novembro já vai a galope, mas acho que a discussão sobre os pequenos é tão grande que não cabe em apenas um mês, então, se me permitem, segue mais um dedinho de prosa sobre o tema:


Ser criança não significa ter infância. 

A ideia de infância é uma invenção como qualquer outra invenção. Foi criada no contexto das grandes invenções com vias de proporcionar ao homem uma fase ideal na vida, uma fase em que pudesse simplesmente desfrutar dos pequenos prazeres da existência, sem se preocupar com horários, com projetos, com o trabalho, com o consumo. Uma fase em que pudesse simplesmente ser.

Mas, como qualquer outra invenção, a infância acabou por ir tomando outros rumos e se confundindo com o mundo adulto. Cada vez mais, o tempo infantil é marcado pelo ponteiro do relógio e os compromissos, quando já não estão introjetados, são devidamente registrados em sofisticadas agendas. Cada vez mais, o "que vou ser quando crescer" é mais importante do que o "do que vou brincar depois do almoço". Cada vez mais e cada vez mais forte, uma poderosa indústria voltada para as crianças vem formando uma legião de pequenos e ávidos consumidores.

E, se por um lado a invenção da infância fracassou com uma criança que consome, que tem compromissos e que faz planos para o futuro, ou seja, uma criança de classe média, ela não foi mais exitosa para aquelas que não podem consumir e que, por vezes, nem vislumbram um futuro. Para estas, a fronteira entre a vida de criança e vida de adulto é ainda mais tênue, ficando as diferenças apenas no aspecto biológico. Estas crianças são pequenos trabalhadores que pensam e agem como adultos, que sabem exatamente quanto custa o quilo do tomate e o quanto precisam trabalhar para consegui-lo. Nada mais distante que a ideia - romântica - de infância.


A infância é, portanto, além de uma invenção sem grandes êxitos, um tema profundamente delicado e importante. E é com delicadeza, mas também com muita seriedade, que este tema é trazido nos singelos 26 minutos do documentário "A invenção da Infância", de Liliana Sulzback, que recomendo a todos os que se interessaram por este texto inteiramente inspirado no curta que pode ser visto aqui.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Lá vem o Chaves! Chaves! Chaves!

"Teria sido melhor ver o filme do Pelé!".

Acredito que todo mundo já tenha ouvido a frase acima. Ela foi proferida, num momento de muito tédio e enfado, pelo famoso Chaves, personagem famosisisíssimo de Roberto Gomez Bolaños. Entretanto, o que pouca gente sabe é que esta frase saiu da imaginação fértil de nossos distintos dubladores. Quem ouviu a frase no original, em espanhol, pôde perceber que o que o impaciente menino realmente disse foi: "Hubiera sido mejor haber ido a ver la película, 'El Chanfle'".

Isso, isso, isso mesmo! Apesar de Pelé ser famoso mundialmente e de já ter se aventurado na carreira de ator (veja aqui, aqui e aqui!), não era ele o homenageado pelo menino da Vila (me refiro, evidentemente, à vila em que morava Chaves e não à Vila Belmiro). Na verdade, a frase era uma tentativa de promover o filme El Chanfle, de 1979, que teve roteiro assinado por Roberto Bolaños e a participação de todos os principais atores de "Chaves". Apesar de não ter tido muita repercussão em terras brasileiras, o filme foi sucesso nas bilheterias mexicanas e teve sua continuação lançada 3 anos depois.

Sem querer querendo, num momento de muito tédio e enfado, acabei encontrando esta verdadeira relíquia na internet, muito melhor do que qualquer filme do Pelé!

Neste simpático filme, podemos ver a gentalha do Seu Madruga interpretando Reyes, o técnico do América do México, clube que conta com Valentino (o Kiko, tesouro, coração, o menino com bochecha de buldogue velho) como seu mais ilustre craque! Rubén Aguirre (o bom e velho Professor Girafales) interpreta o Sr. Matute, o presidente do clube. Temos ainda Maria Antonieta de las Nieves (a Chiquinha) como secretária do Sr. Matute e Édgar Vivar (o Sr. Barriga) interpretando o Dr. Nájeras, médico da equipe.

Como não poderia deixar de ser, o protagonista do filme é interpretado por Roberto Bolaños. Chanfle é o humilde roupeiro da equipe mexicana e fica assistindo do banco de reservas todo o talento de Valentino nos campos. Tal qual Chaves (e Chapolim), Chanfle é bastante atrapalhado e desastrado, proporcionando o humor típico dos personagens de Bolaños. Entretanto, nem só de humor vive o homem. Chanfle não mora num barril, mas não tem vida fácil, não. Mora numa casa caindo aos pedaços com Tere (vejam só vocês como é o destino, a Dona Florinda se misturando com a gentalha!) e sofre o drama de não conseguir ter um filho, apesar de ser casado há 10 anos.

Além disso, a trama conta ainda com a participação de Raul Padilla (o Seu Jaiminho) interpretando Paco, marido de Cajera (a Bruxa do 71, vejam que casal!).


Entre o drama familiar de Chanfle e Tere e as venturas e desventuras deste curioso América do México, nostalgicamente vamos reencontrando velhos amigos. Quem anda com saudade de um humor com menos bundas e peitos ou para quem sempre gostou dos personagens do "Chaves" (e gostaria de vê-los hablando en español), esta é uma ótima oportunidade! Comprem um sanduíche de presunto na padaria lá da esquina....e zás...chamem toda a vizinhança...zás... e desfrutem 96 minutos de pura nostalgia... pois é, pois é, pois é!