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terça-feira, 27 de março de 2018

Homem Vitruviano

Eles estavam há mais de duas horas ali. Na mesa, garrafas de litrão se acumulavam. Seu João se aproximou cuidadosamente, como se não quisesse incomodá-los:
-O bar está fechando... Vocês podem acertar a conta?
Saíram ainda inflamados pela discussão. Ele gesticulava muito. Ela sorria ironicamente.
-Vocês não entendem! Há algo muito maior do que todas essas questões de identitarismo. Vocês estão sendo usados para nos enfraquecer, nosso alvo maior é a economia, deve ser ela, estamos brigando por bobagens – ele dizia inconformado.
-Bobagens? Minha liberdade é inegociável, vou brigar por ela no primeiro plano, não vou deixar pra depois. Você diz isso porque é homem e branco. – Após uma pausa, ela disse calmamente: “Você não entende os próprios privilégios...”.
 -Sabe, é isso que ta insuportável! A gente não pode mais conversar sem vocês apontarem o dedo “porque eu como mulher”, “porque eu como negro”, “porque você como homem branco”... Cara, não dá, a gente não consegue mais conversar sobre política ou qualquer outra coisa sem ouvir isso. Qualquer opinião que eu dou, lá vem o dedo me apontando. O cara dá uma “escorregada” e pronto! Já é linchado, sem levarem em consideração todo o seu histórico e o que ele fez pela nossa causa. A mina é assassinada porque estava brigando com os grandes da corrupção policial e política e só falam que ela era negra, da periferia, lésbica, como se isso tivesse alguma coisa a ver... Eu te amo, mas odeio quando você fica com essa sua cara arrogante! Por que a esquerda...
-A esquerda?! Diga, meu bem, como nós acabamos com a esquerda unificada e forte, pronta para iniciar a revolução!
-Tá vendo! Como vamos construir algo assim?
-Exato! Como vamos construir algo assim? Sabe qual é a novidade? Vocês, homens brancos de classe média/elite, nunca se deram conta de que são a régua padrão para tudo simplesmente porque o seu corpo tem passe livre. Vocês nunca se deram conta de que os corpos são marcados socialmente, que quando alguém me vê, o meu corpo chega antes do meu argumento porque vocês nunca viveram isso até agora. Mas se aplica a vocês também. O lance é que vocês dispõem de uma falsa neutralidade, que é de dominância.
-Eu sei, mas acho que vocês exageram, porque tem gente que é muito radical e aonde vamos parar? Você não acha?
-Não.
-Você não acha radical?!
-Não. Acho que sem questionar as coisas na raiz, nunca conseguiremos avançar. Eu não quero lutar por uma sociedade justa ao lado de pessoas que não me enxergam e não me tratam como par. Que me interrompem quando estou desenvolvendo um argumento, que me tratam como se eu fosse uma criança, explicando coisas que obviamente sei, que me assediam de forma constante e inoportuna...
-Mas e a paquera?
-Não. Eu me recuso a falar disso de novo. Chega! Estou cansada. Meu ônibus está parado ali, eu vou indo.
Ele baixou a cabeça chateado.
-Você não vai me dar nenhum beijo? – Ele perguntou sem jeito, sem se sentir seguro o suficiente para tocá-la.
Ela o encarou e sorriu.

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Ela partiu

Gabriela se apaixonou pela primeira vez aos 16 anos. Sentiu tudo aquilo de que falam os filmes românticos: pontada na barriga, mãos tremendo, suor, coração palpitando. Não demorou muito até que começaram a namorar e tiveram o primeiro filho. Foram morar juntos. Depois vieram o segundo filho e a primeira grande decepção na vida: o marido tinha uma amante. Sem aceitar desculpas ou explicações, Gabriela pegou os dois filhos, partiu e nunca mais voltou.

A pensão do pai não era o suficiente para atender todas as necessidades dos filhos pequenos, mas ela enfrentaria isso com toda a força que Deus dá. Difícil era aguentar as cobranças dos irmãos de congregação: “essas crianças precisam de um pai, Gabriela. Você precisa dar um jeito nisso”. Ela ouvia isso quase todos os dias.

Certo dia apareceu um homem novo na igreja, vindo do Rio de Janeiro. O carioca parecia ser homem bom, trabalhador e estava mesmo interessado em Gabriela. Ele dizia não se importar que ela já tivesse filhos; assim, logo casaram e tiveram mais dois filhos.
I am mine

A caçula estava com 5 anos, seria esse o sinal? Certo dia, Deus revelou durante o culto: “cuidado, há uma serpente debaixo da sua cama”. Ela já sentia, estava acontecendo. Não queria acreditar, Deus não podia estar deixando isso acontecer de novo, o que diriam as pessoas? No começo, ainda resistiu um pouco. Não tomaria nenhuma medida a menos que tivesse a prova do crime. “Me mostre, Deus. Me mostre a verdade”.

Deus a ouviu. Durante uma conversa com o irmão Jorge, soube que sua prima trabalhava no mesmo local que o marido. “Qual o nome dela?”, quis saber. “Roberta”, respondeu inocentemente o outro. Quando ouviu o nome da mulher, sentiu uma pontada instantânea na barriga. Era ela. Mas queria mais do que saber, queria ver com os próprios olhos. Aguardaria o momento certo.

Quando julgou ter chegado o dia, pediu para o irmão Jorge ligar para casa da prima para saber se ela estava em casa. Frente a resposta positiva, deixou as crianças com a vizinha e partiu em busca da verdade. Tocou a campainha. A mulher atendeu. Com a ira contida, Gabriela se apresentou como sendo esposa de Ricardo. Sem espaço para reação da outra, Gabriela a abraçou e lhe disse ao pé do ouvido: “Jesus te ama. Posso entrar e tomar uma água?”.

Tempestivamente, Gabriela adentrou na residência. O marido estava sentado no sofá. Gabriela o olhou com desprezo e sem lhe dirigir a palavra, lançou orações ao ar. Estava persuadida de que o mal estava presente naquele ambiente e precisava mostrar toda a força divina a que servia. Cansada, sentou-se, bebeu um copo de água e disse para o marido “vamos embora”.

A sós, ele tentou convencê-la de que seria bom pra todo mundo se as coisas ficassem iguais, ser divorciada de novo não seria bom pra Gabriela, o que os outros diriam, e ele não abriria mão da nova paixão, disse tudo isso sem ser interrompido. Gabriela o ouviu calmamente. Sem o olhar, disse que ele tinha um mês para sair de casa. “Acabou”, disse sem emoção. E quem vai contrariar uma mulher quando esta toma uma decisão?

Gabriela se viu sozinha com os quatro filhos. Os mais velhos estavam enlouquecendo-a. Não aguentava mais carregar tudo aquilo. Sabia que a decisão mais acertada seria mandá-los a responsabilidade dos pais. “Filhos são uma benção, você é a mãe”, os irmãos da igreja diziam; “e eles os pais”, Gabriela retrucava, “não estou jogando meus filhos na rua, eles estão indo morar com os pais”.

A vida continuou dura para Gabriela. Mas quando foi fácil? Agora era ela e a caçula apenas. O relacionamento com os filhos mais velhos melhorou muito desde que não moram mais juntos e assim, ela segue seu caminho, apesar de todos os dedos, apesar de...

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

O Mergulho

"Você tem que se amar antes de amar o outro". Perdi as contas de quantas vezes ouvi esta frase nos últimos anos, ignorando todos os sinais e dizendo que a superfície era mais segura e confortável que um mergulho (interno). Até que em algum momento, o ar dessa superfície me deixou tão sem fôlego quanto pular nas profundezas.

Eu, que nem sou fã de Engenheiros do Hawaii, me vi cantarolando "Feche os olhos, tome o ar: é hora do mergulho. O poço não é tão fundo, super-homem não supera a superfície".

Saltei. Mergulhei. Estou mergulhando, Consigo descer mais. Não é tão escuro quanto parece, não é tão assustador, não é muito bagunçado. É apenas um lugar com espelho mostrando sombras que são nossas. A primeira lição é que além de amar o outro antes de si mesmo, também é preciso parar de projetar nossas sombras no outro. E aqui, eu agradeço ao Jung e sua sabedoria.

Não volto à superfície tão cedo. 


domingo, 11 de setembro de 2016

O amor é maior que isso.

Bom vamos lá... 
Esses dias eu assisti todo o filme Como eu era antes de você, eu digo todo porque havia lido o livro, que por sinal procurei quase em todas livrarias aqui perto de casa e acabei fazendo o download para ler, quando terminei quis jogar a mídia pela janela. 
Mesmo assim decidi ver o filme, as vezes eles mudam as coisas, as vezes não... 
Comecei, quando vi que ia acabar no mesmo final grotesco e fatídico parei. 
Massss esses dias estava de bobeira e resolvi ver de novo mas a mesma sensação que fiquei quando o livro terminou, talvez até um pouco maior para o filme foram a mesma: 
- MAS QUE PORRA É ISSO? 

AVISO: -Não continuem lendo se você não assistiu o filme e pretende assistir... 

Esse filme é uma história de amor magnífica que poderia ser mostrada como superação, vitória, conquista e motivação mas nãooo a autora resolve passar o que na minha opinião uma imagem negativa de que o amor NÃO é nada de mais além do amor... 
Não importa o quanto você ame ou se dedique, se algo muito ruim acontecer deveremos entender se você preferir se matar. 
O cara tinha uma vida maravilhosa aí acontece um acidente, ele fica tetraplégico a namorada larga ele e resolve se casar com o melhor amigo dele (genteee que melhor amigo faz isso?), como se tudo isso já não fosse ruim o suficiente depois disso ele se apaixona de novo por uma mocinha que também se apaixona por ele mas mesmo assim, a decisão dele de cometer eutanásia ou seja lá como isso se chama não muda. 
Não era pra ser uma mensagem de amor? 
Olha! Na boa pra mim esse filme é uma merda. 
Se não podemos acreditar que o amor salva, que muda sua vida para algo melhor já poderíamos sair correndo para o precipício, (kkkk) a vida não faz mais sentido. (em choque) 
Eu sinceramente fiquei chocada com esse filme, por que já têm tantas coisas ruins nessa vida ai vem mais essa com o amor... Poxa logo o amor? 
Posso não ter entendido o filme, ou a real mensagem que a autora quis passar, a única coisa que ficou foi a tristeza de que só o amor não basta pra nada. 

Mas quero deixar claro que eu acredito no amor, acredito que ele possa salvar vidas, almas e tudo que ele toca de verdade. 
Acredito que ele é iluminado e ilumina tudo. 
Sigo acreditando.

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Love Hurts

 Nas paixões, a razão nos desampara.
Bocage

Ilustração: Verônica Vilela


O tempo estava agradavelmente quente. Denis saiu animado de casa para encontrar o grupo de amigos. A noite seria de muito barulho. Na verdade, suas preferências musicais mudaram muito desde a adolescência, quando era fã de Nirvana. Agora preferia musica brega dançante. Combinava melhor com os botecos que frequentava. Mas Adailton insistira tanto para acompanhá-lo que Denis aceitou a dose de nostalgia. Os dois amigos se encontraram em frente à pracinha de sempre:

- E a Letícia, hein? Ela é gente fina. Tomara que a amiga dela seja simpática.

-É... - disse Denis um pouco desanimado.

-Pô! O que importa é que a gente vai curtir hoje, né não? O show vai ser massa, cara!

Uma hora depois e estavam todos reunidos. A casa de show estava cheia. Tanta gente usando roupas pretas fez Denis se lembrar de Ana. Há bastante tempo não se falavam. Lembrou-se daquele dia em que estavam jogando conversa fora e ela lhe mostrou as músicas gravadas no celular, eles tinham gostos em comum. Aliás, tinham tanto em comum, eram mais parecidos do que imaginavam. Do que desejavam. Ou deveriam. Ele odiava o orgulho dela. Mas isso não importava mais. Era passado.

O show iniciara com uma musica animada. Letícia pediu para se aproximarem do palco e todos concordaram. Eles se encaminhavam quando Denis parou instintivamente em um ponto aleatório do público. Sentiu uma sensação estranha na nuca, que lhe acometia sempre que era observado por trás, de modo que se virou para procurar quem o observava. A uma distância de um palmo estavam aqueles malditos olhos de olhar incisivo...

Ana e Denis ficaram se olhando. Ambos esperavam a iniciativa do outro para romper o silêncio. Desconcertado, Denis sorriu primeiro. Ana sorriu de volta com olhos. Ela disse “oi” sem emitir som, num gesto sutil com os lábios. Denis se sentiu encorajado para cumprimentá-la. Ele pôde sentir o cheiro de perfume quando se aproximou dela, mas então se lembrou de ter visto um rapaz e se afastou. Sim, havia um desconhecido ao lado de Ana. Denis o encarou rapidamente, julgando que era melhor evitar constrangimentos. Virou-se para Letícia e disse “vamos pra lá”.

Denis e Letícia se juntaram aos amigos próximos ao palco. Letícia se queixava com sua amiga, especulando sobre a identidade da moça. Enquanto isso, Denis disse ao ouvido de Adailton “é a Ana”. O amigo não teve dúvidas em procurá-la com os olhos pelo público. Ela é mais bonita pessoalmente. “Mas e esse cara? Será que eles estão namorando?”, perguntou aflito Denis. Adailton não soube responder.

A amiga tentou consolar Letícia, dizendo que ela não deveria se preocupar, mas não adiantou. Letícia decidiu agir e usou todo o seu poder de sedução, beijando longamente o companheiro. Ao abrir os olhos, Denis procurou novamente por Ana, mas ela tinha desaparecido. Mais uma vez. “Não importa. Passado é passado”, repetiu para si intimamente.

quarta-feira, 25 de maio de 2016

O "Não relacionamento"

Quando é que a gente sabe que está num relacionamento? É preciso verbalizar? 

Relacionar-se precisa de um aval?

Eu que sempre fui do "deixa a vida me levar, vida leva eu" me senti incomodada recentemente por estar num "Não relacionamento"

Estar com a pessoa é maravilhoso, o silêncio à distância não é. Já estive em "não relacionamentos" alimentados por longas conversas sem estar perto fisicamente e é como se eu sentisse a conexão com a pessoa. Aquilo me dava uma falsa segurança de estar próxima a quem tem muitas coisas em comum comigo. Também já estive nesses modelos tradicionais de relacionamentos que, às vezes, se mostram falidos no meio de tantos estímulos atuais. É oferta pra lá, conquista pra cá e você descobre que não há certeza pra nada. E se não há certeza, por qual motivo não viver o tal "Não relacionamento" no modo -deixa a vida me levar, vida leva eu-?

Cá estou, tentando e incomodada. 
No fundo, eu faço parte daquele time que prefere ter a ilusão de que ~tá tudo bem, é só você que eu quero~ vestido do status "Relacionamento".


terça-feira, 19 de abril de 2016

Eu te amo... já??!

E daí que um amigo super querido que não tinha como um dos principais objetivos começar a namorar, foi arrebatado por uma inesperada (e talvez indesejada) paixão. Após um tempo se conhecendo decidiram começar o namoro e após duas semanas recebeu flores em casa com uma mensagem escrito "eu te amo". Compartilhando o acontecimento com os amigos em nosso grupo de mensagens, a primeira resposta foi: "Eu te amo... já?!"
E após todos terem se posicionado surpresos com a rapidez da declaração, eu apenas percebia que não vi absolutamente nada errado ou estranho nessa atitude. Porque é tão estranho assim dizer essa frase em "apenas" duas semanas? Alguém acredita de verdade que exista um período mínimo para se sentir algo? Quem nunca caiu de amores por alguém logo de cara, ou detestou alguma pessoa que nunca ao menos te cumprimentou? Quem nunca sentiu preguiça apesar do dia estar lindo lá fora ou decidiu sair pois se sentia feliz apesar da chuva?
Recentemente temos presenciado nosso país se dividir em duas opiniões distintas. Falta de respeito, intolerância, arrogância, egoísmo... todos esses sentimentos sendo disseminados só por alguém se dizer de direita ou esquerda. E dizer que se ama alguém é o que assusta e nos surpreende? É o amor que precisa ser experimentado e testado antes de se declarar? Os outros sentimentos não, mas o amor deve esperar um tempo?
"Eu não vejo precipitação nenhuma no "eu te amo". Não entendo porque as pessoas vêem nele um período de experiencia necessário para se declarar a certeza. O amor é um sentimento como os outros e um dos mais instantâneos de se identificar, só que as pessoas preferem dar um prazo de carência como se precisassem verificar a exatidão dele. Se você sentiu, ele é real. não interessa se foi no primeiro minuto ou só dez meses depois. Essa frase não devia nunca assustar, pelo contrário, já que se trata de algo que só traz o bem. Admiro e respeito muito as pessoas que verbalizam seus sentimentos independente dos pesos (inexistentes) que as pessoas põe neles."
Dito tudo isso meu amigo se "defendeu" dizendo não concordar e só o que ficou na minha memória foi ele afirmando não acreditar que o amor seja um sentimento tão puro assim. Bem... eu continuo amando meu migo do mesmo jeito, mas perceber que vivo em um mundo onde o racional sufoca nossas emoções e desacredita o que eu creio ter o poder de curar esse mundo doente vai certamente me render algumas sessões de terapia.

sábado, 28 de novembro de 2015

Não vão vencer

Marga coçou os olhos. Do terraço do centro cultural dava para ver uma parte grande da avenida. Não era alto o suficiente para enxergar a cidade inteira, mas era o suficiente para colocar os pensamentos em ordem. O vento bateu no rosto, empurrando as lágrimas e os cabelos ruivos. O dorso da mão rosada passava pelas bochechas cheias de sardas que compunham o rosto redondo.
Um casal passou de mãos dadas.
- Olha que vista bonita! Não sabia que dava pra subir aqui!
- É! Pouca gente sabe!
- Vem cá, vamos tirar uma foto!
Depois de observar a felicidade alheia, desviou os olhos do casal. Não estava afim de chamar a atenção com os olhos inchados. Ajeitou a gola da jaqueta jeans e tirou o cabelo do pescoço, ficou olhando as pontas.

“Red hair is great. It's rare, and therefore superior.”

Deu um sorriso bobo com a lembrança.
O que seria uma lembrança?

...

“O meio no qual você cresceu sempre foi hostil, violento...”

...

“Não é à toa que você é tão retraída, fechada no seu próprio mundo..”

- Meu próprio mundo – murmurou.

...

 “Me fale de quando você foi estuprada..”

...

“Essa violência era recorrente?”

...

“Alguém te ajudou?”

...

“É comum distorcerem o que você fala?”

...

“Quantas vezes você já pensou em se matar?”

- Todos os dias – sussurrou olhando para os pés e a vista depois da grade – todos os dias...

...

- E por que você não foi até o fim? – perguntou o terapeuta.
A sala era iluminada por uma janela. Uma cortina branca deixava luz difusa. Marga olhou de lado. O rosto mais magro. Curativos nos pulsos. Um cigarro na mão direita e as unhas roídas. Tragou o cigarro.
- Por que você está aqui, Margarida?
- Você não sabe? Sou fracassada. – Fala o que eles querem ouvir.
- Você é?
- Bom, é isso o que falam, então devo ser. – Não deixa eles saberem.
- E o que mais falam?
Falam que eu deveria ter sido abortada..
- Você sabe... – A voz saiu fraca. Merda. Não era pra sair fraca. Continue forte.
- Não, não sei, Margarida.

Filho da puta.

- Não gosto. Não desse nome. – Isso, boa. Continua desviando o assunto.
- Como você quer que te chame?
-... Marga. M-A-R-G-A. Não Amarga.
- Quem te chama assim?

Minha mãe.

- Todo mundo.
- E todo mundo fala o que?

Merda. Cigarro. Cadê o cigarro? A mão tá tremendo. Desiste do cigarro. Foca na respiração. Fala como se não fosse nada importante.

- Falam que.. que quem está perto de mim não está por opção. 
- E.. você acha isto?
- Bem, eu.. acho que.. – para de embargar, voz maldita.. olha pro lado – eu acho que mesmo que eu seja digna de ser amada, ninguém vai fazer isso. Ninguém realmente nunca ficou, sabe? Então talvez eles tenham razão.. mas.. mas mesmo que isso seja verdade.. algum dia.. algum lugar.. – não chora.. não.. ch.. merda.
- O que você quer, Marga?

Ah, foda-se.. já tá chorando mesmo..

- Encontrar um lugar pra voltar. Onde eu não seja um desperdício de espaço. Mesmo que seja eu sozinha. É por isso que eu tento me matar e sempre paro no meio do caminho, ou sempre acabo voltando pra um de vocês.. porque eu tenho que ser maior que essa bosta toda, porque eu sei que vai ter algum lugar melhor. Nem que eu tenha que fazer. Não vou deixar que eles vençam. Não vou.

...

A risada do casal tirando fotos parou com a chuva começando.
- Ai, meu cabelo!!
- Vamos voltar pra dentro!

Marga olhou para cima, algumas gotas ainda leves caindo no rosto. Fechou os olhos e respirou fundo.
- Eles não vão vencer. Não vão.


Não. Não vão.


quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Desabafo

Eu que sempre tive o amor como tema preferido de meus textos, me deparo cada vez mais com a ausência da vontade de escrever. É fato que meus relacionamentos amorosos (reais ou platônicos) sempre foram alimento para que minhas palavras fluíssem entre as teclas, e a ausência cada vez maior das minhas postagens denuncia claramente que o amor tem andado distante. E se eu parar de olhar apenas para meu interior e procurar escrever sobre outras coisas que não eu mesmo e minha rotina amorosa, não fica mais fácil. Não pra uma pessoa que é fascinada por esse sentimento que tem se mostrado cada vez mais ausente do mundo.
Tenho andado triste e chorado fácil. Tenho me doído com as tragédias e sofrimentos alheios mais do que sempre. Me dói imaginar as mortes na frança, me dói ver que crianças sentem fome e me dói ver a situação política do Brasil e do mundo. Me dói porque parece que cada vez mais o amor se esvai de todo lugar. O que leva as pessoas a achar que isso vai de fato dar algum retorno futuro? Quem é realmente feliz dessa forma?
Preciso encontrar algum lugar em que esse sentimento ainda reine, alguém que ainda acredite. Preciso que as palavras continuem a fluir e que, de alguma forma, as coisas possam melhorar. Até lá, talvez meus textos piorem e meu ânimo diminua, mas eu volto a ser como antes, nem que seja sozinho.

terça-feira, 27 de outubro de 2015

Sonhos

Ontem eu sonhei
que caminhava sozinha
sala grande, vazia.
O silêncio soprava
atrás de mim
caminha, caminha.

Ontem eu sonhei
com um belo sol de verão
pele arde
se abre
alma indiferente
pobre coração.

Ontem eu sonhei
que o mundo ia se acabar.
O abismo me espera
quis logo lhe indagar
o amor já foi devorado
ou vem atrás de mim, devagar?

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

líquido


líquido
adjetivo
1. fís. diz-se do estado da matéria intermediário entre os estados sólido e gasoso, caracterizado por apresentar forças de coesão intramoleculares mais fracas que as dos sólidos, e mais fortes que as dos gases.
2. que flui ou corre como água.

Era o segundo cigarro que acendia em menos de quinze minutos. Assoprou a fumaça enquanto olhava de soslaio para a carta fechada em cima da mesa. Tamborilava os dedos no tampo de madeira enquanto dava mais um trago.

Anne, 28 anos, solteira, virginiana, ascendente em aquário. E quem raios escreve e envia uma carta hoje em dia?!

Apagou o cigarro no cinzeiro e ficou encarando o envelope. Ela sabia quem era, conhecia aquela letra cursiva do diabo mais do que gostaria de admitir. E adorava e odiava aquela caligrafia.

Amor fati. Amor líquido. Tantas definições apenas para esconder o quanto foi otária.

 “Líquidos mudam de forma muito rapidamente, sob a menor pressão. Na verdade, são incapazes de manter a mesma forma por muito tempo. No atual estágio “líquido” da modernidade, os líquidos são deliberadamente impedidos de se solidificarem. A temperatura elevada — ou seja, o impulso de transgredir, de substituir, de acelerar a circulação de mercadorias rentáveis — não dá ao fluxo uma oportunidade de abrandar, nem o tempo necessário para condensar e solidificar-se em formas estáveis, com uma maior expectativa de vida.” (BAUMAN, Zygmunt)

Levantou da cadeira e começou a andar pelo apartamento.

“...  Tudo para disfarçar o antigo medo da solidão.”

Olhou para o chão enquanto andava, os braços cruzados e inquietos.

Eventualmente, tudo o que queria era não se sentir descartável. Aquela carta, e não precisava nem abrir para saber aquilo, carregava uma série de feridas antigas, promessas que deixaram de se cumprir e outras coisas largadas pelo caminho.

Não foi ela quem simplesmente desistiu de tudo. A ela só coube encarar com dignidade e seguir em frente. É isto o que fazemos quando acreditamos demais, fingir que superamos e aguardamos silenciosamente pela próxima decepção, virando a esquina. Acender um cigarro, olhar para os dois lados e atravessar a rua, uma parte sua torcendo para chegar do outro lado enquanto todo o resto deseja ansiosamente pelo motorista ensandecido que vai te fazer voar pela pista. Talvez quando você estiver no seu leito de morte no hospital, quem você espera surja, falando o quanto você fez falta.

Mas foda-se. Não vai acontecer e ninguém perguntou nada.

E a carta ainda estava ali. Chegou junto com as contas, como se fosse algo banal.

Talvez banal fosse mesmo a palavra.

 “As relações se misturam e se condensam com laços momentâneos, frágeis e volúveis. Num mundo cada vez mais dinâmico, fluído e veloz. Seja real ou virtual.
(...)
 Vivemos tempos líquidos, nada é feito para durar, tampouco sólido. Os relacionamentos escorrem das nossas mãos por entre os dedos feito água”.

Olhou mais uma vez para o envelope em cima da mesa. Inquisidor. Pegou o isqueiro.

“...as pessoas precisam sentir que são amadas, ouvidas e amparadas. Ou precisam saber que fazem falta. (...) Ser digno de amor é algo que só o outro pode nos classificar. O que fazemos é aceitar essa classificação. Mas, com tantas incertezas, relações sem forma - líquidas - nas quais o amor nos é negado, como teremos amor próprio? Os amores e as relações humanas de hoje são todos instáveis, e assim não temos certeza do que esperar”.

Apreciou a carta enquanto pegava fogo. Não precisou nem abrir para saber o que era. Se seu remetente tinha sido covarde por tantos anos (e não era menos covarde agora), não cabia à Anne ser corajosa ou forte mais uma vez. Pra que se dar a chance de se machucar novamente, por alguém que foi sem olhar para trás?

Não importa. Meios que justificam fins inacabados só são detalhes.

E aquilo, num mar de promessas inacabadas, estava finalizado.

“E foda-se você” – disse, ao acender o cigarro no envelope.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Sobre você

Cansei de escrever sobre mim. Vou escrever sobre você.
Sobre seu medo de avião.
Sobre seu prazer em cozinhar comigo.
Sobre seu olhar apaixonado.
Sobre sua mania de achar que tudo tem que ser do seu jeito.
Sobre sua mania de inventar apelidos e carinhos e promessas.
Sobre seu carinho por sua família.
Sobre sua falta de organização.
Sobre suas músicas e seus livros.
Seu time.
Seu trabalho.
Seu signo.
Sua cama.
Sua barba.
Sobre como você me acha engraçada.
Sobre como você gosta do meu café.
Sobre como você dispensa a sobremesa.
Sobre sua groovagem frenética.
Sobre seus pesadelos.
Sobre seus sonhos.
Sobre quando você começou a me amar.
Sobre todo amor que sinto quando você me abraça forte,
Quando dança comigo,
Quando inventa musiquinhas,
Quando passeamos de mãos dadas...
Quando você entrou em minha vida (como um sol no quintal), e me deixou entrar na sua.






Para ouvir:


domingo, 28 de junho de 2015

Falando sobre sexualidade - cutucadas

Num momento em que a diversidade sexual ganha destaque nas discussões, e que em muitas rodas a heteronormatividade predomina, algumas carregando discurso de violência, é pertinente saber discutir isto em casa. Não porque é modismo, mas sim por uma questão de respeito.

Reconhecer e compreender que todas as pessoas têm direito à serem respeitadas e terem uma vida digna, independentemente de sua sexualidade, da sua identificação com o próprio corpo, é fundamental. Afinal, é a informação que ajuda a combater o preconceito.

Não vou destrinchar aqui a luta do movimento LGBT, pois não faço parte deste grupo (e quando chega a vez destas pessoas falarem, pego meu banquinho e ouço com atenção o que eles têm a dizer sobre isto), entretanto, é preciso ressaltar que este assunto deve ser discutido em casa. Tenho uma família grande, com crianças em formação, e pretendo fazer o meu melhor para contribuir na educação deles enquanto cidadãos conscientes.

É importante que isto seja discutido na escola, mas nem sempre isto é mencionado. De qualquer maneira, é primordial o papel da família na formação da criança.

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Acredito que o principal ponto é reconhecer que sexualidade não é uma escolha, você já nasce assim, e que ela sempre existiu. A diferença é que ela passou a ser abertamente discutida há pouco tempo.

" 'Acredito que o principal ponto é reconhecer que sexualidade não é uma escolha, você já nasce assim, e que ela sempre existiu.' E, vamos supor que seja uma escolha... Qual seria o real problema? A pessoa pode ser bissexual, e por motivos mil, prefere não entrar numa relação heterossexual. Relacionamento abusivos seriam um bom motivo pra isso, por exemplo.
Mas talvez a questão seja essa: no fundo sempre tem o discurso ‘gays nasceram assim, eles não tem escolha, então não há nada a fazer, respeita’. Mas, e se for uma escolha? Não que eu ache que seja... Ainda assim é preciso aprender a respeitar a escolha dos outros, qualquer tipo de escolha, desde que isso não gere prejuízo a terceiros. Escolhas individuais não devem ser julgadas
(...)
Isso [falar sobre a naturalidade] sempre me soa muito hipócrita, porque não somos seres naturais, somos seres sociais, e a esmagadora maioria do que somos, fazemos, consumimos, etc., são completamente anti-naturais. E, na verdade, talvez a sexualidade de modo geral... pense aqui que o sexo como um todo continua sendo tabu, é demonizado justamente por ser natural e não por ser anti-natural!
Aprendemos tanto a nos reprimir, seguir normas, e uma dessas normas é a heterossexualidade compulsória, maternidade compulsória, repressão sexual, negação dos desejos, porque mesmo a heterossexualidade dificilmente é vivida de forma espontânea e natural: se estabelecem relações de poder, relações de posse, relações de carência, relações baseadas no status"
C. S. - 26 anos, lésbica

O segundo ponto é reconhecer que direitos não são privilégios. Privilégio é uma circunstância de supremacia, baseada ou não em hábitos culturais e legais, ocasionada pela má distribuição do regime político e/ou econômico. Privilégio é uma vantagem ou direito atribuído a um pequeno grupo.



Privilégio é você ter o direito de casar com quem você ama e querer constituir uma família, enquanto a pessoa que tem uma orientação sexual diferente de você não pode, e corre o risco de sofrer agressão (física, verbal, risco de demissão...) caso manifeste que não segue o padrão sexual imposto pelo grupo dominante.

Entretanto, se para você igualdade de direitos é decadência moral, “safadeza” e derivados, que gays são má influência, transmitem doenças e etc., gostaria de te dizer: Primeiro, você é um babaca, passou da hora de mudar seus conceitos. Segundo, você se encontra num grupo privilegiado.




Links úteis, caso você deseje mudar ou aprofundar sua opinião:
Cartilha da Unesco a respeito da diversidade sexual: 
Como pais devem falar de diversidade sexual com os filhos:
Biologia e Psicologia: A verdadeira origem da homossexualidade

PS: Fica aqui a mensagem amorzinho da dona Dirce <3


sexta-feira, 19 de junho de 2015

A responsabilidade incoerente de se racionalizar o sentir

O desejo de ter você de volta me tortura por não saber se meu coração é um egoísta insensível por te querer sob o risco de te ferir de novo, ou um sensível captador de oportunidades únicas de se ser finalmente feliz. O ruim de quando um coração grita alto assim é que a cabeça acaba por ouvir e decidir travar uma guerra por prevenção. Seguir o coração, embora pareça ser sempre a opção que mais alivia, nos torna conscientes da responsabilidade de ter ignorado os avisos de perigo emitidos pela razão.
Eu só queria poder garantir que você não vai sofrer. Mas a única garantia que posso dar é de que eu não quero que você sofra.
Ah...! Pobre de mim por te querer bem melhor que a mim. Mais fácil seria se tivesse nascido com o egoísmo insensato dos que vivem por impulso, ou com a objetividade corajosa dos dominados pela razão. Tinha que ser eu o abrigador de duas forças tão fortes que acabam por brigar eternamente sem que a guerra defina finalmente um vencedor?

domingo, 24 de maio de 2015

O amor está servido

Comecinho da noite. Lá fora, aquele vento que se faz notar, uivando pelas frestas das janelas. Fecho a cortina. Sigo em direção à cozinha. Sopa. Hoje uma sopa cairia muito bem. Um caldo verde também seria uma ótima ideia. Ela sempre me surpreende com algum prato simples, mas com complementos criativos. Dizia orgulhosa que era o seu toque especial em ação. Alecrim, especiarias, algum queijo fresco mais fresco comprado especialmente para dar um sabor especial às refeições. Sempre pude contar com seu bom gosto. E com o gosto bom dos seus pratos. Por isso, não consegui disfarçar minha surpresa ao chegar à mesa e dar de cara com um prato raso e alguma coisa bem superficial. Talvez fosse um pedaço de carne tímida, escondido embaixo de uma alface. Olhei para cima e não havia goteiras no teto. Do que o filete de filé estava se escondendo, eu não fazia a menor ideia. Comecei a pensar que fosse por vergonha de seu tamanho. Quis consolá-lo com um tapinha nas costas, dizendo que o importante seria o prazer que ele proporcionaria, mas não sabia muito bem onde estariam as costas do bife. E duvidei também que ele seria capaz de proporcionar muito prazer. Enfim. Corri os olhos pela cozinha, à procura da pessoa que cometera aquele acidente gastronômico. Ela havia acabado de entrar, exibindo um sorriso de satisfação. Será que ela queria me matar de fome? Mulher cruel. É hora de colocar as cartas na mesa! Embora eu talvez comesse também as cartas. Melhor ir com mais calma. 

- O que é...

Procuro pela comida no prato, com dificuldade para localizá-la. Ali, encontrei.

- ...isso. O que é isso?

Ela, mal contendo o riso, responde em uma voz fanhosa:

- Dukan foi quem botô pra nór comê!

Eu amo essa mulher.

sábado, 9 de maio de 2015

O amor de Puuung


Recentemente vi alguns amigos compartilhando no facebook (sempre dedicando aos seus parceiros amorosos) uma postagem que divulga ilustrações super fofas do artista coreano Puuung.

As ilustrações mostram a rotina de um casal, valorizando o amor presente em atos corriqueiros, que poderiam passar despercebidos facilmente. O artista busca encontrar o significado do amor no cotidiano e transformar isso em arte.

Gostei do trabalho, achei de muita sensibilidade e, mesmo estando solteira, pude me identificar com várias cenas ilustradas, afinal, o amor não está presente apenas em relações de namoro ou casamento.

 Eu posso ver o amor quando faço um almoço gostoso com minhã irmã...
ao receber um carinho quando estou doente...
quando minha mãe me serve um prato especial...
enquanto arrisco despretensiosamente uns passos de dança com um amigo...
ou ao passear de bike com outro.
Vejo o amor quando minha tia faz chá pra mim a noite...
 durante uma sessão de cinema ou de séries em casa com irmãos ou amigos...
 ao consolar uma amiga em um momento difícil...
e até nos mais sonolentos momentos de estudo em grupo.

Só faltou uma ilustração das personagens tomando uma cerveja numa mesa de bar rs. 

Acho que o amor, em resumo é isso: o cuidado, o carinho, a cumplicidade... o querer bem, querer estar perto, querer participar. Temos a opção de viver com amor ou sem (no sentido de perceber, demonstrar e valorizar a presença do amor em momentos cotidianos). Mas com amor, nossa vida fica mais leve e mais feliz.

E vocês, o que acharam dos trabalhos do Puuung? Também se identificaram? E sobre o amor, o que pensam? 


Música: Do amor - Tulipa Ruiz


sábado, 25 de abril de 2015

Dois pesos

Você alimenta o ódio. Eu alimento o amor.
Você grita o ódio. Eu exalo o amor.
Você ri do ódio. Eu choro com o amor.
Você não sabe o que fazer com o ódio. Eu quero te mostrar o que fazer com o amor.
Você diz que o ódio é seguro. Eu me jogo do precipício do amor.
Você se sente protegido com o ódio. Eu te desarmo com amor.
Você pergunta: "Ódio a que?". Eu respondo: "Que não seja ao amor".

Escrito ao som da voz que me acolhe.

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Amorosa


No sertão nordestino, os vaqueiros usam roupas de couro grosso para se protegerem da vegetação árida e espinhosa que machuca.  Elas são imprescindíveis para enfrentar a dura rotina na caatinga.

Amorosa é o nome de uma dessas plantas contra as quais os vaqueiros se defendem. Impossível conter o riso no canto da boca quando ouvi e vi a tal planta. “Amorosa... amorosa...” Sim, como duvidar que o amor fere? Como criticar aqueles que se aproximam dele com capa protetora, afinal, já foram feridos antes?

O amor dói. O amor pode levar a loucura. Ou será o desejo? A culpa é do desejo? O amor é generoso e o problema é a paixão que deixa as pessoas obcecadas e egoístas? Dizem que o amor romântico é uma criação relativamente recente, talvez a vida fosse mais fácil sem ele. Mas também mais monótona.
Amorosa

Há poucos dias saiu uma matéria no “El país” comentando sobre um teste realizado pelo psicólogo Arthur Aron, cuja proposta era fazer dois estranhos se apaixonarem. Como? Uma série de 36 perguntas capazes de promover a intimidade entre os dois. Ao que parece, a experiência é bem-sucedida.

Será mesmo possível se programar para amar alguém? Será mesmo que a paixão é apenas uma combinação de processos bioquímicos e, portanto, manipulável?  Se for apenas isso, só não me sinto tão ridícula por todas as vezes em que "cai de amores" por alguém, porque o mundo das artes está repleto de tolos como eu...


Para quem quiser conferir: http://brasil.elpais.com/brasil/2015/01/21/ciencia/1421856772_939357.html

sábado, 25 de outubro de 2014

O Amor Não Tem Futuro?

Há pouco, assisti a um documentário chamado O Amor Após Análise, onde uma senhora que creio ser a psicanalista diz que “o amor não tem futuro”. No mundo onde somos bombardeados com a informação que ‘só o amor constrói’, como é possível acreditar que este amor não tem futuro? Meu espanto foi tamanho que precisei pausar o filme e me preparar para o momento que ela diria que tudo não passava de uma grande mentira e que sim, o amor tem futuro, inclusive para mim.
No consultório desta psicanalista, os pacientes contam sobre seus encontros afetivos e passageiros, sempre seguidos da decepção, de alguma frustração imediata e a frase que já ouvimos e dissemos inúmeras vezes: “Esse daqui não tem futuro!”. Futuro pra quem? do que? E onde? Que futuro é este? É o casamento, o filho, a relação duradoura, a estabilidade? Quantas perguntas precisarei fazer e quantas respostas terei de procurar para descobrir que aquele fulano, com quem saí uma única vez, não tem futuro?
“O amor não tem futuro porque é dito no presente. Não é o amor do passado que virou lembrança, tampouco o amor que pode vir a acontecer no futuro que desconhecemos”.
Finalmente, encontro a frase que me faz respirar um pouco mais aliviada, embora assustada com a desmistificação do amor. Ele que é amplo e sem fronteiras. Já reparou que somos nós quem o limitamos? Não se pode amar por uma noite, por uma semana, com mais de uma pessoa, nem de maneira inusitada. São em situações como esta, quando deparo-me frente a frente com as marcações que coloco em cima do amor que lembro da canção de Marisa Monte Nando Reis, gravada pelo Cidade Negra: “Amor que não se pede, amor que não se mede, que não se repete“.
E se o amor chegar em algum momento inconveniente, não se preocupe. De amanhã não passa, ele não tem futuro.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

ex bom é ex vivo(a)

teoricamente já é dia 2, mas como ainda não dormi ainda é dia 1, ou seja, meu dia, portanto segue aí meu post.

muita gente diz que ex bom é ex morto, mas discordo. ex bom é ex que, mesmo quando não vira best friend, a gente pode encontrar e dizer pelo menos oi. é ex que quando a gente se encontra, mesmo com o boy novo a gente dá beijinho no rosto e abraço e diz "bom te ver". é ex que, quando a gente ouve uma novidade boa sobre ele, sorri contente, independentemente de como foi o término. ex bom é ex que a gente não quer ter perto, mas quer saber que está bem.

nos últimos 5 meses encontrei 3 exes. os 3 com que mantive maior intimidade e tempo juntos. o ex 1 encontrei no rio de janeiro, quando peguei uma rua errada para ir à uma festa. ficamos no dia seguinte e foi ótimo. o ex 2 encontrei numa festa quando eu estava com o ex 4 e ele (o ex 2) foi bem antipático, como lhe é de costume. o ex 3 encontrei hoje, ontem e antes de ontem, na flip, em paraty, com o atual dele (acho). o ex 4 não encontro faz tempo, mas adoro, nos falamos quase que diariamente. e o ex 5, bom, o ex 5 digamos que tem outra relação (séria) e só me contou meses depois, quando eu estava quase me entregando por completo. do atual não vamos falar, pois o assunto hoje é ex (mais precisamente o ex 3) e espero que, se virar ex (o atual), que seja daqui a uns 70 anos.

há uma história envolvendo o ex 3 e o ex 4 que não consigo entender, muito menos explicar, portanto - resumindo - preciso dizer que o atual do ex 3 é ex do ex 4. e eu sou ex do ex 3 e do ex 4 e o ex 4 é ex do atual do ex 3. enfim, tudo isso pra dizer que encontrei ex 3, depois de uma última vez não tão boa e foi incrível. 

nada de papo sério, apenas amenidades. apenas assuntos do cotidiano, arte, literatura, trabalho, como tem de ser papo com ex quando não se quer discutir erros do passado, nem relembrar bons momentos. talvez porque ainda não seja hora, talvez porque seja só isso mesmo, talvez porque não há nada que se falar, além de amenidades. 

claro que há uma curiosidade em saber como está, o que está fazendo, o que está comendo, o que está vendo, ouvindo, mas não quando se encontra de repente e inesperadamente e com o atual. de qualquer forma é bom saber que o atual do ex parece ser legal, fofo e bonitinho, com o qual também houve uma conversa de amenidades. no inconsciente uma vontade de chegar e falar vem aqui amigo, deixa eu te dar umas dicas, mas o bom senso disse cala a boca. claro que passaram mil cenas pela cabeça, uma coisa boba de pensar como dormem, o que fazem na cama, o que conversam no chuveiro num dia frio. mas aí vem o bom senso de novo e fala cala a boca.

mas o bom, o bom mesmo, é que depois de tanto tempo, quase um ano pós-término, não haja nada pra discutir. é perceber que o que ficou é isso mesmo, o desejo de que estejam todos bem e a saudade da gata, nada mais. e poder encontrar na rua, dar um abraço e se despedir depois de 5 minutos de conversa boba.

e o melhor é ter a plena certeza de que tudo isso é verdadeiro.